Apenas 3% (246) das crianças sob
tutela do estado vivem em famílias de acolhimento enquanto 87% estão em residências
crianças. Conforme trabalho que se encontra no JN, a disparidade face à situação noutros países da Europa é significativa, em Espanha e Itália são mais de metade e Irlanda
e Noruega têm 90% das crianças em famílias de acolhimento.
Dados do último Relatório CASA,
divulgado em Novembro, revelam que existem 652 crianças até aos cinco anos em
instituições generalistas e apenas 18 a viver em famílias.
Importa salientar que que em 2015
foi publicada legislação que estabelece o quadro das famílias de acolhimento
para crianças em risco mas, três anos depois a lei continua por cumprir e na peça
do JN se lê que “a secretária de Estado da Inclusão das Pessoas com
Deficiência, Ana Sofia Antunes, declarou que o Governo não se sente seguro
quanto a aumentar o número de crianças em acolhimento familiar, enquanto não
tiver meios para fiscalizar”.
A lei pretende contrariar que a
institucionalização seja a resposta mais frequente, sobretudo no caso das
crianças mais novas, até aos seis anos pelo que os números são elucidativos. Aliás
número de crianças nesta situação em famílias de acolhimento tem vindo a
decrescer, em 2008 viviam com famílias 657 crianças.
Esta situação inibe o
desenvolvimento de projectos que colocar em contextos familiares crianças que
por situações de risco foram retiradas às famílias biológicas e ainda não estão
em processo de adopção e vivem em instituições.
Não tenho conhecimento que a
situação tenha sido alterada, a lei não foi regulamentada, e o quadro actual é
ineficaz e incompreensível e muito pouco amigável para o acolhimento familiar.
Uma família de acolhimento de uma criança recém-nascida não tem direito a
licença de parentalidade. Não tem protecção no trabalho para faltas em caso de
doença da criança e não a pode considerar em sede de IRS. A criança não recebe
abono de família nem acede aos dispositivos da Acção Social Escolar.
No que respeita a apoios económicos,
sim, as crianças são particularmente caras em Portugal, as famílias recém um
subsídio mensal de 153.40€ e mais 176.89€ da Segurança Social, pouco mais de
330€ mensais. Ainda passa recibo verde e paga três prestações de 157.
Curiosamente, ou talvez não, e de
forma inaceitável pela disparidade de tratamento as instituições que acolhem
crianças recebem em média 700€ por cada e as crianças têm acesso à Acção Social
Escolar e abono de família(?!).
Percebe-se também por isto o
baixo número de crianças em famílias de acolhimento e o número excessivo das
que se mantêm institucionalizadas.
Em nome do seu bem-estar seria
desejável que se conseguisse até ao limite promover a desinstitucionalização das crianças por múltiplas e bem diversificadas razões.
Uma entrevista de Robbie Gilligan, Professor de Serviço Social e Política
Social no Trinity College, em Dublin, no Público quando há uns meses esteve em
Portugal merece reflexão.
Um estudo de Paulo Delgado da ESSE
do Porto também citado no JN mostra que as crianças evidenciam uma percepção de
bem-estar significativamente diferente consoante estejam em família
tradicional, 9.05 numa escala de 0 a 10, em famílias de acolhimento, 8.69 e em instituições,
7.61.
Recordo um estudo de há alguns
anos da Universidade do Minho mostrando que as crianças institucionalizadas
revelam, sem surpresa, mais dificuldade em estabelecer laços afectivos sólidos
com os seus cuidadores nas instituições. Esta dificuldade pode implicar alguns
riscos no desenvolvimento dos miúdos e no seu comportamento.
A conclusão não questiona,
evidentemente, a competência dos técnicos cuidadores das instituições, mas as
próprias condições de vida institucional e aponta no sentido da adopção ou
outros dispositivos como forma de minimizar estes riscos e facilitar os
importantes processos de vinculação afectiva dos miúdos. Também deve
acentuar-se o trabalho de grande qualidade que muitas instituições procuram
desenvolver. Além disso, sabemos todos, que existem contextos familiares que
por razões de ordem variada não devem ter crianças no seu seio, fazem-lhes mal,
pelo que a retirada pode ser uma necessidade justificada pelo superior
interesse da criança, um princípio estruturante das decisões neste universo.
Uma família é, de facto, um bem
de primeira necessidade.
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