O MEC criou um Programa, Retomar,
disponibilizando 3000 bolsas destinadas a recuperar estudantes do ensino
superior que tenham desistido da frequência. Contrariamente às expectativas
divulgadas apenas 480 candidaturas foram formalizadas.
Algumas notas sobre esta
situação.
Para além do efeito decorrente do
calendário e procedimentos do Programa, creio que outras questões de maior
relevo poderão ajudar a compreender este aparente desinteresse pela frequência
do ensino superior, envolvendo até alunos que já iniciaram o seu percurso
académico.
Recordo que no início do ano um
estudo patrocinado pela Comissão Europeia em oito países da Europa revelava,
sem surpresa, que Portugal apresenta uma das mais altas percentagens, 38%, de
jovens que gostava de prosseguir estudos mas não tem meios para os pagar.
É também preocupante o abaixamento que se tem vindo a verificar de procura de
ensino superior apesar deste ano se ter registado uma pequena subida. As dificuldades económicas são a principal razão para
não continuar.
Por outro lado, talvez seja de
considerar o impacto da tão perversa quanto errada ideia do "país de
doutores" que se foi instalando com o precioso auxílio de uma imprensa
preguiçosa e negligente pois não corresponde à verdade e que alimentando a
ideia de que "estudar não vale a pena", representa um verdadeiro tiro
no pé. Promove ainda o risco dos cidadãos desinvestirem em projectos de vida
que passem pela qualificação, a verdadeira alavanca do desenvolvimento e,
portanto, do futuro.
É ainda de relembrar que de
acordo com o Relatório da OCDE, Education at a glance 2013, Portugal
é um dos países europeus em que a frequência de ensino superior mais depende do
financiamento das famílias, cerca de 31% dos gastos de universidades e
politécnicos. A média da OCDE é 32% e a da União Europeia, 23,6%.
Esta informação não é nova. Na
verdade e como é do conhecimento das pessoas mais perto deste universo, o
ensino superior em Portugal, contrariamente ao que muita gente afirma de forma
leviana, tem um dos mais altos custos de propinas da Europa. Conforme dados de
2011/2012 da rede Eurydice, Portugal tem o 10º valor mais alto de propinas na
Europa, mas se se considerarem as excepções criadas em cada país, tem
efectivamente o terceiro custo mais alto no valor das propinas.
Ainda neste contexto, em 2012 foi
divulgado um estudo realizado pelo Instituto de Educação da Universidade de
Lisboa que contribui para desmontar um equívoco que creio instalado na
sociedade portuguesa. Comparativamente a muitos outros países da Europa,
Portugal tem um dos mais altos custos para as famílias para um filho a estudar
no ensino superior, ou seja, as famílias portuguesas fazem um esforço bem
maior, em termos de orçamento familiar, para que os seus filhos acedam a
formação superior. Se considerarmos a frequência de ensino superior particular
o esforço é ainda maior. Percebe-se assim a taxa altíssima de jovens que
exprimem a dificuldade de prosseguir estudos.
As dificuldades pelas quais
passam muitos estudantes do ensino superior e respectivas famílias, quer no
sistema público, quer no sistema privado, são, do meu ponto de vista,
considerados frequentemente de forma ligeira ou mesmo desvalorizadas. Tal
entendimento parece assentar na ideia de que a formação de nível superior é um
luxo, um bem supérfluo pelo que ... quem não tem dinheiro não tem vícios.
Para reforçar a ideia de qua não
somos, definitivamente, um "país de doutores" importa sublinhar que, apesar dos progressos dos últimos anos, estamos muito longe de poder vir a cumprir a meta a que nos comprometemos com a UE para
2020, 40% de pessoas licenciadas entre os 30 e os 34 anos.
A qualificação é a melhor forma
de promover desenvolvimento e cidadania de qualidade pelo que apesar de ser um
bem caro é imprescindível.
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