terça-feira, 8 de agosto de 2017

O CARRO-VASSOURA

Está na estrada, como dizem na televisão, a Volta a Portugal.
Creio que a Volta a Portugal já não tem hoje nem o espaço nem, talvez, o encanto de há alguns anos mas continua a atrair muita gente para a beira das estradas por onde passa. O período de férias, mais tranquilo, é amigo da memória e recordei a Volta a Portugal em bicicleta lá para trás no tempo.
Quando eu era miúdo a caravana da Volta a Portugal em bicicleta passava pertinho da minha terra. Quase sempre iniciava-se uma etapa em Cacilhas ou na Cova da Piedade e dirigia-se para sul, nessa altura, se bem me lembro a Volta era mesmo a Portugal, de cima a baixo.
Íamos ver passar a Volta no Laranjeiro, na EN 10 em frente à mítica loja de bicicletas do Jorge Pereira, tenho ideia que até havia uma meta com um prémio para o ciclista que a passasse em primeiro lugar.
Era dia de romaria, ia-se cedo para encontrar o melhor local de visão e o melhor acesso aos brindes distribuídos pelos "carros dos anúncios", como lhes chamávamos.
A passagem da caravana era breve e marcada pela tentativa de saber quem passava à frente na meta. Conhecíamos os ciclistas como hoje conhecemos os futebolistas, João Roque, Firmino Bernardino, o incontornável Joaquim Agostinho pelo Sporting ou os do Benfica, Américo Silva, Peixoto Alves, Wenceslau Fernandes, (pai da atleta de triatlo Vanessa Fernandes), por exemplo e sem ter a certeza de todos os nomes.
O segundo grande momento era a passagem, antes dos ciclistas, dos "carros dos anúncios" e a distribuição de ninharias cuja caça era uma tarefa complicada mas um desafio irresistível. O terceiro momento mais aguardado era a passagem do carro-vassoura que nos deixava sempre um pouco a pensar e a discutir entre nós como deveria ser difícil desistir, não poder seguir com os outros e ser recolhido numa viatura com o "simpático" nome de carro-vassoura. Quase sempre chegávamos à conclusão que um ciclista deveria mesmo sentir-se mal quando nele entrava, o que nos fazia ter "respeito", como dizíamos, pelo carro-vassoura.
Com esta memória da Volta a Portugal acesa de repente lembrei-me dos miúdos que vão entrar na escola daqui a umas semanas e que, de mansinho, mais cedo ou mais tarde, por uma razão ou por outra, começam a não ser capazes de acompanhar os outros e vão acabando, também eles, por entrar nos diferentes carros-vassoura que a vida vai pondo à frente dos que não acompanham o ritmo, seja ele qual for.
O problema é que, contrariamente ao que se passava no carro-vassoura da Volta a Portugal de onde se sai no fim de cada corrida para iniciar uma outra, muitos dos miúdos vão passar boa parte da sua vida nalgum carro-vassoura.

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