Encontrei no Público uma entrevista
curiosa, por assim dizer, a Carl Honoré, tido como um estudioso e “guru” do
movimento “slow living”, a transformação do “devagar” numa filosofia de vida.
Mais uma vez lembrei-me de um colega
de escola lá muito para trás no tempo que já aqui referi.
Como sabem, é hábito que ainda se
mantém, quando somos pequenos criar alcunhas era bastante frequente e acontecia
a propósito das mais variadas razões. Muitas vezes a alcunha, seja pelo som,
pela graça ou pela apropriada designação, entranhava-se na relação, substituía
o nome e acontecia até que algum tempo depois já nem o recordamos. Foi o caso
do Lesma, de tal forma a designação se colou que não consigo lembrar-me com
segurança do seu nome.
Neste caso, a elegante designação
de Lesma foi-lhe atribuída pela primeira vez por um dos professores e dela
nunca mais se livrou, passou de uma brincadeira a uma identidade.
O Lesma foi a pessoa mais vagarosa,
mais tranquila, mais sem pressa, que alguma vez conheci. Era o último a chegar
a qualquer lado, sempre com ar de quem era o primeiro e a tempo. Em qualquer
tarefa ou jogo, coisas da escola ou brincadeiras fora da escola o Lesma era
exasperante, sempre sem pressa, sempre o último.
Até a falar o Lesma era vagaroso,
demorava um tempo que nos parecia infindo a acabar uma frase cujo final todos
já adivinhávamos.
Provavelmente porque o nosso
tempo era outro e apesar da sua lentidão perdi o rasto Lesma.
Hoje em dia, a vida acelerou-se,
inventámos o stresse, o para ontem, o temos que fazer tudo e rápido, não
podemos perder tempo, etc., o tempo tornou-se um bem de primeiríssima
necessidade que quase ninguém tem. Quase ninguém está, vai ou vem com tempo.
Como reacção a este estilo de
vida têm vindo a surgir movimentos e ideias que direccionados para diferentes
áreas de funcionamento têm de comum a intenção de abrandar o ritmo. A palavra
chave emergente é "slow", na alimentação, nas actividades de lazer,
nos locais de trabalho. Multiplicam-se as ofertas mais ou menos exóticas, mais
ou menos criativas, mas todas apostando nas milagrosas virtudes do
"slow" e do “slow living” como defende Carl Honoré.
Ao ler a sua entrevista não pude
deixar de recordar o Lesma. Na verdade e sem que qualquer de nós conseguisse
perceber, o Lesma era um visionário, o primeiro que conheci e que só mais tarde
reconheci.
Não tenho nenhuma convicção de que tenhamos de nos converter ao "slow living" mas é crucial que consigamos reconstruir a relação com o tempo, começando pelo tempo dos e com os mais novos.
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