Nada de estranho, a capacidade
preditora da variável escolaridade dos pais, em particular a das mães no nosso
caso, relativamente ao percurso escolar dos filhos é ainda muito significativa e comprovada em múltiplos estudos em diferentes paragens.
A análise dos resultados escolares em exames nacionais cruzando com a
habilitação escolar dos pais mostra isso mesmo. Como exemplo e considerando os
exames de 2014, na escola pública melhor colocada, a Escola Raul Proença, nas
Caldas da Rainha, a média das habilitações das mães, é de 12 anos e tem 8,6%
dos seus alunos oriundos de famílias carenciadas apoiados no 1º escalão da
acção social escolar.
Na Escola Secundária de Resende
que apresentou a média mais baixa, 7,3 valores, as mães dos alunos têm, em
média, apenas o ensino primário completo, 5,1 anos de estudo, e tem no escalão
mais carenciado 30% dos alunos.
Recordo também uma análise da
OCDE, cruzando os resultados escolares dos alunos de diferentes países no
Estudo comparativo PISA relativos a 2012 com as profissões dos pais, mostra que
em Portugal, mais do que noutros países, os filhos de pais mais qualificados
têm melhores resultados.
Na verdade, desde sempre que os
estudos, designadamente no âmbito da sociologia da educação, associam a
carreira escolar e o estatuto profissional dos filhos ao nível de escolaridade
e estatuto económico dos pais.
Também sabemos que isto é tanto
mais evidente quanto maiores são os níveis de desigualdade. Em Portugal
verifica-se um dos maiores fossos entre ricos e pobres da União Europeia pelo
que a relação entre os níveis escolar e salarial dos pais e os dos filhos é
ainda mais forte. O trabalho agora apresentado vem, mais uma vez, confirmar a
realidade que conhecemos, a incapacidade da escola de promover mobilidade
social, ou seja, o nível de escolaridade dos pais marca de forma excessiva o
nível atingido pelos filhos. A situação sempre assim foi, ainda me lembro de
quando era pequeno, haver quem se admirasse do meu pai, um serralheiro, ter
decidido que eu continuaria a estudar.
Acresce que as circunstâncias
conjunturais, provavelmente estruturais, que vivemos permitem, aliás, admitir
uma mobilidade social descendente produzindo uma classe de "novos
pobres", que tendo anteriormente ascendido a patamares médios se sentem
agora em processo significativo de degradação das condições e qualidade de
vida. Neste contexto, a que se junta uma política educativa dos últimos anos que parecia ter como desígnio
a selecção através sucessivos crivos que não garantem equidade nas
oportunidades, a educação e a qualificação não promoverão mobilidade social
ascendente.
Deste quadro, resulta uma
complexa situação que poderemos de forma simplista colocar nestes termos, a
escola ao acabar por reproduzir a desigualdade social à entrada, compromete o
papel fundamental que lhe cabe na promoção da mobilidade social, ou seja, a
escola que deveria ser parte da solução, na prática, corre o risco de continuar
a ser parte do problema. No entanto e apesar disto, creio que muito poderá e
deverá ser feito no sentido da promoção efectiva da chamada e distante equidade
e igualdade de oportunidades. Aliás, talcomo no Estudo se demonstra, felizmente, temos muito boas experiências
que mostram que a escola pode, deve, de facto, fazer a diferença.
Do meu ponto de vista, muitas
vezes aqui afirmado, a questão central é a qualidade na escola pública. Esta
qualidade deverá assentar em três eixos fundamentais, a qualidade considerando
resultados, processos, autonomia e gestão optimizada de recursos, segundo eixo,
qualidade para todos, a melhor forma de combater os mecanismos de exclusão e a
desigualdade de entrada e, terceiro eixo, diferenciação de metodologias dos
percursos de educação e formação. Esta diferenciação de percursos deve passar,
e temos registado progressos nesta área, por uma oferta bastante mais variada
ao nível do secundário possibilitando a muitas jovens completar este nível de
ensino com competências profissionais, isto é que é fundamental. Também ao
nível do ensino superior, com o trabalho no âmbito do ensino politécnico se
criam condições para processos de qualificação mais curtos e mais
diversificados.
No actual cenário, quando se
entende e espera que a educação e qualificação possam ter um papel decisivo na
minimização de assimetrias, as políticas, os custos e a dificuldade de acesso
podem, pelo contrário, alimentar essas assimetrias e manter a narrativa,
"tal pai, tal filho", pai (mãe) letrado, filho letrado e pai (mãe) pouco letrado,
filho pouco letrado.
Assim sendo, urge a definição de
uma política educativa para o médio prazo, estabelecida com base no interesse
de todos, com definição clara de metas, recursos, processos e avaliação. A
continuar na deriva a que nas última décadas nos entregamos, daqui a algum
tempo um novo estudo ou a OCDE virá dizer exactamente o mesmo.