A propósito do Dia Mundial da
Poupança, sim também existe, a Associação de Professores de Ciências Económico
Sociais defende que seja criada “uma área disciplinar que promova, formalmente
e de modo universal, a educação económica e financeira dos alunos” do ensino
básico e secundário.
O ME afirma que no âmbito da disciplina
de Cidadania e Desenvolvimento criada no âmbito do projecto de flexibilidade
curricular que está em desenvolvimento em 236 escolas serão abordados estes conteúdos.
A Associação proponente defende esta perspectiva do ME “não resolve o problema,
uma vez que, para além de ser um tempo escasso, será sempre disputado por
outras vertentes da educação para o desenvolvimento pessoal e social e não
permitirá a construção de uma autêntica literacia financeira”. Algumas notas.
Não está, evidentemente, em
discussão a importância de que a educação de crianças e jovens envolva as diversas
questões presentes na vida das comunidades, aqui exemplificadas pela literacia
financeira, antes pelo contrário.
No entanto e por diversas
ocasiões tenho manifestado a minha reserva face ao entendimento de que tudo o
que de alguma forma possa envolver os mais novos e a sua formação deva ser
ensinado/trabalhado na escola. Esta visão obesa da escola não funciona, nem
tudo pode ou deve ser transformado em disciplinas, conteúdos escolares,
projectos, … para além de que a escola tem um conjunto de funções
incontornáveis que tornam finita a sua capacidade de responder.
Por outro lado, foi-se instalando
em Portugal, não só em Portugal mas também em Portugal, a ideia de uma
educação, de uma escola, fundamentalmente centrada em competências
instrumentais, em saberes “úteis”, "essenciais" como lhes chamava
Nuno Crato, destinada sobretudo a formar “técnicos” e não “cidadãos”
qualificados. Os currículos são progressivamente aliviados de conteúdos que não
sejam “práticos”, promotores de “produtividade”, “domínio de técnicas” como
seja toda a área da formação cívica, da educação para a saúde, dos valores, das
expressões e conteúdos artísticos, etc.
A escola deve formar empresários,
poucos, e técnicos qualificados e de formação estreita, muitos. Estas ideias
traduziram-se, traduzem-se apesar de algumas mudanças indiciadas e afirmadas,
nos conteúdos curriculares, nos modelos de avaliação, nas concepções do que
deve ser o trabalho dos professores, na organização do sistema educativo,
selectivo, prescritivo e incapaz de acomodar diferenças entre os alunos, etc.
Entretanto, com a mudança no ME e
a definição do Perfil do Aluno para o Séc. XXI reabriu-se a mudanças em matéria
de currículo, agora em modo flexibilidade mas ainda em período experimental e
para 235 escolas, públicas e privadas.
Sabemos que, independentemente
das opções e visões ideológicas, uma das questões que no universo a educação
estarão sempre em aberto é a que envolve os conteúdos e organização curricular.
De facto, a velocidade de produção e acesso ao conhecimento e ao
desenvolvimento, as mudanças nos sistemas e no quadro de valores das
comunidades determinam a regular reflexão e ajustamento sobre o que a escola
deve ensinar e trabalhar, sobretudo durante a escolaridade obrigatória.
Por outro lado, o tempo da escola
e a competência da escola são finitos, isto é, a escola não tem tempo nem pode
ou deve ensinar tudo. Lembram-se certamente das discussões sobre se matérias
como educação sexual, educação cívica, literacia financeira (sim, não é a
primeira vez que se fala disto), educação para a saúde, para citar apenas
alguns exemplos, deverão, ou não, constituir-se como "disciplinas",
conteúdos ou mesmo se devem integrar os currículos escolares.
Em princípio, independentemente
dos conteúdos poderem ser mais ou menos pertinentes, vejo sempre com alguma
reserva as propostas de introdução de mais uma disciplina, mais conteúdos, mais
um manual, mais umas orientações, mais um programa de formação de professores,
como se a escola, o currículo escolar, os conteúdos, as suas competências,
pudessem continuar a engordar indefinidamente. E não se trata de um problema de
recursos ainda que seja de considerar.
Como é evidente, pode dizer-se
sempre que muitas destas questões podem integrar o trabalho escolar
considerando até que os alunos passam um tempo imenso, diria excessivo, nas
escolas. Aliás, tal acontece em muitas escolas e agrupamentos.
A questão central, do meu ponto
de vista, é que as competências da escola, os conteúdos que nela são
trabalhados, integrando ou não formalmente os currículos, não podem mesmo
aumentar continuamente. Urge uma reflexão serena, participada e com tempo sobre
o ajustamento dos conteúdos, a sua integração e organização, a forma como podem
acomodar a diversidade dos alunos e a necessidade de diferenciação dos
professores, a formação global dos alunos e não exclusivamente a promoção de
competências instrumentais, etc.
Somar conteúdos e competências à
escola sem ajustamento dos conteúdos e organização existentes, pode promover
problemas e não soluções, de tanto que lhe exigem corre risco de não
providenciar o que lhe compete.
Na verdade, nem tudo o pode ser
interessante saber terá de caber numa disciplina da escola ou num conteúdo
escolar formal e nem tudo o que se pode saber se aprende na escola. A
dificuldade é que os alunos estão muito tempo na escola e a tentação é óbvia, a
escola que faça.
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