terça-feira, 31 de outubro de 2017

PODE A ESCOLA CONTINUAR A ENGORDAR?

A propósito do Dia Mundial da Poupança, sim também existe, a Associação de Professores de Ciências Económico Sociais defende que seja criada “uma área disciplinar que promova, formalmente e de modo universal, a educação económica e financeira dos alunos” do ensino básico e secundário.
O ME afirma que no âmbito da disciplina de Cidadania e Desenvolvimento criada no âmbito do projecto de flexibilidade curricular que está em desenvolvimento em 236 escolas serão abordados estes conteúdos. A Associação proponente defende esta perspectiva do ME “não resolve o problema, uma vez que, para além de ser um tempo escasso, será sempre disputado por outras vertentes da educação para o desenvolvimento pessoal e social e não permitirá a construção de uma autêntica literacia financeira”. Algumas notas.
Não está, evidentemente, em discussão a importância de que a educação de crianças e jovens envolva as diversas questões presentes na vida das comunidades, aqui exemplificadas pela literacia financeira, antes pelo contrário.
No entanto e por diversas ocasiões tenho manifestado a minha reserva face ao entendimento de que tudo o que de alguma forma possa envolver os mais novos e a sua formação deva ser ensinado/trabalhado na escola. Esta visão obesa da escola não funciona, nem tudo pode ou deve ser transformado em disciplinas, conteúdos escolares, projectos, … para além de que a escola tem um conjunto de funções incontornáveis que tornam finita a sua capacidade de responder.
Por outro lado, foi-se instalando em Portugal, não só em Portugal mas também em Portugal, a ideia de uma educação, de uma escola, fundamentalmente centrada em competências instrumentais, em saberes “úteis”, "essenciais" como lhes chamava Nuno Crato, destinada sobretudo a formar “técnicos” e não “cidadãos” qualificados. Os currículos são progressivamente aliviados de conteúdos que não sejam “práticos”, promotores de “produtividade”, “domínio de técnicas” como seja toda a área da formação cívica, da educação para a saúde, dos valores, das expressões e conteúdos artísticos, etc.
A escola deve formar empresários, poucos, e técnicos qualificados e de formação estreita, muitos. Estas ideias traduziram-se, traduzem-se apesar de algumas mudanças indiciadas e afirmadas, nos conteúdos curriculares, nos modelos de avaliação, nas concepções do que deve ser o trabalho dos professores, na organização do sistema educativo, selectivo, prescritivo e incapaz de acomodar diferenças entre os alunos, etc.
Entretanto, com a mudança no ME e a definição do Perfil do Aluno para o Séc. XXI reabriu-se a mudanças em matéria de currículo, agora em modo flexibilidade mas ainda em período experimental e para 235 escolas, públicas e privadas.
Sabemos que, independentemente das opções e visões ideológicas, uma das questões que no universo a educação estarão sempre em aberto é a que envolve os conteúdos e organização curricular. De facto, a velocidade de produção e acesso ao conhecimento e ao desenvolvimento, as mudanças nos sistemas e no quadro de valores das comunidades determinam a regular reflexão e ajustamento sobre o que a escola deve ensinar e trabalhar, sobretudo durante a escolaridade obrigatória.
Por outro lado, o tempo da escola e a competência da escola são finitos, isto é, a escola não tem tempo nem pode ou deve ensinar tudo. Lembram-se certamente das discussões sobre se matérias como educação sexual, educação cívica, literacia financeira (sim, não é a primeira vez que se fala disto), educação para a saúde, para citar apenas alguns exemplos, deverão, ou não, constituir-se como "disciplinas", conteúdos ou mesmo se devem integrar os currículos escolares.
Em princípio, independentemente dos conteúdos poderem ser mais ou menos pertinentes, vejo sempre com alguma reserva as propostas de introdução de mais uma disciplina, mais conteúdos, mais um manual, mais umas orientações, mais um programa de formação de professores, como se a escola, o currículo escolar, os conteúdos, as suas competências, pudessem continuar a engordar indefinidamente. E não se trata de um problema de recursos ainda que seja de considerar.
Como é evidente, pode dizer-se sempre que muitas destas questões podem integrar o trabalho escolar considerando até que os alunos passam um tempo imenso, diria excessivo, nas escolas. Aliás, tal acontece em muitas escolas e agrupamentos.
A questão central, do meu ponto de vista, é que as competências da escola, os conteúdos que nela são trabalhados, integrando ou não formalmente os currículos, não podem mesmo aumentar continuamente. Urge uma reflexão serena, participada e com tempo sobre o ajustamento dos conteúdos, a sua integração e organização, a forma como podem acomodar a diversidade dos alunos e a necessidade de diferenciação dos professores, a formação global dos alunos e não exclusivamente a promoção de competências instrumentais, etc.
Somar conteúdos e competências à escola sem ajustamento dos conteúdos e organização existentes, pode promover problemas e não soluções, de tanto que lhe exigem corre risco de não providenciar o que lhe compete.
Na verdade, nem tudo o pode ser interessante saber terá de caber numa disciplina da escola ou num conteúdo escolar formal e nem tudo o que se pode saber se aprende na escola. A dificuldade é que os alunos estão muito tempo na escola e a tentação é óbvia, a escola que faça.

A PROCISSÃO ÀS ARRECUAS

Em comunicado ontem divulgado pelo Patriarcado de Lisboa, o cardeal-patriarca D. Manuel Clemente, exortou a que se realizasse uma oração pela chuva com o objectivo de minimizar a “prolongada seca que muito afecta o ambiente e as culturas”. A falta de chuva também pode ter acentuado o impacto dos incêndios “extremamente gravosos” deste ano, segundo se lê num comunicado divulgado no site do Patriarcado de Lisboa.
Este tipo de iniciativas não é raro nem novo. Em Março de 2012, o então Bispo de Beja, D. António Vitalino lamentava a aparente falta de orações dos crentes para pedir chuva a Deus para combater o período de seca. Acrescentou que “a maioria” da população só acredita “na providência de Bruxelas”.
Aliás, lá para os lados do meu Alentejo existe a tradição de em anos de seca pedir à Senhora D'Aires os seus bons ofícios para que os céus enviem a água do sustento.
Lembro-me até de que há uns anos, depois de um período prolongado de seca que levou à organização de uma procissão à Senhora d'Aires, a chuva ter aparecido em quantidade. O Mestre Marrafa, homem de fé, dizia-me com os olhos pequenos a brilhar, "ainda temos que ir fazer a procissão às arrecuas para parar a água".
A meteorologia anuncia água a partir de amanhã, oxalá assim seja.
Os campos e as pessoas vão tristes de secura.
A chuva virá, ainda iremos precisar da procissão às arrecuas.

segunda-feira, 30 de outubro de 2017

A FICÇÃO E A REALIDADE

À situação na Catalunha aplica-se o velho enunciado “a realidade ultrapassa a ficção”.
É verdade que alguns dos personagens e dos episódios desta narrativa parecem extraídos de um guião mas é mau demais para ser verdade.
Como já escrevi receio que a rua acorde e faça ouvir a sua voz e da maneira mais dura, espero estar enganado, boa parte dos discurso que vamos ouvindo a rua parecem ser de gente genuinamente preocupada com os riscos do incêndio que alguns incendiários de ambos os lados teimam em alimentar.
No entanto, continuam a reunir-se condições para tudo possa correr mal.  

DAS NOVAS TECNOLOGIAS

Como disse em texto de há dias deu-me para revisitar o currículo que tenho registado com curiosidade sobre o que ao longo destas décadas tenho feito, escrito e falado.
Achei interessante uma referência de 1989. Estive na Escola Superior de Educação de Infância Maria Ulrich, com a qual e por coincidência actualmente colaboro numa parceria institucional, a falar sobre “A crianças, a família e as novas tecnologias”.
É claro que passados estes quase 30 anos é um tema desactualizado e de interesse basicamente histórico.
Parece-me até extraordinário que tenhamos inúmeras iniciativas, cursos e discursos, formações, conferências, orientações, etc. sobre as novas tecnologias na educação e a continuada referência de que as novas tecnologias são a imprescindível inovação em educação. Serão mesmo? E ao fim destes anos todos é isso que temos para dizer para além de constatar a evolução exponencial dos próprios dispositivos?
A questão é que sendo certo que como diz Camões “todo o mundo é composto de mudança, tomando sempre novas qualidades”, as novas tecnologias, não são uma “qualidade” são uma ferramenta.
E a verdade é que muitas vezes é uma ferramenta “nova” ao serviço das velhas qualidades.

POR ONDE É O CAMINHO?

