segunda-feira, 14 de janeiro de 2019

A ESTRUTURA DO ENSINO BÁSICO DE NOVO NA AGENDA


A estrutura do ensino básico vai voltar a agenda com a discussão no Parlamento de propostas do PCP e do CDS-PP. O PS não parece muito disponível afirmando que “não avançará com propostas de redefinição de ciclos, uma vez que estas implicam uma revisão da Lei de Bases do Sistema Educativo a qual nos convoca sempre para uma ampla discussão prévia”. O motivo é fortíssimo e claro, não se altera a Lei de Bases porque isso implica uma “ampla discussão prévia”. Parece, assim, mais interessante e fácil decidir e implementar políticas públicas sem discussão prévia, sem a tentativa de estabelecer consensos e ao sabor da agenda.
É verdade que as políticas públicas são cruciais, no domínio da educação e desde 1986 com a mesma Lei de Bases do Sistema Educativo temos tido políticas educativas de sinais completamente contrários, em permanente alteração nas mais das vezes sem avaliação e com a tentativa de que cada equipa deixasse a sua impressão ou experimentalismo. No entanto, parece já ser o tempo de “olhar” para a Lei de Bases, seria fundamental, por exemplo, integrar o período dos 0 aos 3 anos, no sistema educativo.
Recordo ainda que no programa do Governo constava “Promover uma maior articulação entre os três ciclos do ensino básico, redefinindo progressivamente a sua estrutura de modo a atenuar os efeitos negativos das transições entre ciclos, assumindo uma gestão mais integrada do currículo e reduzindo a excessiva carga disciplinar dos alunos;”
Creio que pode afirmar-se que parece estabelecer-se algum consenso no sentido de repensar a estrutura do Ensino Básico ainda que seja mais difícil definir qual o modelo a considerar. No final do ano passado a presidente do CNE, Maria Emília Brederode Santos e a divulgação do Relatório "Estado da Educação 2017" também trouxeram esta questão para a mesa.
A verdade é que não é uma matéria nova, estruturas representativas dos pais e encarregados de educação, (CONFAP), dos professores, (FNE), ou dos directores escolares, (ANDE), já têm manifestado abertura para esta análise e eventual ajustamento.
Uma das questões que a sustentam é eventuais constrangimentos associados a repetidos processos de transição em pouco espaço de tempo. O Ministro da Educação afirmou na altura que, apesar de abertura para alterações, não considera significativo o impacto da sua existência nos níveis de retenção e abandono. No entanto, sendo difícil estabelecer qualquer relação de causa e efeito parece claro que a sua existência nos termos actuais pode estar associada a um conjunto de variáveis que, essas sim, se repercutem nos níveis de desempenho e qualidade dos processos de ensino e aprendizagem. São exemplos destas variáveis, a existência de períodos de transição, a estrutura, conteúdos e nível de integração curricular considerando as idades dos alunos envolvidos, etc.
Não será, aliás, por acaso, que o modelo que temos tem existência residual em termos de UE e OCDE.
De há muito que também entendo a necessidade de ajustar, quer a organização do ensino básico, quer as áreas disciplinares e respectivos conteúdos tendo também aqui referido algumas ideias sobre isto que vão, aliás, na linha do que se encontra em outros países com sistemas educativos com bons resultados.
Sei também da enorme complexidade de mudanças nestas áreas até pelo impacto que poderá ter na organização da carreira e formação dos docentes para além da multiplicidade de variáveis a considerar.
Em primeiro lugar não deve realizar-se sem considerar a organização curricular, designadamente no que respeita a conteúdos e número de disciplinas. Recordo que segundo a Lei de Bases do sistema educativo o ensino básico organiza-se numa lógica de ciclo e não numa lógica disciplinar contrariamente ao ensino secundário.
Deve ser acompanhada de uma real autonomia das escolas.
Deve contemplar a existência de diferenciação de trajectos educativos que não sejam definidos e considerados como de “primeira” e de “segunda”. É fundamental que todos os alunos adquiram na escolaridade obrigatória uma qualificação, quer seja para prosseguir o seu trajecto escolar no superior, universitário ou politécnico, quer seja para entrar no mundo de trabalho ou em programas de formação profissional mais curtos. Só assim poderão, todos, construir um projecto de vida viável e positivo.
Neste sentido e olhando para o que se passa noutras realidades e nos pode ajudar a pensar, creio que opção ajustada seria a existência de um primeiro ciclo de seis anos assente nas ferramentas de construção do conhecimento e desenvolvimento pessoal, um segundo ciclo de três anos já com algumas disciplinas opcionais que acomodassem motivações e escolhas dos alunos e um terceiro ciclo, o ensino secundário aqui já com vias diferenciadas incluindo formação profissional.
Um ensino básico com uma estrutura desta natureza seria certamente mais capaz de acomodar e responder de forma mais eficaz e integrada à diversidade dos alunos, designadamente, de alunos com necessidades especiais, insisto, prefiro recorrer a esta “velha” designação que às inovadoras "categorias" que não são "categorias" uma vez que se acabaram as catergorias, “selectivas”, “universais“ ou “adicionais”.
Insisto no entanto que o quer que venha a ser realizado, se vier a confirmar-se a alteração, deve acontecer com uma enorme prudência, reflexão aprofundada e com a participação o mais abrangente possível dos diversos actores e entidades envolvidos.
Como afirmei a propósito de outras mudanças recentemente verificadas, depressa e bem não há quem. Objectivos globalmente positivos podem ser comprometidos por más metodologias ou calendários de mudança inadequados.
Importa que não se realizem de forma apressada e sem um consenso tão sólido quanto possível sobre conteúdos e calendário das mudanças que, reafirmo, me parecem necessárias.
Como muitas vezes afirmo, é tão importante "fazer as coisas certas como fazer certas as coisas". Se bem repararmos nem sempre isto se verifica, mesmo na nossa acção individual. Em políticas públicas ainda é mais necessário.


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