Cumpre-se o dia da reflexão,
véspera das eleições europeias. Terminou uma campanha eleitoral que
praticamente não existiu. Talvez pudéssemos aproveitar o dia da reflexão para,
por um lado, para decidir ir mesmo votar e, por outro lado, para pensar como exigir
que uma campanha eleitoral seja o que se espera, apresentação e discussão de
ideias e projectos que contribuam para o bem-estar e desenvolvimento
colectivos. Assistimos, isso sim e com algumas excepções, a um espectáculo
degradante e cacofónico que terá dado um forte contributo para uma inquietante
abstenção que leva a que uma minoria, parte mobilizada também por valores e convicções
mas outra parte influenciada por manipulação e desinformação possa decidir sobre os
destinos de uma maioria desinteressada e cansada.
Os discursos, insisto nas
excepções, foram de uma mediocridade notável e centrados excessivamente em “não
assuntos”, ataques pessoais e insultos, afirmações manhosas que compõem uma
democracia com défice de solidez ética, competência e visão.
No então e felizmente continuámos
a ter esse estimulante fenómeno típico das campanhas eleitorais que dá pelo
nome de “arruadas”, o passeio de um qualquer candidato por espaços públicos, sobretudo os mais frequentados.
É certo que em qualquer altura a
deslocação de uma figura política ao que gostam de chamar o “país real” é já
uma amostra, mas em campanha pela conquista de mais um voto o espectáculo é
deveras estimulante embora talvez resulte na conquista de mais uma abstenção. Quando
olho para aquelas imagens acabo por lhes encontrar alguma piada.
Tentem entender o meu ponto de
vista e reparem, por exemplo, no comportamento e atitude das figuras de segunda
linha que aparecem sempre coladas aos “importantes”, aos candidatos ou a
estrelas, “ex-líderes” por exemplo. Normalmente, seguem um passo atrás de
qualquer entidade que leve uma câmara de televisão a segui-la. Os figurantes
constituem um grupo numeroso. Por este facto, nem sempre cabem no ecrã e então,
assiste-se, por vezes de forma pouco discreta ao esforço para aparecerem.
Compõem um sorriso circunspecto e enquanto a entidade é entrevistada é ver os
figurantes a inclinar a cabeça em sinal de aprovação ao mesmo tempo que
procuram compor um ar inteligente e condescendente para com a comunicação
social. Têm a secreta esperança de merecer um primeiro plano que constitua
prova de vida.
Acho também muito estimulante o
papel dos “operacionais”, quase sempre os elementos das “juventudes
partidárias” os que fazem o alarido, agitam as bandeiras e gritam as palavras
de ordem e que, numa preventiva iniciativa para que não fiquem tão à rasca mais
tarde, vão fazendo a sua formação que lhes permita uma carreira aparelhística
ou, pelo menos, a esperança de um empurrãozinho na vida profissional.
Uma outra parte do espectáculo é
o comportamento dos anónimos que se cruzam com a arruada e expressam o que lhes
vai na alma face às cores do desfile fazendo com que a arruada pare ou acelere
o passo em busca de melhor ambiente. Outra gente anónima que entra na arruada é
a que se bate pelos brindes que obrigatoriamente são distribuídos pelas
segundas figuras da comitiva. A luta e o melhor posicionamento pela conquista
de um boné, saco ou esferográfica é um exemplo de empreendimento e esforço que
se esperam recompensados.
Mas o que eu gosto mesmo, é de
ver o entusiasmo com que a generalidade dos candidatos é abraçado e abraça muitíssimas
vezes, distribui beijinhos pelas criancinhas e velhinhas com um carinho e de
uma forma tão genuína que enternece.
As feiras e mercados, terreno
para estrelas como o famoso Paulinho das feiras, e as praças e ruas principais
são os palcos escolhidos. Este ano até tivemos um líder partidário que em apoio
ao seu candidato foi até à praia de fato e gravata, líder que é líder não
descura a imagem de sobriedade.
Não sei se vos convenci, mas como
diz o povo, “cá p´ra mim” as arruadas são mesmo o que de melhor as campanhas
eleitorais têm. O resto é conhecido e quase sempre pouco interessante, lamentavelmente.
Por fim seria desejável que amanhã
cumpríssemos um direito que não podemos alienar, o voto.
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