Gostava de ouvir as eventuais respostas que as elites políticas, no governo ou na oposição, e as elites económicas dariam a uma criança que lhes chegasse à beira e perguntasse, “Senhor, pode dizer-me por favor, por onde é o caminho para o futuro?”.
Imagino que alguns ficariam atarantados com a pergunta e outros venderiam ilusões.
Sem queira usar de um saber e um poder que não possuo, a questão essencial que nos levará ao futuro terá mais a ver com os modelos de desenvolvimento e com os sistemas éticos e de valores do que com medidas económicas imediatas que sendo necessárias poderão ter pouco impacto nas grandes questões.
Repensar os modelos económicos e de desenvolvimento, repensar os modelos éticos em política, dinâmicas sociais e em economia e apostar seriamente na educação e qualificação das pessoas, de todas as pessoas, será, creio, o caminho para o futuro. 
Para isso contamos contigo, ouviste miúdo?

domingo, 29 de outubro de 2017

GOSTEI DE LER "O SUCESSO DAS LIDERANÇAS ESCOLARES"

Gostei de ler o texto de João Ruivo, “O sucesso das lideranças escolares” em qua acentua a sua importância, designadamente na sua dimensão emocional.
Como tenho escrito, muitos estudos e a experiência mostram que nas organizações, incluindo escolas, a qualidade das lideranças tem um impacto forte no desempenho global das instituições e também de todos os que nela funcionam.
Boas lideranças escolares traduzem-se em melhores e mais estáveis climas de trabalho, maior nível de colaboração entre os profissionais, menor absentismo, melhores resultados ou menos incidentes de natureza disciplinar, melhor relação com pais e comunidade, entre outros aspectos.
Camões já afirmava que um fraco Rei faz fraca a forte gente” o que numa actualização republicana poderá entender-se como a defesa de lideranças competentes, com um gestão participada, com mecanismos de eleição alargados, transparentes, escrutinados e com, insisto, mecanismos de regulação que previnam excessos e abusos.
A qualidade e o sucesso da liderança de escolas e agrupamentos assumirão ainda maior relevância num cenário desejável de incremento de autonomia de escolas e agrupamentos. Na verdade, esta autonomia é uma ferramenta de desenvolvimento da sua qualidade, pois permite que os seus recursos, modelos de organização e funcionamento, oferta educativa, etc. se ajustem às especificidades de contexto e, assim, melhor possam responder à população que servem, a toda a população, evidentemente, de acordo com as suas necessidades.
Veremos se o anunciado caminho de municipalização em modo “proximidade” potencia uma efectiva autonomia ou se descentraliza sem que a decisão em matérias importantes passe pelas escolas. 

O QUE É A MATEMÁTICA?

Não sei exactamente por que razão, a memória é uma teia complexa, lembrei-me de um episódio de há algum tempo.
Numa roda de gente interessada nas coisas da educação conversava-se sobre uma das características que, do meu ponto de vista, mais carece de reflexão no nosso sistema educativo, os conteúdos e a organização curricular, sobretudo no ensino básico.
Comentava-se, entre outros aspectos a excessiva compartimentação dos conteúdos em torno de cada “disciplina" do currículo.
A conversa animou-se e em modo “cada cabeça, sua sentença” promovia-se uma reforma curricular cuja necessidade pareceu reforçada com uma história pessoal partilhada por uma das pessoas presentes. A filha, a frequentar o 1º ano e ainda a aprender a escola, coisa que é bem precisa antes de começar a aprender as coisas da escola, ao olhar para a mochila lhe perguntou, "Mãe, a matemática é aquilo dos números ou das letras?"
Os miúdos fazem perguntas mesmo disparatadas, é claro que a matemática é coisa de números e não tem nada a ver com aquela coisa das letras que é um outro mundo, outra disciplina, um outro manual, um outro conjunto de actividades, uma outra avaliação, uma outra dificuldade, uma outra representação, enfim, outra disciplina.
Como é evidente, isto não tem rigorosamente a ver com flexibilização curricular, uma coisa inovadora que por aí anda, ou terá?

sábado, 28 de outubro de 2017

SERÁ QUE ANDAMOS SEMPRE A FALAR DAS MESMAS COISAS?

Por razões que se prendem com a vida académica precisei de revisitar o currículo.
A curiosidade fez-me andar para trás no tempo e dar uma vista de olhos para o que fazia e de que andava a falar.
Dei com uma referência que achei curiosa mas que me deixou alguma inquietação que e que partilho convosco.
Em 1988 participei num Seminário sobre Bem-estar na Escola realizado em Odivelas. Realizei uma intervenção com o título “Ser feliz na escola”.
Já não consigo recuperar os tópicos dessa intervenção, a informática ainda não era tão omnipresente e não tenho tempo para ir vasculhar nos papéis que aguardam nas velhinhas pastas de arquivo a coragem de os remeter para a reciclagem.
Hoje, 28 anos depois, continuamos a falar de bem-estar na escola.
Será que andamos sempre a falar das mesmas coisas? E porquê?
A escola ainda precisa que discutamos o bem-estar dos miúdos nos seus espaços? E porquê?
Então não conseguimos mudar e afirmamos ad nauseam a importância da inovação. Porquê?
São quase 30 anos, é muito tempo.

PARA ONDE IDES ESPANHA E CATALUNHA?

Como já escrevi não me pronuncio sobre a questão da independência da Catalunha.
No entanto, ao longo de todo este processo e pensando sobretudo no dia de ontem e nos discursos inconsistentes e muito pobres de visão das lideranças envolvidas que pouco vão para além do imediatismo e da reacção formal ou da vertigem da emoção, uma coisa me parece razoavelmente clara.
Seja qual for o caminho que tudo isto possa tomar a Espanha e a Catalunha estão a abrir feridas que dificilmente sararão nos anos mais próximos. A troco de quê? As personagens menores que protagonizam este processo saberão responder?
Temo que a rua ainda faça ouvir a sua voz e da maneira mais dura, espero estar enganado. Parece  que se estão a criar as condições para tudo possa correr mal. 
A Guerra Civil não foi há assim tanto tempo e ainda perduram sequelas.
Que irá ficar de herança de toda esta narrativa?

sexta-feira, 27 de outubro de 2017

NO LAGAR

Tarefa concluída. A azeitona colhida pelos Marrafas, tio e sobrinho, ontem e hoje está entregue no lagar. Ainda cheguei a tempo de dar uma pequena ajuda antes de a carregar para o lagar. Se quiserem um conselho, pensem bem antes de varejar oliveiras junto de duas “máquinas” que deixam a auto-estima de um amador completamente de rastos. para além dos efeitos nos braços e costas, é claro.
Este ano e por causa da seca a azeitona não “encheu” muito e alguma já esta a secar. Ainda assim o que já apanhámos excedeu a nossa expectativa. Aguardemos o resultado final.
Não teremos muito azeite mas espero que seja bom como de costume.
Desta vez, na aposta entre mim e o Velho Marrafa sobre os quilos entregues, fiquei eu mais perto. Já vou tendo olho … ou sorte.
A pouca azeitona nem causa grandes filas para entrega no lagar o que não dá tanto tempo para umas lérias. De qualquer forma, um minuto e dois alentejanos é condição suficiente para não se ficar calado. 
Agora é aguardar pelo frio de Janeiro para voltar ao lagar em busca do azeite novo, com o ambiente quentinho das enormes salamandras que o impede de coalhar e um cheirinho perfumado e inconfundível.

OS DESATINOS DOS MIÚDOS

Um dia destes numa conversa com gente da educação, profissionais e amadores, ou seja, educadores e pais, dizia-se que os miúdos andam muito “indisciplinados”, logo no jardim-de-infância, acrescentavam preocupados com os desatinos dos miúdos.
Não tenho nenhuma certeza de os miúdos estejam a vir com mais defeitos de origem do que é habitual, além de que não se podem trocar, uma vez que são fornecidos sem garantia e também sem manual de instruções. Pode acontecer que o desatino venha de dentro deles, mas talvez não tenham nascido com ele. Talvez para os percebermos tenhamos que olhar também para nós.
Pode ser que eles gritem tanto e em qualquer circunstância porque nós estamos a ficar mais surdos, ou seja, ouvimo-los pouco, falamos para eles, mas não os ouvimos. Pode até acontecer que eles aprendam também a ficar surdos e depois também já não nos ouvem.
Pode ser que eles pareçam não aceitar regras e se comportem de forma desregulada porque nós, pelas mais variadas razões, começámos, de mansinho, a ter medo de dizer Não. Eles aprenderam que tudo, ou quase tudo, pode ser sim e mesmo que digamos não, com uma birrazinha bem feita, esse não transforma-se em sim, é uma questão de tempo.
Pode ser que os miúdos façam asneiras grossas porque nós nem reparámos muito bem quando eles começaram a fazer asneiras pequenas e agora já estamos tão aflitos que nem sabemos o que fazer.
Pode ser que muitos miúdos tenham coisas e actividades de mais e atenção de menos, servindo-se então do que fazem e como fazem, para solicitar a atenção que é um bem de primeira necessidade e não substituível por “montes” de coisas e actividades “fantásticas”.
Pode até acontecer que os desatinos dos miúdos façam parte do "kit" de sobrevivência com que todos nascemos, e que os faz emitir sinais alertando para que alguma coisa não vai bem.
Finalmente, talvez esta conversa seja ela própria um desatino. A gente aprende com os miúdos o que eles aprendem connosco.

quinta-feira, 26 de outubro de 2017

NÃO É ASSIM QUE SE DESENHA UMA FLOR

Da retórica que as mais diversas fontes vão produzindo sobre educação constam inevitavelmente referências a inovação e a criatividade. A “inovação” do currículo tem de passar, dizem, pela promoção da criatividade dos alunos, dos professores, das escolas.
No entanto, esta coisa da criatividade, seja lá o que for, nem sempre é acomodada, uma palavra também em voga.
Às vezes e a este propósito lembro-me mais uma vez do Almada.

