A imprensa faz de novo referência
a um estudo realizado pelo Instituto Superior de Psicologia Aplicada (ISPA) segundo
o qual cerca de 30% dos perto de 1000 professores inquiridos revela risco de burnout, estado de esgotamento físico e
mental provocado pela vida profissional, associado a baixos níveis de
satisfação profissional. Este estudo foi ontem discutido numa iniciativa que
teve lugar na Assembleia da República.
Os professores mais velhos, do
ensino secundário ou os que lidam com alunos com necessidades educativas
especiais apresentam níveis mais elevados de burnout e sentem mais a falta de reconhecimento profissional.
Como causas mais contributivas
para este cenário de stresse profissional são identificadas turmas com elevado
número de alunos, o comportamento indisciplinado e desmotivação dos alunos, a
pressão para os resultados, insatisfação com as condições de desempenho, carga
horária e burocrática, falta de trabalho em equipa, falta de apoio e suporte
das lideranças da escola.
Na verdade, os dados só podem
surpreender quem não conhece o universo das escolas, como acontece com boa
parte dos opinadores que pululam pela comunicação social perorando sobre
educação e sobre os professores. Aliás, esta situação verifica-se noutros
países, sendo que para além dos professores, os profissionais de saúde e de
apoios sociais também integram os grupos profissionais mais sujeitos a stresse
e burnout.
É fácil avaliar a importância e
consequências das situações de mal-estar envolvendo os docentes. Alguns dos
discursos que de forma ligeira e muitas vezes ignorante ocupam tempo de antena
na imprensa, parecem esquecer a importância deste trabalho e das circunstâncias
em que se desenvolve.
É complicada a tarefa de
professor em algumas escolas que décadas de incompetência na gestão urbanística
e consequente guetização social produziram.
Os valores, padrões e estilos e
vida das famílias alteraram-se significativamente fazendo derivar para a
escola, para os professores, parte do papel que competia(e) à família. Este
trabalho é realizado, muitas vezes, sem qualquer tipo de apoio ou suporte, com
cada professor entregue a si mesmo.
Importa ainda considerar o
impacto de variáveis relativas à estabilidade e segurança profissional, bem
como os modelos de carreira e progressão. Acrescem ainda questões como a
liderança, a autonomia das escolas variáveis importantes na construção dos
climas das instituições.
Também deve ser ponderada a
deriva política a que o universo da educação tem estado exposto nas últimas
décadas, criando instabilidade e ruído permanente sem que se perceba um rumo,
um desígnio que potencie o trabalho de alunos, pais e professores. Acresce que
sucessivas equipas ministeriais têm empreendido um empenhado processo de
desvalorização dos professores com impacto evidente nas relações que a
comunidade estabelece com estes profissionais
Com muita frequência os
professores são injustiçados na apreciações de muita gente que no minuto a
seguir à afirmação de uma qualquer ignorante barbaridade, vai, numa espécie de
exercício sadomasoquista, entregar os filhos nas mãos daqueles que destrata,
depreendendo-se assim que, ou quer mal aos filhos ou desconhece os professores
e os seus problemas. Também são conhecidos os casos sucessivos de agressão e
insulto por parte de alunos e famílias.
A forma como os miúdos, pequenos
e maiores, vêem e se relacionam com os professores está directamente ligada à
forma como os adultos os vêem e os discursos que fazem e isto contamina a
serenidade do processo de trabalho.
É também imprescindível que a
educação e os problemas dos professores não sejam objecto de luta política
baixa e desrespeitadora dos interesses dos miúdos, mesmo por parte dos que se
assumem como seus representantes.
Na verdade, ser professor é uma
das funções mais bonitas do mundo, ver e ajudar os miúdos a ser gente, mas é
seguramente uma das mais difíceis e que mais respeito deveria merecer.
Os sistemas educativos com
melhores resultados são, justamente, os sistemas em que os professores são mais
valorizados, apoiados e reconhecidos.
3 comentários:
Sem querer criar algum tipo de mal-entendido, gostava de partilhar duas ideias:
1ª Penso que a questão (ou problema) apresentada deve ser também discutida na dimensão acesso à carreira; algumas pessoas não parecem apresentar as qualidades pessoais e profissionais que são essenciais ao exercício da profissão professor, principalmente nos tempos que correm. Esta é, sem dúvida, uma actividade profissional com exigências muito específicas; por essa razão, no acesso à profissão deveriam ser tidos em conta outros critérios, que não apenas a habilitação literária/profissional e a classificação.
2ª Também seria interessante discutir a questão do ponto de vista organizacional: que suporte pode um professor obter dentro da organização onde trabalha? que preocupações tem a organização-escola com a saúde ocupacional dos seus trabalhadores? como contribui a formação contínua dos trabalhadores, proporcionada pela organização-escola, para a prevenção de fenómenos como o esgotamento?
Olá, A 1º questão está fora do estudo que se centra no percepção dos profissionais sobre o seu bem-estar. É claro que as condições pessoais tornam, ou não, as pessoas mais resilientes mas não é isso que está em causa. A segunda questão, se aceder a estes estudos verifica que é contemplada pois os professores identifcam questões de organização e clima institucional como fontes de stresse e mal-estar o que, evidentemente, deveria ser levado em conta pela tutela.
Obrigada :)
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