segunda-feira, 27 de dezembro de 2010

O HABITUAL DESPUDOR ÉTICO

A nova lei de financiamento dos partidos preparada, como não podia deixar de ser, pelos partidos e contestada por vários sectores da sociedade portuguesa mas promulgada pelo Presidente da República foi, para não variar, construída de modo a proteger os interesses da partidocracia, mais precisamente os interesses do chamado centrão. Não é certamente coincidência o acordo entre PS e PSD sobre a lei.
Uma das alterações que parecem estar previstas num dos alçapões da nova legislação, na linha da manhosice e dos alçapões na legislação à portuguesa, é que, conforme o Público, as multas aplicadas aos partidos podem ser consideradas despesas partidárias. Como as despesas são a base de cálculo das subvenções estatais acontece que os partidos vão receber da nossa parte as verbas que pagam em coimas. Dito de outra maneira, legisla-se a impunidade.
Considerar-se-ia anedótico eu contabilizar as multas de trânsito nas minhas despesas e ser ressarcido dessas despesas pela administração fiscal no acerto de IRS. É da mesma natureza o tratamento dado às multas aos partidos.
A questão é que não é uma anedota, é apenas mais uma machada na rastejante dimensão ética que a partidocracia instalou no cenário político português. O despudor ético parece não ter limites encontrando sempre novas formas de expressão. Não é possível que as lideranças que toleram e promovem tais práticas venham produzir discursos e apelos à mobilização e à confiança dos cidadãos, falta-lhes autoridade e sobra desconfiança.

2 comentários:

zé ninguém disse...

Sobre a notícia do jornal «Público» em torno das coimas aplicadas aos partidos
Segunda 27 de Dezembro de 2010

Face à notícia hoje publicada pelo jornal «Público» sobre coimas nas contas dos Partidos, que constitui aliás o tema da sua manchete baseando-se numa absoluta falta de rigor, o PCP tem a esclarecer o seguinte:
1 - Ao contrário do que o «Público» afirma - «como é a partir das despesas que o Estado calcula a subvenção concedida aos partidos, ao incluir as coimas nessas despesas, os partidos acabam por receber de volta, mais tarde, o valor monetário das coimas que lhe foram aplicadas.» - as despesas declaradas, incluindo naturalmente as das coimas aplicadas aos Partidos, em nenhum caso são contabilizadas para a subvenção anualmente atribuída aos Partidos. Ela é definida no artigo 5º da lei, «A subvenção consiste numa quantia em dinheiro equivalente à fracção 1/135 do valor do IAS, por cada voto obtido na mais recente eleição de deputados à Assembleia da República.», pelo que as coimas aplicadas aos partidos nada alteram à subvenção estatal.
2- A alteração (coimas) que se verificou na legislação – Lei de Financiamento dos Partidos e das campanhas eleitorais – no artigo 12º, nada tem a ver com subvenções do Estado, mas sim com as regras e obrigações dos Partidos em relação ao seu regime contabilístico, discriminando as parcelas, quer de receitas, quer de despesas, quer de património, que aí devem constar. Tratou-se apenas de inserir uma despesa que existe na realidade nas obrigações contabilísticas dos Partidos. Alteração aliás que está de acordo com legislação aplicada a qualquer associação, cujas multas aplicadas aos seus dirigentes – desde que no exercício das suas funções – podem ser assumidas pela própria instituição.
3- A notícia do «Público» refere-se apenas às contas anuais dos Partidos, sobre as quais versa o Acórdão do Tribunal Constitucional referido, e não às contas de campanhas eleitorais, onde, aí sim, a lei determina uma ligação entre as despesas e a subvenção. Mas nem que o «Público» se estivesse a referir às subvenções para campanhas eleitorais (e manifestamente não estava) a notícia teria fundamento, uma vez que nestes casos a responsabilidade cabe inteiramente ao mandatário financeiro de cada campanha, que responde pelas contas e pelas suas eventuais irregularidades.
4 - Finalmente, é significativo que o «Público» não tenha considerado no mínimo estranho que a aplicação de coimas a que se refere, signifique, nas mesmas circunstâncias, para o PCP um valor de 30 mil euros e para os restantes Partidos de 3 mil euros, confirmando assim uma situação claramente persecutória em relação ao PCP. Multas que em vez de serem pagas pelo Estado como erradamente o «Público» sugere, são pagas pela contribuição dos militantes, activistas e simpatizantes do PCP.
Na verdade, esta manchete e notícia do “Público” inserem-se numa campanha mais vasta para denegrir a actividade partidária como elemento essencial da vida democrática do país, da participação cívica do Povo português, reconhecida e valorizada pela própria Constituição da República.
Mas visa essencialmente atingir o PCP, Partido que se distingue de todos os outros, pela sua história em defesa da liberdade e da democracia, pela sua prática e o seu projecto, e que está na primeira linha da luta contra a política de direita e por uma mudança de rumo de que o País cada vez mais precisa.

Zé Morgado disse...

Ao Zé Ninguém,
Agradeço o esclarecimento, embora entenda que as alterações introduzidas na lei sobre o financiamento dos partidos não contribuem para a desejável transparência.