“Pede-se a uma criança. Desenha uma flor! Dá-se-lhe papel e lápis. A criança vai sentar-se no outro canto da sala onde não há mais ninguém.
Passado algum tempo o papel está cheio de linhas. Umas numa direcção, outras noutras; umas mais carregadas, outras mais leves; umas mais fáceis, outras mais custosas. A criança quis tanta força em certas linhas que o papel quase que não resistiu.
Outras eram tão delicadas que apenas o peso do lápis já era demais.
Depois a criança vem mostrar essas linhas às pessoas: Uma flor!
As pessoas não acham parecidas estas linhas com as de uma flor!
Contudo a palavra flor andou por dentro da criança, da cabeça para o coração e do coração para a cabeça, à procura das linhas com que se faz uma flor, e a criança pôs no papel algumas dessas linhas, ou todas. Talvez as tivesse posto fora dos seus lugares, mas, são aquelas as linhas com que Deus faz uma flor!”
José de Almada Negreiros
Obras Completas, 4, Poesia

quarta-feira, 25 de outubro de 2017

POR ONDE ANDA O JUÍZO DE ALGUNS JUÍZES (TAKE 2)

O energúmeno, Neto de Moura de sua graça, que nas funções de juiz assinou o acórdão a branquear e justificar a violência doméstica com o comportamento biblicamente condenado de mulher adúltera já tem um pesado cadastro em matéria de atropelo aos direitos humanos.
Este juiz delinquente (coisa estranha de se escrever) quando estava no tribunal da Relação de Lisboa baixou para 3 anos de prisão com pena suspensa uma sentença de 4 e meio de prisão. Um individuo agredia comprovadamente a mulher e a filha de quatro anos ao pontapé e à bofetada, tanto em casa como no exterior
O delinquente juiz considerou este tipo de comportamento estava no limite entre o exercício do poder de correcção dos pais sobre os filhos e o que poderia ter relevância criminal. Este delinquente e uma outra juíza consideraram no acórdão que as consequências das agressões foram "de pouca monta, não indo além de uns pequenos hematomas e escoriações", aliás, sublinharam que o arguido nunca "utilizou contra as ofendidas qualquer instrumento ou arma de qualquer espécie". Parece um filme de terror.
Isto é ofensivo dos direitos humanos e não é de forma alguma aceitável.
Será possível que o Conselho Superior da Magistratura continue a dar cobertura a este seu colega que envergonha a administração da justiça, que atropela direitos humanos, que confunde opiniões pessoais com códigos legais, que entende que a violência sobre as mulheres pode ser justificada com o seu comportamento “imoral”, que defende que se eduquem crianças com quatro anos à bofetada e ao pontapé?
Tenham vergonha, portem-se à altura da vossa função, magistrados e defensores da justiça.

OS ACTUAIS ALUNOS, FUTUROS PROFESSORES

Na Universidade do Algarve realiza-se hoje uma Conferência, “Porque melhoraram os resultados dos alunos portugueses?", com a participação de Isabel Flores do Projecto aQueduto - Avaliação, Qualidade e Equidade em Educação - uma parceria entre o CNE e a Fundação Francisco Manuel dos Santos.
Ao que se lê no I será abordada uma questão que me parece interessante.
Com base nos dados do PISA de 2015 apenas 1.5% dos alunos de 15 anos envolvidos no estudo encara a possibilidade de ser professor apesar de boa parte dos alunos valorizarem positivamente os professores. Recordo que nos dados do PISA de 2012 e no conjunto dos vários países, a maioria dos alunos é da opinião de que os professores os ajudam. Portugal e Finlândia lideram a satisfação com a ajuda prestada pelo corpo docente (83% e 85%, respectivamente).
Na comparação entre os dois países, na Finlândia cerca de 3% admite poder ser professor. O dado curioso é que em Portugal os alunos que admitem vir a ser professores têm resultados abaixo da média em Matemática enquanto na Finlândia têm resultados acima da média.
Dito de outra maneira e de forma simples, os alunos de uma forma bem clara valorizam os professores mas apenas os alunos com menor desempenho médio a Matemática (critério PISA) admitem vir a ser professores.
Uma primeira nota para sublinhar a prudência necessária na interpretação destes dados e na definição de eventuais consequências na qualidade dos trajectos futuros, a relação entre o perfil de desempenho de uma aluno de 15 anos e o seu potencial desempenho futuro como professor deve ser vista com extrema reserva. No entanto, creio que podemos dizer algo que me parece merecer alguma reflexão.
A este quadro talvez não seja alheio alguns discursos produzidos sobre os professores que desvalorizam e empobrecem o seu estatuto social e a representação sobre a classe e que são produzidos, por exemplo, por “opinion makers” que frequentemente têm agendas implícitas e quase sempre estão mal informados.
Talvez não seja alheia a instabilidade nas políticas educativas com impacto óbvio na estabilidade das carreiras e da sua valorização. Provavelmente em muitas famílias, as que mais probabilidades terão de ter filhos com melhor desempenho escolar, a profissão professor não é uma escolha incentivada ou, no mínimo, bem aceite.
Também alguns discursos vindos dos próprios representantes dos professores podem muitas vezes contribuir para equívocos e representações desajustadas sobre os professores e os seus problemas.
Deste cenário resulta como tantas vezes tenho afirmado a necessidade da valorização dos docentes e da sua profissão de modo a que se torne mais atractiva. Relembro que o envelhecimento muito significativo da classe colocará muito rapidamente a necessidade de mais docentes.

terça-feira, 24 de outubro de 2017

DA ESCOLA-ALFAIATE

Ontem realizou-se na Fundação Gulbenkian a Conferência Internacional de Educação "2017 Inovação: Na Escola e pela Escola".
O Ministro da Educação realizou uma intervenção a que acedo através da imprensa e merece umas notas.
Uma primeira referência à “inovação” e à colagem recorrente da “inovação” às competências digitais, às novas tecnologias.
Como tenho escrito não simpatizo com a recorrente referência à “inovação” na educação e na escola. Confesso que já me cansa tanto “inovar”, tantas referências a "novas formas de ensinar".
 Mudar algo na forma como se faz não é o mesmo que inovar, fazer qualquer coisa de novo. Nestas matérias, talvez de forma simplista mas é intencional, penso como Almada Negreiros quando referia na "Invenção do Dia Claro”, "Nós não somos do século de inventar palavras. As palavras já foram inventadas. Nós somos do século de inventar outra vez as palavras que já foram inventadas”.
Dito de outra maneira, já conhecemos as palavras da educação, apenas temos que ir ajustando o que fazemos com elas. Peço desculpa, só para dar dois exemplos comuns, não creio que utilizar um tablet na sala de aula seja inovar, é fazer o que de há muito sabe, o trabalho em sala de aula deve reflectir o estado da arte das comunidades em matéria de desenvolvimento científico, ou seja, o tablet é “novo” mas a prática nem tanto. Também não creio que um trabalho que articule conteúdos curriculares de diferentes disciplinas seja “inovador” embora se possa dizer que não é tão frequente como se desejaria ou que as múltiplas variáveis que envolvem os processos de ensino e aprendizagem não facilitam.
Segunda nota, o Ministro sublinhou a importância incontornável do professor, “Todos os dispositivos sofisticados e wifi do mundo não vão fazer diferença se não tivermos grandes professores nas salas de aula”. Estamos de acordo mas para assim seja não basta a retórica, os professores, as escolas precisam de condições, politicas e recursos que potenciem o trabalho do professor, que o desburocratizem, valorizem e estabilizem, só para referir alguns aspectos.
A terceira referência para a necessidade de uma Escola-Alfaiate “"Chega agora o momento de encontrarmos a resposta que melhor nos convenha para, de uma forma longa no tempo, assegurarmos a Escola-Alfaiate que o mundo contemporâneo já há algum tempo nos vem exigido. Uma Escola à medida de todos, de cada um, da nossa rua, como do nosso mundo".
Muito bem Senhor Ministro, uma escola à medida de cada aluno. Será mesmo isso que quis dizer?
Uma pequena dúvida, como se constrói uma escola à medida de cada aluno? Pode experimentar começando por um dos mega-agrupamentos com mais de 3000 alunos.
Peço desculpa Senhor Ministro mas o caminho não passa por uma “escola à medida de cada um” passa por uma escola onde caibam todos e onde todos encontrem resposta para a sua diversidade. Não é a mesma coisa, certo?
E uma escola onde caibam todos não passa apenas pela afirmação do desejo de que assim seja. Vejamos.
É evidentemente um processo complexo mas passa por identificar e prevenir dificuldades de forma precoce.
Passa pela definição de currículos adequados, com a estruturação de dispositivos de apoio eficazes, competentes e suficientes a alunos e professores.
Passa pela definição de políticas educativas que sustentem um quadro normativo simples e coerente e modelos adequados e reais de autonomia, organização e funcionamento das escolas, com a definição de objectivos de curto e médio prazo.
Passa pela valorização do trabalho dos professores.
Passa pela promoção de práticas com melhores níveis de diferenciação e expectativas positivas face ao trabalho e face aos alunos.
Passa por mais trabalho e dispositivos de apoio a intervenção de natureza colaborativa ou tutorial, quer para professores quer para alunos.
Passa racionalizar a rede, em termos de escola ou turma, depois do movimento da excessiva concentração de alunos, etc.
Passa por dispositivos de regulação que apoiem professores, direcções e escolas no desenvolvimento dos projectos educativos das suas comunidades.
Passa por …
Isto não produzirá certamente uma “Escola-Alfaiate”, essa escola já existe de certa forma tantos são os cortes, remendos e costuras que tem sofrido embora reconheça, é justo dizê-lo, que algumas mudanças tem vindo a acontecer num sentido mais positivo.
Talvez contribua para o desenvolvimento de instituições educativas que através da acção diária dos professores possam fazer a diferença e acomodar a diversidade nos alunos, todos os alunos.

