segunda-feira, 13 de junho de 2016

QUANDO OS SANTOS ERAM (MAIS) POPULARES

Ainda por aqui no Alentejo à conta do S. António de Lisboa soube que a marcha do Bairro onde trabalho, Alfama, ganhou o concurso deste ano. Fico contente pelo pessoal do bairro, cada vez menos e com cada vez mais gente de fora.
Como muitas vezes digo umas das vantagens de ser velho é ter histórias para contar.
Assim, lembro que há muitos anos, no tempo em que eu era miúdo e o subúrbio onde nasci e morava era ainda feito de poucas casas e algumas quintas, a época dos santos era esperada com alguma excitação por nós, os mais pequenos, mas não só.
Na minha zona o santo que nos pertence é o S. João, mas todos nos serviam, o S. António em Lisboa e o S. Pedro no Seixal também eram populares pretextos.
Os adultos organizavam umas festas nas ruas com bailarico e as incontornáveis sardinhas e bifanas com rega, é claro, que os organizadores vendiam para financiar uma excursão ao estrangeiro, a Badajoz quase sempre, que naquele tempo o estrangeiro era perto e o dinheiro sempre curto.
Mas para nós, para além de uns desaparecidos "pirolitos" em garrafas que tinham um berlinde de vidro, os santos eram sobretudo as fogueiras, isso sim, as fogueiras e lançamento de um lindíssimo e artesanal balão de ar quente que umas vezes desaparecia num airoso voo e outras vezes ardia ainda no chão para grande decepção da gente.
Uns dias antes de cada santo, por assim dizer, e por zonas começávamos a juntar lenha. Para tal, fazíamos umas visitas às quintas da terra, ainda havia muitas que agora têm prédios plantados e, sobretudo, organizávamos umas expedições às obras em curso e "recolhíamos" toda a madeira que conseguíssemos e que acumulávamos procurando tê-la sempre debaixo de olho, porque a carne do pessoal das outras zonas era fraca e poderia não resistir à tentação de "levar" a nossa lenha.
Nos dias da celebração a fogueira durava enquanto houvesse lenha e vontade de saltar por cima dela. Tratava-se então de saber quem era mais corajoso e enfrentava as chamas mais altas. À custa destas exibições sempre conseguíamos umas vistosas aterragens falhadas do outro lado ou uma roupa chamuscada. Havia sempre o espectáculo extra de alguns dos adultos já com algum lastro alcoólico, digamos assim, tentarem mostrar dotes de saltadores que muitas vezes também não acabavam bem.
Quase sempre e como número extra, tínhamos direito a uma cena de lambada, sem grandes consequências porque festa é festa, provocada por uma figura mítica da minha terra, o meu saudoso amigo Pedro, mais conhecido pelo Sucata, na altura já nada novo. Era um homem bom, andava por um enorme metro e sessenta, mas era a pessoa mais amiga de arranjar uma confusãozinha de onde saía, invariavelmente, com mais umas lambadas e, é verdade, mais uns amigos que lhe pagavam um copito matéria que nunca negava. Tenho saudades do velho Sucata.
Os santos na minha terra já não são tão populares, limitam-se a oferecer feriados, à vez.

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