No Público encontra-se a referência a um
movimento emergente, algumas cadeias de venda a retalho colocam à venda a
preços mais baixos legumes e fruta que em termos de apresentação não são perfeitos,
não correspondem a normas de aspecto e calibragem mas mantêm a intacta a
qualidade.
As razões para esta iniciativa prendem-se com o
elevado desperdício e os consumidores estão a aderir. Algumas notas.
A Organização para a Alimentação e a Agricultura,
da ONU, estima que 1,3 mil milhões de toneladas de alimentos, um terço do que é
produzido, são desperdiçadas com um custo de anual de 570 mil milhões de euros
para a economia global, permitiriam alimentar 925 milhões de pessoas que passam
fome todos os dias. Vivemos num mundo estranho.
Recordo que no Ciclo de Conferências realizado
pela Gulbenkian, foi apresentado um trabalho “Do Campo ao Garfo – Desperdício
Alimentar em Portugal" que avaliava em um milhão de toneladas o
desperdício de alimentos entre a produção e o consumo, o que parece
verdadeiramente significativo num tempo de pobreza e dificuldades, nacionais e
internacionais.
Creio que muitas vezes achamos que desperdício é
coisa de gente rica, os pobres não desperdiçam o que, obviamente, não
corresponde à realidade como os estudos evidenciam. O desperdício é um
subproduto dos modelos de desenvolvimento e dos sistemas de valores que deveria
merecer uma fortíssima atenção.
Há algum tempo, o Parlamento Europeu aprovou um
relatório segundo o qual a União Europeia que tem 79 milhões de pessoas a viver
abaixo do limiar de pobreza, 15,8% da população, e desperdiça anualmente cerca
de metade do que consome em alimentos. Este desperdício corresponde a 89 mil
milhões de toneladas, um assombro. Aliás, o Parlamento Europeu estabeleceu como
objectivo reduzir em 50% o desperdício até 2025.
Voltando aos produtos com mau aspecto, um
trabalho há tempos divulgado avaliava em 30% os produtos que reunirão a
qualidade exigida mas que os consumidores devido ao seu aspecto não adquirem
pelo que a distribuição também não os compra aos produtores.
Na verdade, seja pelas estapúrdias exigências,
entretanto aligeiradas, das normas europeias, seja pela "esquisitice"
dos consumidores, muita fruta e hortícolas de boa qualidade são desaproveitados
e criminosamente desperdiçados.
A este propósito, lembrei-me de uma história
passada aqui no Meu Alentejo em que um dos companheiros que estava nas lérias
afirmava que só comia fruta que tinha bicho, "é a que presta", afirmava
ele.
Perante a estranheza de outro companheiro
explicava, "essa fruta que se vê aí grande e a brilhar e sem bicho não presta, Então
nem o bicho lhe pega e vou eu comê-la? Isso é que era bom, se a fruta não é boa
para o bicho, é boa para mim?"
Sendo certo que os olhos também comem, o embrulho
nem sempre corresponde ao conteúdo.
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