EDUCAÇÃO E FUTURO

Foi divulgado o Global Education Monitoring Report 2017/8, “Accountability in education: Meeting our commitments” da UNESCO.
Por agora, para além de registar o progresso nos resultados do PISA de 2015 relativos a Portugal apenas uma nota sobre o nosso maior encargo para as próximas décadas.
A UNESCO estima que 100 milhões de crianças em todo o mundo não sabem ler e 264 milhões não frequentam a escola.
Recordo Mandela quando afirma que a educação é a arma mais poderosa para mudar o mundo, a começar no mundo de cada um, mudança que se começa a cumprir com a aquisição das ferramentas básicas de acesso ao conhecimento.

segunda-feira, 23 de outubro de 2017

UMA HISTÓRIA INSPIRADORA

Uma história inspiradora para os tempos que correm. Somos capazes de resistir. É preciso. Não é destino ter um país a arder.


(...)
A guerra tinha começado a ser preparada um par de meses antes, quando António Morais, proprietário de vários hectares de olival no Lila, percebeu que uma empresa subsidiária da Soporcel se preparava para substituir 200 hectares de oliveiras por eucaliptal para a indústria do papel. «Tinham recebido fundos perdidos do Estado para reflorestar o vale sem sequer consultarem a população», revolta-se ainda, 28 anos depois. 
«Nessa altura o ministério da agricultura defendia com unhas e dentes a plantação de eucalipto.» Álvaro Barreto, titular da pasta, fora anos antes presidente do conselho de administração da Soporcel e tornaria ao cargo em 1990, pouco depois das gentes de Valpaços lhe fazerem frente.
(...)

POR ONDE ANDA O JUÍZO DE ALGUNS JUÍZES?

É impossível ler sem um sobressalto. A imprensa de ontem noticiava que o Tribunal de Felgueiras condenou dois homens a penas suspensas num caso de violência doméstica. O marido e um outro individuo com quem a vítima teve uma relação extraconjugal que interrompeu juntaram-se e sequestraram a mulher agredindo-a usando uma “moca” com pregos.
O Ministério Público recorreu e o Tribunal da Relação do Porto manteve a pena suspensa com base num acórdão que é uma peça antológica e inspiradora do que não deve ser a justiça.
Nesse acórdão a justificar a manutenção da pena suspensa lê-se que "O adultério da mulher é um gravíssimo atentado à honra e dignidade do homem. Sociedades existem em que a mulher adúltera é alvo de lapidação até à morte. Na Bíblia, podemos ler que a mulher adúltera deve ser punida com a morte".
Assim sendo, “O adultério da mulher é uma conduta que a sociedade sempre condenou e condena fortemente (e são as mulheres honestas as primeiras a estigmatizar as adúlteras) e por isso vê com alguma compreensão a violência exercida pelo homem traído, vexado e humilhado pela mulher.”
Confesso que é difícil entender, trata-se uma decisão criminosa.
Antes de mais para referir que o Tribunal da Relação do Porto parece constituir um estudo de caso em matéria de decisões desta natureza,
No Público na peça sobre o caso em cima lê-se que também neste Tribunal num caso de violência doméstica, as agressões à mulher foram desvalorizadas por ela “trair o marido”. Diz o acórdão que “Uma mulher adúltera é uma pessoa dissimulada, falsa, hipócrita, desleal, que mente, engana, finge. Enfim, carece de probidade moral”, pelo que “Não surpreende que recorra ao embuste, à farsa, à mentira para esconder a sua deslealdade e isso pode passar pela imputação ao marido ou ao companheiro de maus tratos”. Notável.
Deixem-me ainda recuperar mais dois da Relação do Porto.
Um funcionário da REFER praticou fraudes que prejudicaram a empresa beneficiando o empresário condenado no Processo face Oculta. Foi condenado em Tribunal por ter sido comprovado o seu comportamento lesivo da empresa que, aliás, era recorrente.
A REFER numa estranha quanto injusta decisão face a tão competente e leal funcionário instaurou-lhe um processo que acabou com o despedimento por justa causa.
O íntegro empregado sentiu-se injustiçado foi para Tribunal e ... ganhou, não havia justa causa para despedimento. A REFER recorreu e o Tribunal da Relação do Porto, tinha de ser, voltou a considerar a não existência de justa causa condenando a REFER numa indemnização de 80 000 € ao seu ex-diligente e honesto funcionário.
Um outro caso de notória gravidade e que na altura foi divulgado
Em 2011 o Tribunal da Relação do Porto 2011 absolveu um psiquiatra que, comprovadamente, sublinho comprovadamente, violou uma paciente que acompanhava num quadro de depressão. A justificação para a absolvição foi que o psiquiatra criminoso violou a paciente mas não usou de violência. Notável e criminosa esta decisão.
Por onde anda o juízo de alguns juízes?
Muitas vezes tenho referido no Atenta Inquietude que uma das dimensões fundamentais para uma cidadania de qualidade é a confiança no sistema de justiça. É imprescindível que cada um de nós sinta confiança na administração equitativa, justa e célere da justiça. Assim sendo, a forma como é percebida a justiça em Portugal, forte com os fracos, fraca com os fortes, lenta, mergulhada em conflitualidade com origem nos interesses corporativos e nos equilíbrios da partidocracia vigente constitui uma das maiores fragilidades da nossa vida colectiva.
Como podemos lidar com esta forma de administrar a justiça?

domingo, 22 de outubro de 2017

"SABER CUIDAR DE SI"

Umas notas na Visão online sobre a importância da promoção da autonomia e auto-regulação de crianças e adolescentes nos processos educativos familiares e escolares.
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OS DIAS DO ALENTEJO. VOLTOU A CHUVA

Esta semana trouxe as primeiras chuvas ao Alentejo. Desde há muitos meses, demasiados meses que tal não acontecia. A terra gretada e desesperada por água já mudou de cor, um castanho mais escuro e amaciou. Uma terra que é milagrosa, uns dias, poucos, de chuva e o pasto a rebentar começando a emergir um verde que é vida e rapidamente irá tapar o castanho que ainda predomina.
Deu para fabricar um bom bocado de terra para começar a preparar a horta. O cheiro da terra molhada a ser fabricada é redentor e assinala um novo começo. Seria desejável que este novo começo fosse mais amplo.
Já ficaram na terra umas dezenas de pés de couve que imploravam passar dos criadores para a terra grande.
Nas oliveiras, a azeitona também mirrava por falta de água e ameaça o azeite que dará. Nota-se alguma diferença, esperemos que ainda encha um pouco e não fica gafada, o tempo vai quente. O lagar vai abrir e veremos que azeitona lá levarei.
Lamentavelmente, parece que a água não irá voltar por estes dias mais próximos. Que volte depressa.
São também assim os dias do Alentejo.

sábado, 21 de outubro de 2017

"A ESCOLA NÃO PODE SER UMA EMPRESA PORQUE A LÓGICA DA EDUCAÇÃO NÃO É A DO MERCADO"

Gostei de ler a entrevista a Nuccio Ordine que esteve em Lisboa a participar numa iniciativa da Fundação Francisco Manuel dos Santos. Nuccio Ordine é professor universitário e autor do livro “A Utilidade do Inútil” que merece leitura.
Um excerto sobre a escola.
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DOS MIÚDOS COM O MUNDO ÀS COSTAS

Num dos raros exemplos de unanimidade a Assembleia da República aprovou uma recomendação ao Governo no sentido de desenvolver um conjunto de medidas que promovam o aligeirar do peso das mochilas transportadas pelos alunos portugueses.
A recomendação surge na sequência de uma petição pública e com o apoio de diferentes especialistas face à preocupação com os riscos desse peso excessivo. Diferentes estudos sugerem que sete em cada dez crianças transportam às costas um peso superior ao aconselhado pela OMS, 10% do seu peso corporal.
Como escrevi na altura acho que existem muitas matérias que não deveriam ser objecto de legislação, o bom senso deveria bastar mas assim não é, esperemos que algo surja no sentido de minimizar a situação que para algumas crianças é mesmo pesada. Daí a insistência no que na altura referi.
Como é óbvio esta preocupação, pelas suas implicações e riscos, imediatos e a prazo, para a saúde dos miúdos, deve merecer a atenção de pais e educadores no sentido de a minimizar, embora, por outro lado, o seu transporte configure um exercício físico que disfarça a ausência de espaços e equipamentos adequados em muitas das nossas escolas e combata uma infância sedentarizada, a troco, é certo, de uma coluna castigada.
No entanto, aproveitando o espaço e o tempo de reflexão criados talvez também fosse útil olhar de uma forma mais alargada para o peso excessivo que muitas crianças carregam nas suas costas.
As mochilas escolares serão apenas um dos carregos, por assim dizer, mas existem outros que temo ficarem fora deste conjunto de recomendações.
Estou a pensar no peso da pressão para que sejam excelentes.
Estou a pensar no peso da pressão para que sejam o que não são e da pressão para que não sejam o que são.
Estou a pensar no peso da pressão de viver demasiado só.
Estou a pensar no peso da pressão que leva a que, por vezes, só gritando e agitando-se se façam ouvir.
Estou a pensar no peso da pressão de não conhecer o caminho e sentir-se perdido.
Estou a pensar no peso da exclusão que muitos sofrem.
Estou a pensar no peso da pressão de actividades sem fim e, às vezes, sem sentido. Estou a pensar no peso da pressão do depressa e bem.
Estou a pensar no peso da pressão para sejam diferentes e na pressão para que sejam iguais.
Estou a pensar no peso da pressão causada por famílias demasiado distantes ou por famílias demasiado próximas ou ainda por famílias ausentes.
Na verdade, há miúdos que carregam o mundo às costas. Entende-se as preocupações dos professores, pediatras, psicólogos, ortopedistas, outros especialistas e de muitos de nós com a coluna dos miúdos.

