No Público está uma peça em que
se aborda a enorme falta de psicólogos nos centros de saúde e hospitais, o
número está muito longe de corresponder a indicadores internacionais de
cobertura. Um grupo de trabalho constituído para o efeito propõe a dotação das
instituições da saúde com os recursos adequados sublinhando as implicações do actual
cenário na saúde mental dos portugueses. Sabemos que as políticas de saúde têm
custos mas também está quantificado e estudado o impacto económico e social da
doença mental que tem sido, aliás, o parente pobre das políticas de saúde.
Dada a minha maior proximidade
com este universo umas notas mais direccionadas para a questão da saúde mental
de crianças e adolescentes desde logo sublinhando também a necessidade e a
urgência de criar nas comunidades mais e melhores respostas no
âmbito da saúde mental.
Dados do European School Survey
Project on Alcohol and Other Drugs de 2016 sugerem que 13% os jovens
portugueses até aos 16 anos consome antidepressivos e tranquilizantes. O estudo
envolveu 96043 jovens de 35 países, 3456 portugueses alunos de escolas
públicas. O valor é impressionante, a média é de 8%. Fenómenos como o mediatizado "Baleia Azul" não podem dissociar-se deste quadro.
Muitas vezes aqui tenho escrito
sobre a questão grave da saúde mental de crianças e adolescentes portugueses
que, do meu ponto de vista, tem sido uma área desvalorizada, aliás e como disse
acima, a saúde mental tem sido um parente pobre das políticas de saúde pública.
Um estudo divulgado em 2015
realizado pela Faculdade de Psicologia e Educação da Universidade de Coimbra em
colaboração com entidades estrangeiras apontava para que 8% por cento dos
adolescentes portugueses que frequentam o 8.º e o 9 º ano apresentam
sintomatologia depressiva e 19% estarão em risco de desenvolver a doença. O
estudo contemplava também um programa de prevenção a promover em meio escolar,
com a participação dos pais, que pareceu indiciar bons resultados.
Em Maio de 2014, o Expresso
relatava que em 2013 se tinham registado cerca de 20 000 novas consultas de
pedopsiquiatria, mais 30% que em 2011. Era um indicador preocupante e ainda
mais preocupante pela inexistência de resposta adequada e acessível para muitas
crianças e adolescentes.
Recordo também que em 2014 foi
noticiada a interrupção dos apoios a crianças e adolescentes da região do
Algarve pois o programa de que beneficiavam, Grupos de Apoio à Saúde Mental
Infantil, que já tinha merecido prémios de boas práticas, foi suspenso em vez
de ser generalizado. Esta suspensão foi obviamente sentida com grande
inquietação por famílias e profissionais.
Em 2012 esteve em Portugal um
especialista nesta área, Peter Wilson, que, naturalmente, referia a necessidade
de que nas escolas e na comunidade próxima existam apoios aos professores, às
famílias e às crianças com dificuldades emocionais, a única forma, entende,
apoiado na sua experiência, de minimizar e ajudar neste tipo de problemas que,
não sendo acautelados, têm quase sempre efeitos devastadores em termos pessoais
e sociais. Segundo Peter Wilson, os estudos em Inglaterra sugerem a existência
de três crianças com problemas do foro emocional em cada sala de aula pelo que
o apoio é muito mais eficaz e económico prestado na escola ou na comunidade
próxima a alunos, famílias e professores. Este entendimento é partilhado,
creio, pela generalidade dos profissionais e famílias, também em Portugal e os
dados conhecidos apontam nesse sentido.
Há algum tempo a imprensa referia
a inexistência de camas nos serviços de pedopsiquiatria que possam acomodar
adolescentes em tratamento o que leva a que em muitas circunstâncias
adolescentes sejam internados em serviços de adultos o que na opinião dos
especialistas pode ser uma experiência "traumatizante" sendo, aliás,
contrárias às boas práticas de qualquer país civilizado em matéria de saúde
mental.
Está nos livros e nas experiências
que em situação de crise os mais vulneráveis, crianças e adolescentes, por
exemplo, são, justamente, os mais sofredores com as dificuldades. Acresce que,
actualmente, se verifica em muitos agregados familiares e em contextos
escolares a emergência de discursos que pressionam os mais novos no sentido de
atingirem a excelência nos resultados escolares ou em qualquer actividade
“importante” pois será, dizem, a “única” forma de atingir um patamar de sucesso
futuro.
Como se sabe e a experiência
mostra, muitas crianças e adolescentes não suportam com tranquilidade esta
pressão o que se repercute no seu bem-estar e na sua saúde mental. Para
complicar um pouco mais, ainda se verifica que algumas pessoas desvalorizam
estes fenómenos, entendendo que é preciso ser exigente e bem-sucedido e não
entendendo o sofrimento de algumas crianças e jovens.
Por outro lado é também conhecida
a enorme dificuldade que muitas instituições que acolhem menores estão a passar
dificultando a resposta com a qualidade bem como a possibilidade de responder a
novas situações.
Os miúdos, nas famílias
preferencialmente, ou nas instituições, necessitam de um aconchego, um ninho,
uma qualidade de vida que os cuidadores e técnicos, por diversas razões, não
sabem, não querem, não podem ou não são capazes de providenciar. Tal cenário
implica riscos fortíssimos de compromisso do seu futuro pelo que os apoios e
resposta são fundamentais mas não podem passar apenas pela medicação.
Como o povo diz, é de pequenino
que se torce o … destino.
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