A estrutura do ensino básico vai
voltar a agenda com a discussão no Parlamento de propostas do PCP e do CDS-PP.
O PS não parece muito disponível afirmando que “não avançará com propostas de
redefinição de ciclos, uma vez que estas implicam uma revisão da Lei de Bases
do Sistema Educativo a qual nos convoca sempre para uma ampla discussão prévia”.
O motivo é fortíssimo e claro, não se altera a Lei de Bases porque isso implica
uma “ampla discussão prévia”. Parece, assim, mais interessante e fácil decidir
e implementar políticas públicas sem discussão prévia, sem a tentativa de
estabelecer consensos e ao sabor da agenda.
É verdade que as políticas
públicas são cruciais, no domínio da educação e desde 1986 com a mesma Lei de
Bases do Sistema Educativo temos tido políticas educativas de sinais
completamente contrários, em permanente alteração nas mais das vezes sem avaliação
e com a tentativa de que cada equipa deixasse a sua impressão ou
experimentalismo. No entanto, parece já ser o tempo de “olhar” para a Lei de
Bases, seria fundamental, por exemplo, integrar o período dos 0 aos 3 anos, no
sistema educativo.
Recordo ainda que no programa do
Governo constava “Promover uma maior
articulação entre os três ciclos do ensino básico, redefinindo progressivamente
a sua estrutura de modo a atenuar os efeitos negativos das transições entre
ciclos, assumindo uma gestão mais integrada do currículo e reduzindo a
excessiva carga disciplinar dos alunos;”
Creio que pode afirmar-se que
parece estabelecer-se algum consenso no sentido de repensar a estrutura do
Ensino Básico ainda que seja mais difícil definir qual o modelo a considerar. No
final do ano passado a presidente do CNE, Maria Emília Brederode Santos e a
divulgação do Relatório "Estado da Educação 2017" também trouxeram
esta questão para a mesa.
A verdade é que não é uma matéria
nova, estruturas representativas dos pais e encarregados de educação, (CONFAP),
dos professores, (FNE), ou dos directores escolares, (ANDE), já têm manifestado
abertura para esta análise e eventual ajustamento.
Uma das questões que a sustentam
é eventuais constrangimentos associados a repetidos processos de transição em pouco
espaço de tempo. O Ministro da Educação afirmou na altura que, apesar de
abertura para alterações, não considera significativo o impacto da sua
existência nos níveis de retenção e abandono. No entanto, sendo difícil
estabelecer qualquer relação de causa e efeito parece claro que a sua
existência nos termos actuais pode estar associada a um conjunto de variáveis
que, essas sim, se repercutem nos níveis de desempenho e qualidade dos
processos de ensino e aprendizagem. São exemplos destas variáveis, a existência
de períodos de transição, a estrutura, conteúdos e nível de integração
curricular considerando as idades dos alunos envolvidos, etc.
Não será, aliás, por acaso, que o
modelo que temos tem existência residual em termos de UE e OCDE.
De há muito que também entendo a
necessidade de ajustar, quer a organização do ensino básico, quer as áreas
disciplinares e respectivos conteúdos tendo também aqui referido algumas ideias
sobre isto que vão, aliás, na linha do que se encontra em outros países com
sistemas educativos com bons resultados.
Sei também da enorme complexidade
de mudanças nestas áreas até pelo impacto que poderá ter na organização da
carreira e formação dos docentes para além da multiplicidade de variáveis a
considerar.
Em primeiro lugar não deve
realizar-se sem considerar a organização curricular, designadamente no que
respeita a conteúdos e número de disciplinas. Recordo que segundo a Lei de Bases
do sistema educativo o ensino básico organiza-se numa lógica de ciclo e não
numa lógica disciplinar contrariamente ao ensino secundário.
Deve ser acompanhada de uma real
autonomia das escolas.
Deve contemplar a existência de
diferenciação de trajectos educativos que não sejam definidos e considerados
como de “primeira” e de “segunda”. É fundamental que todos os alunos adquiram
na escolaridade obrigatória uma qualificação, quer seja para prosseguir o seu
trajecto escolar no superior, universitário ou politécnico, quer seja para
entrar no mundo de trabalho ou em programas de formação profissional mais
curtos. Só assim poderão, todos, construir um projecto de vida viável e
positivo.
Neste sentido e olhando para o
que se passa noutras realidades e nos pode ajudar a pensar, creio que opção
ajustada seria a existência de um primeiro ciclo de seis anos assente nas
ferramentas de construção do conhecimento e desenvolvimento pessoal, um segundo
ciclo de três anos já com algumas disciplinas opcionais que acomodassem
motivações e escolhas dos alunos e um terceiro ciclo, o ensino secundário aqui
já com vias diferenciadas incluindo formação profissional.
Um ensino básico com uma
estrutura desta natureza seria certamente mais capaz de acomodar e responder de
forma mais eficaz e integrada à diversidade dos alunos, designadamente, de
alunos com necessidades especiais, insisto, prefiro recorrer a esta “velha”
designação que às inovadoras "categorias" que não são "categorias" uma vez que se acabaram as catergorias, “selectivas”, “universais“
ou “adicionais”.
Insisto no entanto que o quer que
venha a ser realizado, se vier a confirmar-se a alteração, deve acontecer com
uma enorme prudência, reflexão aprofundada e com a participação o mais
abrangente possível dos diversos actores e entidades envolvidos.
Como afirmei a propósito de
outras mudanças recentemente verificadas, depressa e bem não há quem.
Objectivos globalmente positivos podem ser comprometidos por más metodologias
ou calendários de mudança inadequados.
Importa que não se realizem de
forma apressada e sem um consenso tão sólido quanto possível sobre conteúdos e
calendário das mudanças que, reafirmo, me parecem necessárias.
Como muitas vezes afirmo, é tão
importante "fazer as coisas certas como fazer certas as coisas". Se
bem repararmos nem sempre isto se verifica, mesmo na nossa acção individual. Em
políticas públicas ainda é mais necessário.
Sem comentários:
Enviar um comentário