sexta-feira, 20 de outubro de 2017

DIA MUNDIAL DE COMBATE AO BULLYING

Para que não nos esqueçamos o calendário das consciências determina para hoje o Dia Mundial do Combate ao Bullying. Também durante o mês de Outubro são desenvolvidas em diferentes comunidades educativas iniciativas com o objectivo de prevenir e chamar a atenção para este fenómeno. Algumas notas repescadas.
Diferentes estudos sugerem que em Portugal entre 20 a 30% de adolescentes até aos 13 e os 15 anos já se terá envolvido em episódios de bullying verificando-se com particular preocupação a subida significativa de cyberbullying e também o envolvimento de crianças mais novas.
Sabe-se também que a ocorrência de situações de bullying é bem superior ao número de casos que são relatados. Uma das características do fenómeno, nas suas diferentes formas, incluindo o emergente cyberbullying, é justamente o medo e a ameaça de represálias a vítimas e assistentes que, evidentemente, inibem a queixa pelo que ainda mais se justifica a atenção proactiva e preventiva de adultos, pais, professores ou funcionários.
Este cenário determinaria, só por si, um empenhado investimento em recursos e dispositivos que procurassem minimizar o volume de incidências, algumas das quais de gravidade severa.
Recordo um estudo com uma escala significativa divulgado na Lancet Psychiatry evidenciando que o bullying assume impactos negativos mais significativos no bem-estar psicológico dos adolescentes aos 18 anos que maus tratos de adultos sofridos na infância. Mostra ainda que crianças maltratadas na infância são vítimas potenciais de bullying em adolescentes.
Neste contexto e dada a gravidade e frequência com que ocorrem estes episódios é imprescindível que lhes dediquemos atenção ajustada, nem sobrevalorizando, nem tudo é bullying, o que promove insegurança e ansiedade, nem desvalorizando, o que pode negligenciar riscos e sofrimento.
Neste universo importa considerar dois eixos fundamentais de intervenção por demais conhecidos, a prevenção e a intervenção depois dos problemas ocorrerem. Esta intervenção pode, por sua vez e de forma simplista, assumir uma componente mais de apoio e correcção ou repressão e punição, sendo que podem coexistir. Com alguma demagogia e ligeireza a propósito do bullying, as vozes a clamar por castigo têm do meu ponto de vista falado mais alto que as vozes que reclamam por dispositivos de prevenção, intervenção e apoio para além da óbvia punição, quando for caso disso.
O volume de episódios mostra a necessidade de dispositivos de apoio e orientação absolutamente fundamentais para que pais, professores e alunos possam obter informação e apoio. Existem, felizmente, várias iniciativas com um trabalho importante mas apesar da colaboração em projectos nas escolas, estão fora da escola.
A existência de dispositivos de apoio sediados nas escolas, com recursos qualificados e suficientes, a presença de assistentes operacionais com funções de supervisão dos espaços escolares, é, a par de ajustamentos nos modelos de organização e funcionamento das escolas e de uma séria reestruturação curricular, uma tarefa urgente.
Do meu ponto de vista, o argumento custos não é aceitável porque as consequências de não mudar são incomparavelmente mais caras. Depois das ocorrências torna-se sempre mais fácil dizer qualquer coisa mas é necessário. Muitas crianças e adolescentes evidenciam no seu dia-a-dia sinais de mal-estar a que, por vezes, não damos atenção, seja em casa, ou na escola, espaço onde passam um tempo enorme.
Estes sinais não podem, não devem, ser ignorados ou desvalorizados. O resultado pode ser grave.

quinta-feira, 19 de outubro de 2017

A NORMALIDADE E SERVIÇOS MÍNIMOS EM EDUCAÇÃO

Através do blogue “Incluso” do João Adelino Santos, a quem agradeço o trabalho desenvolvido, tive acesso a um ofício da ANESPO – Associação Nacional de Escolas Profissionais dirigido ao Presidente da Comissão Directiva do Programa Operacional Capital Humano no âmbito do Portugal 2020.
O texto aborda a situação de alunos com necessidades educativas especiais, em particular, os que estão ao abrigo de uma coisa bizarra e ainda em vigor que se chama “Currículo Específico Individual”.
Do entendimento da ANESPO expresso na parte final do texto sobre o trabalho com alunos com necessidades transcrevo duas alíneas sublinhando o que me merece reflexão:
b. As Escolas Profissionais devem organizar os processos educativos e formativos numa lógica de integração dos alunos com necessidades especiais nas respetivas turmas tendo sempre em conta os centros de interesse dos alunos, os princípios da individualização da formação, a pedagogia de projeto e o respeito pelos diferentes ritmos de aprendizagem, sendo considerado normal que um aluno com deficiência, tal como tantos outros considerados “normais”, não completem os percursos formativos e sejam, parcialmente, certificados;
d. As Escolas Profissionais devem sinalizar os alunos portadores de deficiência e desenvolver as atividades formativas numa lógica de envolvimento social que propicie a aquisição de saberes e competências, mínimos, escolar e profissionalmente. 
As notas seguintes não têm rigorosamente a ver com a competência e o trabalho das escolas profissionais, uma peça essencial na construção dos projectos de vida de tantos jovens, incluindo os que têm necessidades educativas especiais. A minha questão remete para as representações e expectativas presentes no texto de "entendimento" sobre os objectivos e o trabalho a desenvolver com estes alunos.
Como se sabe, está estudado de há muito o efeito que as representações e expectativas têm nos processos educativos.
Nesta perspectiva, considerar-se “normal” que os alunos como sem NEE não completem os “percursos formativos” não pode deixar de influenciar o trabalho desenvolvido, baixa as expectativas pelo que elas tendem a confirmar-se, é quase sempre assim. A questão é que se um percurso formativo está definido adequadamente para os seus destinatários, o “normal” é que todos o completem, o contrário é que a excepção que sabemos acontecer mas não pode ser a normalidade.
Na segunda alínea citada afirma-se o "entendimento"  de que as actividades formativas devem providenciar a aquisição de saberes e competências “mínimos", quer escolares quer profissionais.
Peço desculpa mas voltamos ao mesmo, o objectivo de qualquer processo educativo é providenciar saberes e competências MÁXIMOS para cada aluno ou para cada grupo, considerando, evidentemente, as suas características. O objectivo é sempre atingir oa melhores resultados possível, não cumprir "mínimos".
Mais uma vez, se tivermos como expectativa, representação ou objectivo o cumprimento de “serviços mínimos” educativos é claro que o resultado final é mais baixo independentemente das características dos alunos.
Neste contexto, não se zanguem comigo, e como já escrevi muitas vezes, podemos correr o risco de desenvolver um trabalho inconsequente, assente em avaliações pouco consistentes, descontextualizado, mobilizando pouca participação e envolvimento nos contextos em que os alunos se inserem. Dito de outra maneira, o trabalho desenvolvido com estes alunos pode ser ele próprio um factor de debilização, ou seja, alimenta a sua incapacidade, numa reformulação do princípio de Shirky.
Tal facto, não decorre da incompetência genérica dos técnicos e professores, julgo que na sua maioria serão empenhados e competentes, mas da sua própria representação sobre este grupo de alunos, isto é, não acreditam que eles realizem ou aprendam. Desta representação resultam situações e contextos de aprendizagem, tarefas e materiais de aprendizagem, expectativas baixas traduzidas na definição de objectivos pouco relevantes, na participação reduzida em actividades comuns que, obviamente, não conseguem potenciar mudanças significativas o que acaba por fechar o círculo, eles não são, de facto, capazes. É um fenómeno de há muito estudado.
O que acontece, sem ser por magia ou mistério, é que quando nós acreditamos que os alunos são capazes, eles não se "normalizam" evidentemente, mas são, na verdade, mais capazes, vão mais longe do que admitimos. Não esqueço a gravidade de algumas situações mas, ainda assim, do meu ponto de vista, o princípio é o mesmo, se acreditarmos que eles progridem e são capazes de ... , o que fazemos, provoca progresso, o progresso possível.
E isto envolve professores do ensino regular, de educação especial, ensino profissional, técnicos, pais, lideranças políticas e toda a restante comunidade.
Toda esta matéria, a educação de crianças ou jovens com necessidades especiais, assenta, do meu ponto de vista em quatro ideias estruturantes de todo o trabalho, estar, participar, pertencer e aprender, operacionalizadas numa perspectiva de diferenciação e não de normalização.
É neste sentido que devem ser canalizados os esforços e os recursos que devem, obrigatoriamente, existir.

