No DN encontra-se uma peça sobre
uma matéria que regularmente reentra na agenda, a idade mais ajustada para a entrada na escola. A este propósito algumas notas.
De acordo com a lei em Portugal a
entrada na escola é obrigatória para as crianças completem seis anos de idade
até 15 de Setembro. As crianças que completam os seis anos entre 16 de Setembro
e 31 de Dezembro, já depois do início do ano lectivo, podem matricular-se de
forma condicional, ou seja, frequentam se existir vaga na escola. Existe ainda
a possibilidade legal, com autorização específica, de que uma criança possa ver
antecipada ou adiada em um ano a sua entrada na escola. Nestas circunstâncias
colocam-se desde logo dúvidas relativas à idade adequada, sobretudo
relativamente às crianças que entram com 5 anos, seja através da situação de
condicional ou através de um pedido de antecipação.
De uma forma geral parece ser
entendimento e prática em muitos países que os seis anos parecem ser uma idade
ajustada para o início da escolaridade. Aliás, as opiniões expressas na peça do
DN vão sesse sentido. Considerando a diversidade entre as crianças pode
aceitar-se em alguns casos bem analisados que entrem mais cedo ou mais tarde.
No entanto, creio que o melhor para a criança é que não se “acelere” este
processo, tentação de muitos pais que assim antecipam vantagens futuras mas que
na verdade podem implicar alguns riscos para a criança que, naturalmente, devem
ser acautelados.
Em primeiro lugar importa
sublinhar a importância de uma boa experiência de educação pré-escolar que é
bastante mais que a “preparação” para a escola e não deve enredar-se no
entendimento de que é uma etapa na qual os meninos se preparam para entrar na
escola embora se saiba do impacto positivo que assume no trajecto escolar.
Na verdade, as crianças estão a
preparar-se para a vida, para crescer, para ser. A educação pré-escolar num
tempo em que as crianças estão menos com as famílias tem um papel fundamental
no seu desenvolvimento global, em todas as áreas do seu funcionamento e na
aquisição de competências e promoção de capacidades que têm um valor por si e deve ser entendida como uma etapa preparatória para uma parte da vida futura dos
miúdos, a vida escolar.
Este período, a educação
pré-escolar, cumprido com qualidade e acessível a todas as crianças, será, de
facto, um excelente começo da formação institucional de cidadãos. Esta formação
é global e essencial para tudo que virão a ser e a fazer no resto da sua vida
pelo que deve resistir-se à tentação de a acelerar.
Por outro lado, a
"entrada" na escola, ou melhor, o processo de início da escolaridade
obrigatória, continua a ser uma experiência fundamental para o lançamento de um
percurso educativo com sucesso.
O início da escolaridade envolve
na verdade um conjunto de circunstâncias irreversíveis na vida dos miúdos, ou
seja, quando corre mal já não é possível voltar atrás e recomeçar com a
esperança de que a situação vá correr melhor. Por isso se torna imprescindível
que o começo seja positivo e em tempo oportuno. Para isso, importa que seja
pensado e orientado, que crie as rotinas, a adaptação e a confiança em miúdos e
em pais indispensáveis à aprendizagem e ao desenvolvimento bem-sucedidos.
Por outro lado, de há algum tempo
a esta parte e como tenho constatado em muitas conversas com pais mas também em
contextos escolares, tem emergido com progressiva regularidade discursos e
comportamentos que sugerem a instalação nem sempre muito consciente de uma
enorme pressão sobre os miúdos para a excelência do seu desempenho e em
múltiplos aspectos.
Na verdade, fruto dos estilos de
vida, de alterações nos valores e cultura e das dificuldades genéricas que
enfrentamos, tem vindo a instalar-se de mansinho em muitos pais, e também
dentro das instituições educativas, uma atitude e um discurso de exigência e de
pressão para a excelência no desempenho dos miúdos, a começar pelos resultados
escolares.
A questão não tem, evidentemente,
a ver com a natural atitude de exigência mas um sim com a pressão muito forte
para a produção e alto nível de rendimento e cada vez mais cedo pois, supõe-se,
ganharão vantagens. E recoloca-se a questão da idade adequada.
Por outro lado, o clima instalado
relativamente à pressão para resultados e para excelência e à forma como o
sistema educativo tem sobrevalorizado a medida contribui para alimentar de um
ambiente educativo competitivo e selectivo que cria em muitas crianças uma
pressão fortíssima para a excelência dos resultados. Não é raro, antes pelo
contrário e de acordo com as disponibilidades das famílias, que a seguir à
escola muitas crianças caminhem para os centros de explicações que acabam por
funcionar como AAE, Ateliers de Actividades Escolares respondendo como 2 em 1,
tomam contas das crianças e melhoram, espera-se, o seu rendimento escolar.
Acresce que esta excelência que é
exigida é extensiva a todas as áreas em que os miúdos se envolvem, devem ser
excelentes a tudo tendo muitas crianças a sua vida transformada numa espécie de
agenda, saltando de actividade em actividade numa agitação sem fim.
Acontece que algumas crianças,
por questões de maturidade ou funcionamento pessoal, suportam de forma menos
positiva esta pressão o que poderá gerar o risco de disfuncionamento, rejeição
escolar e, finalmente, insucesso.
Também sei que em muitas destas
actividades estará presente uma genuína preocupação dos seus responsáveis pela
qualidade e adequação do trabalho que realizam com os miúdos. A questão é que
esse trabalho é apenas um dos mil trabalhos com que se vai enchendo a vida dos
miúdos.
A melhor forma de preparar os
miúdos para o futuro é cuidar bem deles no presente, desejavelmente sem faltas,
mas também sem excessos.
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