NOVO PORTAL, "A EDUCAÇÃO EM EXAME"

A informação é uma das bases para o conhecimento e para os processos de tomada de decisão. No universo da educação também. É verdade também que os discursos e as politicas em educação são também contaminados por visões diferenciadas da sociedade e da educação, as famosas questões "ideológicas", e os dados são muitas vezes “torturados” para que digam o que convém ou o que "queremos" que digam.
No entanto e apesar de tudo, embora já existam muitas bases de dados Disponíveis regista-se a existência de um novo portal, “A Educação em Exame”, da responsabilidade da Fundação Francisco Manuel dos Santos, em parceria com o Conselho Nacional de Educação e o com Expresso.
O portal permite o acesso a um enorme volume de dados no âmbito das várias edições do PISA (Programme for International Student Assessment), quer em termos nacionais, quer em termos comparativos com os restantes países envolvidos.

quarta-feira, 18 de outubro de 2017

DO FECHAMENTO DE ESCOLAS

De acordo com o relatório Regiões em Números 2015/2016 da DGEEC entre 2006/2007 e 2015/2016 o número de escolas passou de 10.071 para 5.781.
Conforme uma notícia divulga em maio este processo não estará fechado pois a agenda de trabalho entre o ME e a Associação Nacional de Municípios contemplará a continuidade do processo de reestruturação da rede escolar, isto é, o encerramento de escolas.
Tal como se verifica com a significativa queda do número de professores também o encerramento de escolas não é apenas justificado pelo abaixamento do número de alunos. Como muitas vezes escrevi a política de encerramento de escolas assentou num princípio necessário de reorganização de uma rede já desadequada por ineficiente e onerosa.
No entanto, considerando os impactos que o encerramento dos equipamentos sociais têm na desertificação do país e nas assimetrias de desenvolvimento, a decisão de encerrar escolas não deveria ter sido ser vista exclusivamente do ponto de vista administrativo e económico. Não pode assentar em critérios cegos e generalizados, esquecendo particularidades contextuais e, sobretudo, não servir como tudo parece servir em educação, para o jogo político, local ou nacional.
Por outro lado, este movimento de reorganização da rede escolar e fechamento de escolas, de construção dos centros educativos e da constituição de mega-agrupamentos, criou situações em que as dimensões e características são fortemente comprometedoras da qualidade, com potenciais riscos e consequências conhecidos e estudados, os mega-agrupamentos tendem a produzir mega-problemas.
É também verdade que menos escolas e agrupamentos e direcções unipessoais tornam também mais fácil o controlo político de um sistema ainda altamente centralizado apesar da retórica de autonomia. Este controlo é, naturalmente, uma tentação de sempre de qualquer pode.
De há muito que se sabe que um dos factores mais contributivos para o insucesso, absentismo e problemas de disciplina escolar é o efectivo de escola. Não é certamente por acaso, ou por desperdício de recursos, que os melhores sistemas educativos, lá vem a Finlândia outra vez, mas também os Estados Unidos ou o Reino Unido procurando a requalificação da sua educação, optam por estabelecimentos educativos que não ultrapassam a dimensão média de 500 alunos. Sabe-se, insisto, de há muito, que o efectivo de escola está mais associado aos problemas que o efectivo de turma, ou seja, simplificando, é pior ter escolas muito grandes que turmas muito grandes, dentro, obviamente dos limites razoáveis. É certo que o ME, sobretudo a partir de Maria de Lurdes Rodrigues e com Nuno Crato, fez o pleno, aumenta o número de alunos por escola e o número de alunos por turma o que leva à “dispensa” de professores. O processo de redução do número de alunos por turma foi iniciado e está em curso timidamente.
As escolas muito grandes, com a presença de alunos com idades muito díspares, são autênticos barris de pólvora e contextos educativos que dificilmente promoverão sucesso, qualidade e inclusão apesar do esforço de professores, alunos, pais e funcionários. Recorrentes episódios e relatos de professores sustentam esta afirmação.
Por outro lado, a experiência já conhecida mostra casos de distâncias grandes entre a residência dos miúdos e os centros escolares, levando que devido à difícil gestão dos transportes escolares, os miúdos passem tempos sem fim nos centros escolares, experiência que não é fácil, sobretudo para os miúdos mais pequenos.
Em síntese, parece-me razoável que algumas escolas, sobretudo do 1º ciclo, tenham sido encerradas mas o recurso a critérios burocratizados e administrativos, como a análise simples do número de alunos, levou a situações de sério compromisso da qualidade da educação e mesmo da qualidade de vida de muitos alunos.
Seria desejável não esquecer e avaliar o que se tem passado.

NÃO

Não, a bonança não vem só porque saiu a Ministra Constança.
Não, o inferno não acabou apesar da chuva e do diabo anunciado por Passos Coelho ter faltado.
Não, o risco de incêndio não baixa com a chegada da chuva, os incendiários de serviço bem se esforçam.
Não, uma população maioritáriamente rural, isolada e envelhecida num território maltratado e mal gerido não pode proteger-se se nem os meios dos serviços da protecção civil são capazes de lhe acudir e... proteger. Tenham tento no que dizem.
Não, não precisam de inventar soluções, elas são conhecidas de há muito. "Apenas" são necessárias e urgentes acções e decisões, incluindo o combate sério aos múltiplos interesses envolvidos.
Não, a política pequenina do Portugal dos pequeninos não pode ser maior que a enormidade da tragédia, da dor e do respeito e solidariedade que merece.
Não, não há santos e pecadores, todos têm responsabilidade, não adianta andar de cristas no ar.
Não, não há desculpa para a não apresentação formal de um pedido de desculpas, falhámos como e onde não podíamos ter falhado.
Não, não  esqueçam os muitos que perderam a vida e os muitos mais que perderam tudo na vida.
Para que não volte a acontecer.

terça-feira, 17 de outubro de 2017

SOMBRAS

(Foto de Mico)

Era uma vez uma terra em que as únicas sombras presentes nas vidas dos miúdos eram as que o Sol oferecia a cada um.
Tantos miúdos com a vida assombrada. Nota-se nos olhos sombrios e nas sombrias memórias que carregam.

segunda-feira, 16 de outubro de 2017

JÁ CHEGA!

É impossível ficar indiferente.
A enormidade da tragédia, das tragédias, que temos vivido com os incêndios, em particular, evidentemente, os mais atingidos, mostra o quão pequeninas são boa parte das nossas lideranças políticas e figuras, entre quem governa, entre quem governou, entre quem nos quer governar ou "guiar", entre quem perora sobre o tudo quando ... sabe  pouco mais do que nada, ou entre quem tem o dever de informar e não vender imagens e discursos que nos indignam.
O tempo, a tragédia, a dor, a ética, a solidariedade, o respeito, mais do que aconselhar, exigem contenção nos discursos e acção, não distração e "política pequenina" visando a contabilidade nas urnas ou o ... que acham que o "povo" quer ouvir.
Estou errado?

OS CONSUMOS DOS ADOLESCENTES

Agora no Expresso online está disponível um trabalho sobre o consumo de álcool entre adolescentes e jovens com dados no mínimo inquietantes.
O consumo de álcool tem vindo a crescer alterando-se também os padrões de consumo, beber na rua (é bastante mais barato) e o consumo excessivo e rápido (binge drinking) são duas características presentes. Segundo alguns especialistas, a embriaguez parece deixar de ser uma consequência do consumo excessivo para passar a ser um objectivo em si mesmo. Este padrão tem vindo a ser sublinhado por diferentes estudos sobre os hábitos dos adolescentes e jovens portugueses, cerca de 80% dos jovens com 15 anos consomem álcool segundo um trabalho da Unidade de Alcoologia de Coimbra do IDT e em 2007 56% dos jovens com 16 anos inquiridos referiram este tipo de consumos enquanto em 2003 o indicador era de 25%.
No mesmo sentido um estudo de 2015 do Serviço de Intervenção nos Comportamentos Aditivos e nas Dependências mostrou que 31% dos alunos com 13 anos já experimentaram álcool, especialmente cervejas e misturas. Algumas notas mais.
Uma primeiro aspecto a considerar é o facto de os adolescentes poderem facilmente comprar cerveja e outras bebidas, as “litrosas” ou os shots, como lhes chamam, no comércio mais habitual, lojas de conveniência ou pequenos estabelecimentos de bairro, a um preço bem mais acessível que nos estabelecimentos que frequentam na noite e recorrendo à “toma” simples ou com misturas ao longo da noite, comprida aliás. A presente legislação restringe o comércio e estabelece multas bem mais pesadas mas veremos o efeito prático pois em diferentes domínios a restrição devido à idade nem sempre é respeitada.
O consumo em quantidade e em grupos, sobretudo ao fim-de-semana, é muitas vezes entendido e sentido como o factor de pertença ao grupo, potenciando a escalada do consumo, juntos bebemos mais do que sós, como é óbvio e o estado que se atinge é sentido como um "facilitador" relacional e como é recomnhecido o controlo das idades de quem compra seja ineficaz e facilmente ultrapassado.
Muitos adolescentes, ouvidos em estudos nesta matéria, referem ainda a ausência de regulação dos pais sobre os gastos, sobre os consumos ou sobre as horas de entrada em casa, que muitas vezes tem que ser discreta e directa ao quarto devido ao “mau estado” do protagonista.
Como é evidente, já muitas vezes aqui o tenho referido com base na minha experiência de contacto com pais de adolescentes, não estamos a falar de pais negligentes. Podem acontecer situações de negligência mas, na maioria dos casos, trata-se de pais, que sabem o que se passa, “apenas fingem” não perceber desejando que o tempo “cure” porque se sentem tremendamente assustados, sem saber muito bem o que fazer e como lidar com a questão. De fora parece fácil produzir discursos sobre soluções, mas para os pais que estão “por dentro” a situação é muitas vezes sentida como maior que eles.
É preciso que a comunidade esteja atenta a estes adolescentes que logo desde os 13 ou 14 anos “acedem” às “litrosas” e aos shots e também aos seus pais que muitas vezes estão tão perdidos quanto eles.
Apesar de se poder vir a legislar no sentido de apenas aos 18 anos ser permitida a aquisição de qualquer tipo de álcool, parecem-me imprescindíveis a adequada fiscalização e a criação de programas destinados a pais e aos adolescentes que minimizem o risco do consumo excessivo.
A proibição, como sempre, não basta, restringir a publicidade só por si não adianta.

A DEMISSÃO É FACILITISMO, DIFÍCIL É FICAR

Em Portugal existe o generalizado hábito entre a classe política, mas não só, de sempre que existe um problema de maior ou menor gravidade em qualquer área ou sector se levantar um coro afinado clamando pela demissão do ou dos responsáveis dessa área ou sector.
Como tantas vezes tenho escrito é evidente que as eventuais responsabilidades devem ser apuradas e a culpa, se a houver, não pode morrer solteira no reino da impunidade, característica do pantanoso estado da nossa democracia.
No entanto, do meu ponto de vista, a demissão imediata é a saída mais fácil e mais cómoda para os eventuais responsáveis, livram-se de responsabilidades e entram no limbo do esquecimento, por vezes até chegam a senadores, um pessoal que perora sobre tudo como se nunca tivesse responsabilidade de nada. Em muitas circunstâncias, a demissão não é um acto de coragem é um acto de cobardia política.
Curiosamente, o coro que exige a demissão parece ter uma vitória que, do meu ponto de vista, alimenta a espuma dos dias, é irrelevante mas faz parte da pequena política do Portugal dos Pequeninos. Boa parte da imprensa, com agenda alinhada, faz parte deste coro para além de, caso das tragédias com os incêndios, nos proporcionar  peças televisivas que deveriam ter um aviso prévio     para que não fossem vistas por pessoas com sensibilidade moral, sentido de dignidade, respeito pela dor e tragédia alheia, percepção adequada de valores de natureza ética, enfim, de que se tratam de uma experiências limite. Porquê, para quê, em nome de quê?
Difícil quando algo corre mal é ficar, lidar com as consequências, aceitar escrutínios independentes sobre o que aconteceu e correu mal e, finalmente, então assim, se for caso disso, assumir a decisão de se demitir.
Serei só eu a pensar assim?

O INFERNO TRÁGICO VOLTOU

O inferno voltou para nos assombrar. Retornou com uma violência brutal e trágica que não acreditámos possível em tão pouco tempo.
Não parece haver volta a dar. Todos os anos se anunciam novas estruturas de resposta rápida e meios de combate, designadamente meios aéreos mais sofisticados e somos informados de melhorias nos dispositivos de prevenção e combate, no aumento de meios à disposição, na racionalização da gestão dos recursos, etc. etc.
Entretanto, quando irrompem as chamas surge também o habitual, a comunicação social, sobretudo a televisiva, de forma frequentemente sem pudor, respeito e competência, a mostrar o "terreno", o "cenário dantesco", a ouvir "moradores que passaram uma noite em branco", a ouvir o "senhor comandante dos bombeiros", a referir os "meios aéreos, dois Canadairs e um Kamov", a ouvir os "responsáveis locais ou regionais da protecção civil", a gravar despudoradamente imagens de dor, sofrimento e perda de gente anónima que tendo quase nada, vê arder o quase tudo. Um filme dramático sempre visto e sem surpresas.
Este ano acresce a tragédia da morte numa tão grande dimensão que se torna difícil de acomodar.
É evidente que que as condições atmosféricas têm sido particularmente desfavoráveis, mas a falta de prevenção, a negligência e delinquência dão um contributo fortíssimo ao inferno que sobressalta cada Verão.
Sem nenhuma espécie de conhecimento destas matérias, para além do interesse e preocupação de um cidadão minimamente atento e preocupado com os custos enormes destes cenários de destruição, tenho alguma dificuldade, considerando a dimensão do nosso país, em compreender a inevitabilidade destes cenários. Os espanhóis têm por uso afirmar que os incêndios se combatem no inverno, nós combatemo-los no inferno.
Insisto. Trata-se de um destino que não pode ser evitado? Trata-se de uma área de negócios, a fileira do fogo, que, pelos muitos milhões que envolve, importa manter e fazer funcionar sazonalmente? Trata-se "só" de incompetência na decisão política e técnica em termos de resposta e prevenção? Trata-se da falência de modelos de desenvolvimento facilitadores de desertificação e abandono, designadamente das áreas rurais? Trata-se basicamente de negligência e, ou delinquência?
O poeta falava de um fogo que arde sem se ver, é bonita a imagem. Mas quando um fogo arde e se vêem os seus efeitos devastadores e dramáticos, quando rouba a vida a tantas pessoas, dói, dói muito e não se perdoa. Não sabemos o quê nem a quem.
A dor é imensa.

domingo, 15 de outubro de 2017

FILHOS, UM BEM DE PRIMEIRA NECESSIDADE MAS MUITO CARO

O Expresso tem na revista um trabalho sobre os custos que as famílias suportam em matéria de educação que merece leitura atenta.
Apenas uma nota para sublinhar o que se passa em matéria de educação pré-escolar apesar do ME ter avançado com promessa de assegurar o acesso universal aos 3 anos a partir de 2019.
Conforme aqui tenho referido os custos de serviços de educação pré-escolar em Portugal são dos mais caros em termos europeus.
É referido na peça e sentido por muitas famílias qeue em diferentes instituições, sobretudo nas grandes cidades onde a procura é grande, o custo da educação pré-escolar é superior aos custos de propinas no ensino superior, mesmo em instituições privadas. Não será evidentemente por acaso que segundo o “Inquérito à Fecundidade em Portugal”, produzido em 2013, as “despesas associadas a ter filhos” foram consideradas a mais frequente justificação para não ter filhos, 67% dos inquiridos, ou menos filhos, 84%.
Esta situação é um dos grandes obstáculos a projectos familiares que envolvam filhos e é também por isso e pela importância da educação de infância para as crianças que esta matéria deve integrar obrigatoriamente políticas de famílias mais eficazes.

DA INDIGNIDADE

Os bispos portugueses irão discutir um Decreto da Congregação para o Clero que estabelece que os candidatos a padres irão ser avaliados à entrada no seminário. A avaliação não se destina a aferir da sua vocação e decisão mas a avaliar se têm “tendências homossexuais”, se são pedófilos ou têm doença mental.
Segundo a imprensa os testes serão realizados por psicólogos e cito, “vão envolver familiares, padres e “senhoras que conheçam o candidato”. Também lhes vai ser perguntado se fizeram psicoterapia no passado.” Segundo o texto em discussão, “a igreja não pode admitir aqueles que praticam a homossexualidade, apresentam tendências homossexuais profundamente radicais ou apoiam a cultura gay”.
Nem sei muito bem o que dizer mas … não é possível.
Recordo-me de D. Manuel Martins, bispo emérito de Setúbal e recentemente falecido, afirmar em 2012 que a Igreja não está à altura do momento, está "atrasada" e não presta atenção às "transformações do mundo".
Um dia, talvez a instituição Igreja aceite e perceba a importância e a necessidade de mudança no discurso e nas atitudes relativas ao divórcio e casamento, à orientação sexual, às uniões entre pessoas do mesmo sexo e adopção por parte destes casais, à anti-concepção, ao celibato dos padres, à abertura do sacerdócio às mulheres, o combate à ostentação visível em parte das estruturas da igreja, etc.
No entanto, considerando o que se tem ouvido e é conhecido das intervenções da hierarquia da Igreja, não creio que, apesar de alguns comportamentos e discursos do Papa Francisco e também da significativa mudança de estilo face ao seu antecessor Bento XVI, seja de esperar um movimento de alteração significativa nas posições da Igreja sobre estas matérias.
Tenho ainda curiosidade de saber como considera a Ordem dos Psicólogos Portugueses esta eventual intervenção de profissionais de psicologia neste processo.

PS - Ainda volto a este texto para referir uma outra indignidade. Inúmeros comentários que tenho lido referem afirmações como "mas porquê saber se são homossexuais se os padres não se podem casar". O engraçadismo anda por vezes muito perto da boçalidade, da intolerância e do disparate. Não é que me surpreenda, já não consigo, tal como não consigo ficar indiferente.

sábado, 14 de outubro de 2017

DO ENSINO SUPERIOR

No Jornal de Letras está uma entrevista com a Secretária de Estado da Ciência, Tecnologia e Ensino Superior.
A entrevista é interessante julgo importante registar algumas ideias sem o restante seja desvalorizado, antes pelo contrário.
Uma primeira referência à preocupação com a promoção do acesso a formação superior nas suas diferentes configurações. Em Portugal não existem demasiados cidadãos com formação superior, antes pelo contrário, precisamos de melhorar os nossos indicadores. No mesmo sentido registo a preocupação de minimizar o abandono. É reafirmado o facto tantas vezes esquecido de que Portugal é um dos países em que a formação superior mais compensa.
Uma outra ideia prende-se com a intenção de promover através de adequados dispositivos o acesso ao ensino superior de alunos com necessidades especiais. Efectivamente, considerando o número de alunos nesta situação que frequenta o ensino secundário e o número baixíssimo que transita para o ensino superior torna-se evidente o quanto está por fazer como tantas vezes aqui referi.
Uma terceira nota para sublinhar a importância atribuída à oferta e de formação e investigação nas áreas das ciências sociais e das humanidades. Este entendimento é claramente diferente para melhor relativamente à crática negrura que se abateu em particular neste domínio da investigação.
Uma nota lateral para registar com agrado o aumento da verba prevista para investigação na proposta de OGE para 2018.
Vamos acompanhando desejando a confirmação dos caminhos enunciados.

sexta-feira, 13 de outubro de 2017

DO NÚMERO DE DOCENTES. DE NOVO

Conforme é conhecido, a Comissão Europeia no seu recente relatório de vigilância sobre o período pós-troika avisa, “exige”, que o aumento de professores que se tem vindo a registar “de forma consistente” desde 2015 “tem de contribuir efectivamente para melhorar os resultados da educação. Em texto anterior falei sobre a abusiva, apressada e ligeira relação directa entre “aumento” de professores e “melhoria de resultados” e coloquei a dúvida sobre o “aumento consistente de professores. Algumas notas sobre o número de docentes tendo já em conta a vinculação extraordinária deste ano e a prevista no OGE para 2018.
Em primeiro lugar importa sublinhar que com o argumento pouco sustentável do abaixamento do número de alunos, os dados mostram a inexistência de proporcionalidade, muitos milhares de professores foram empurrados para fora do sistema.
De facto, de acordo com o Relatório “Perfil do Docente” divulgado em 2016 pela Direcção-Geral de Estatísticas da Educação e Ciência o número de alunos no básico e secundário baixou 6.2%, isto significa menos 92 423 entre 2004 e 2015. Quanto aos professores, no mesmo período abandonaram 42165, 25% dos que estavam em 2004/2005. A saída verificou-se em todos os patamares de ensino mas com maior significado no 3º ciclo e no secundário (40% dos que saíram) quando nos últimos anos a população escolar no secundário até subiu devido ao alargamento da escolaridade obrigatória. Considerando os grupos de docência as assimetrias foram significativas
No ensino público registaram-se 98% dos abandonos, as escolas públicas tiveram quatro vezes mais saídas que os estabelecimentos privados.
Dito de outra maneira temos menos 1 professor por cada 2.1 alunos a menos. Aliás, considerando a redução de postos de trabalho na administração entre 21011 e 2013 o MEC contribuiu com 68% dos empregos extintos.
O menor número de alunos não serve pois de justificação para a enorme sangria que deixou uma classe desvalorizada e envelhecida o que aliás aponta para a necessidade a prazo de alguns milhares de professores devido ao envelhecimento brutal da classe que motivará a saída.
Também deve recordar-se que face a um outro argumento que servia de base às políticas que sofremos, em Portugal nos últimos anos, o rácio entre professores e alunos estava na média europeia, importa considerar variáveis como os modelos de organização dos sistemas, gcargas horárias, funções, etc. influenciam esta leitura.
Na verdade, a maioria dos professores que saíram foi empurrada para fora por um conjunto de dimensões ligadas às políticas educativas dos últimos anos, com José Sócrates e a devastação provocada por Passos Coelho a partir de 2011 com o fundamentalismo austeritário,  cerca de 75% do total de professores que saíram fizeram-no neste período.
A justificação mil vezes repetida esperando que se tornasse verdade assentava na diminuição do número de alunos. Como já tenho referido, parece claro que a questão do número de professores necessário ao funcionamento do sistema é uma matéria bastante complexa que, por isso mesmo, exige serenidade, seriedade, rigor e competência na sua análise e gestão, tudo o que tem faltado nesta matéria.
Para além da questão da demografia escolar que, aliás, a tutela tem tratado de forma incompetente e demagógica, importa não esquecer que existem muitos professores deslocados de funções docentes, boa parte em funções técnicas e administrativas que em muitos casos seriam dispensáveis pois fazem parte de estruturas do Ministério pesadas, burocráticas e ineficazes.
Por outro lado, os modelos de organização e funcionamento das escolas, com uma série infindável de estruturas intermédias e com uma carga insuportável de burocratização, retiram muitas horas docentes ao trabalho dos professores que estão nas escolas.
É neste quadro que deve ser ponderada a interpretação do rácio entre o número de professores e o número de alunos.
No entanto e do meu ponto de vista, a saída dos professores, que nos venderam como estando “em excesso” de professores no sistema deve ser também analisado à luz de medidas das políticas educativas iniciadas ainda no tempo de José Sócrates e fortemente aprofundadas por Passos Coelho. Vejamos alguns exemplos.
Em primeiro lugar, as alterações no número de professores necessário decorre do aumento do número de alunos por turma que, conjugado com a constituição de mega-agrupamentos e agrupamentos ligada ao encerramento de milhares leva que em muitas escolas as turmas funcionem com o número máximo de alunos permitido e, evidentemente, com as implicações negativas que daí decorrem. Esperemos o efeito da anuciada e progressiva redução do  número de alunos por turma
As mudanças curriculares com a eliminação das áreas não curriculares que, carecendo de alterações registe-se, também produziram um desejado e significativo “corte” no número de professores, a que acresceram outras alterações no mesmo sentido.
Por outro lado, verificámos uma forte desvalorização salarial, o aumento da idade da reforma, o congelamento da progressão na carreira variáveis que contribuíram seriamente para o desencanto e partida de milhares de professores.
Acresce a tudo isto o clima e a instabilidade vividas nas escolas, a pressão constante para resultados e burocracia, a falta de apoios, etc.
Temos a tempestade perfeita. A saída destes milhares de professores sairá, gostava de me enganar, muito mais cara do que aquilo que o ME poupará na diminuição do número de docentes. Neste sentido, os processos de vinculação extraordinária que, aliás também correspondem a directivas de Bruxelas relativas à precariedade abusiva de muitos milhares de docentes contratados durante anos para responder a “necessidades transitórias” são um investimento mas também representam uma questão de justiça.
Conhecendo os territórios educativos do nosso país, julgo que faria sentido que os recursos que já estavam no sistema, pelo menos esses e incluindo os contratados com muitos anos de experiência, fossem aproveitados em trabalho de parceria pedagógica, que se permitisse a existência em escolas mais problemáticas de menos alunos por turma ou ainda que se utilizassem em dispositivos de apoio a alunos em dificuldades.
Os estudos e as boas práticas mostram que a presença de dois professores na sala de aula são um excelente contributo para o sucesso na aprendizagem e para a minimização de problemas de comportamento bem como se conhece o efeito do apoio precoce às dificuldades dos alunos. Agora andam a promover-se medidas que sempre lembram a velha imagem da manta.
Sendo justamente estes os dois problemas que mais afectam os nossos alunos, talvez o investimento resultante da presença de dois docentes ou de mais apoios aos alunos, compense os custos posteriores com o insucesso, as medidas remediativas ou, no fim da linha, a exclusão, com todas as consequências conhecidas.
É só fazer contas. As contas certas, claro.

quinta-feira, 12 de outubro de 2017

A TEMPESTADE

O Rapaz entrou na água e contrariamente ao costume não lhe custou. Estava um dia quente e a água não estava tão fria como era habitual naquela praia. Deu os primeiros mergulhos e piruetas e ficou a boiar com os olhos incomodados com o sol que brilhava lá em cima. Sabia mesmo bem entrar naquele mar e como ele gostava do mar.
Quase sem se dar conta, entre umas braçadas e uns mergulhos foi-se afastando da praia. De repente, o Rapaz sentiu qualquer coisa de estranho, ficou escuro, muito escuro. A água daquele mar começou a ficar fria e ele achou que era altura de sair. No entanto, no meio da escuridão não percebia para que lado deveria nadar. Ficou inquieto e ainda mais assustado se sentiu quando começou a ser sacudido por uma ondulação bem mais forte. Agora o Rapaz estava mesmo com muito medo, procurava manter-se ao cimo das ondas cada vez maiores, sentia cada vez mais frio e cada vez menos força e nem sequer vislumbrava por onde tentar sair.
Quando estava em desespero e a atingir o limite, o Rapaz fechou os olhos com força e, perplexo, quando os abriu viu a sua Mãe debruçada sobre si com o sorriso sereno que sempre usava perguntando, “Estás assustado Rapaz, era um sonho mau?”
“Não Mãe, estava só à tua procura”. E o Rapaz voltou-se para o outro lado e adormeceu tranquilamente.

SEM PERGUNTAS NÃO HÁ NOTÍCIAS

Ao que se lê na imprensa o Sindicato dos Jornalistas apela a que a classe "boicote" as conferências de imprensa ou declarações em que não sejam permitidas questões. Recentemente assim aconteceu com o anúncio da candidatura de Rui Rio à liderança do PSD ou na “reacção” de Ricardo Salgado ao despacho final de acusação da designada Operação Marquês.
É de recordar que no Congresso dos Jornalistas realizado em Janeiro foi aprovada por unanimidade uma decisão no mesmo sentido, as iniciativas com a proibição de perguntas não seriam noticiadas.
Como é evidente esta decisão não teve qualquer consequência e recorrentemente assistimos a estas deploráveis situações. 
Levada a sério e posta em prática poderia ser um forte contributo para combater o modo como muitas lideranças entendem o papel da imprensa, serve para divulgar apenas a mensagem que lhes interessa mostrando-se indisponíveis para responder a questões. A imprensa é apenas um veículo publicitário dos seus produtos ou “verdades”.
Para além desta atitude seria ainda desejável que quando colocam questões, os jornalistas façam as perguntas adequadas e não uma encenação de diálogo que mais não é que um monólogo a dois, ou seja, independentemente das perguntas, o inquirido fala do que quer sem que isso lhe seja cobrado.
É ainda de aguardar a reacção das empresas de comunicação a esta decisão dos jornalistas num tempo que em precariedade e competição os deixa mais vulneráveis a pressões.
Sei que não é fácil mas também tenho a convicção de que seria uma forma de proteger a própria imprensa e o seu papel insubstituível como um dos pilares das sociedades abertas e democráticas.