Lê-se no Expresso que a "dívida obrigacionista portuguesa -
em todos os prazos - registou uma rentabilidade nas últimas 52 semanas de
22,07%, a mais alta em toda a zona euro, segundo o índice da Bloomberg para a
dívida soberana (Bloomberg Global Benchmark Sovereign Bond Index)."
Dito de outra maneira, o investimento na nossa dívida é um
bom negócio. Não é que nos admiremos mas é sempre interessante vê-lo
comprovado.
Deixem que recordem mais alguns dados. Estima-se que a
Troika tenha arrecadado 5,6 mil milhões de euros em comissões e juros com o
generoso e desinteressado plano de ajuda que nos disponibilizou, por
solidariedade, evidentemente.
Gostava de recuperar a entrevista dada em Maio ao Público
por Phippe Legrain, ex-conselheiro económico de Durão Barroso, que constitui um
excelente contributo para entender como a ajuda "solidária" e
"generosa" dos nossos parceiros e que nos empobreceu foi, fundamentalmente,
resultante da incompetência das lideranças da Comissão Europeia e da protecção
dos interesses da banca francesa e, sobretudo, alemã. Nada de novo, apenas o
reforço de que a via seguida, austeridade e empobrecimento, não era a única
alternativa mas foi imposta para defender interesses particulares e aceite sem
sobressalto por uma gente sem espinha que abdicou da sua soberania.
Recordo, aliás, que em Novembro de 2013, já alguns países
europeus consideravam cada vez mais as políticas económicas
da Alemanha como o principal obstáculo à resolução da crise económica
que atravessamos, referindo-se que a Comissão Europeia iria desencadear uma
investigação sobre os excedentes comerciais e as contas correntes alemãs. No
entanto, a situação privilegiada da Alemanha é conhecida de há muito.
Segundo dados oficiais, a Alemanha poupou cerca de 41 mil
milhões de euros com a crise das dívidas soberanas na zona euro devido à queda
das taxas de juro sobre a sua taxa de dívida pública, considerada um
"refúgio seguro" pelos investidores do mercado.
Recordo ainda dados de Julho de 2013 que mostravam como os
grupos empresariais franceses e alemães foram os que mais beneficiaram das
políticas de ajuda do BCE sendo prejudicadas as empresas espanholas e
portuguesas. As taxas de juro do BCE decididas como medidas de apoio à economia
e a forma como os bancos gerem as taxas de juro nos empréstimos às empresas,
levaram a que, de acordo com a Comissão Europeia as pequenas e médias empresas
portuguesas, gregas, espanholas e cipriotas as que mais são penalizadas pagando
taxas de juro por empréstimos bancários entre os 6% e os 7% sendo que as alemãs
e as francesas beneficiam de uns mais simpáticos 2% a 3%. Muito interessante e
elucidativo.
Aliás, segundo o "Financial Times", com base em
dados do Banco Central Europeu estima-se uma diminuição de cerca de 42 mil
milhões de euros em pagamentos de dívida pelas empresas europeias nos próximos
cinco anos. Acontece que esta diminuição envolve sobretudo os grandes grupos
empresariais alemães e franceses admitindo-se uma poupança de 14 e 9 mil
milhões de euros, respectivamente e a Itália, com uma diminuição de 2,3 mil
milhões. No entanto e curiosamente, Portugal e Espanha verão as suas empresas
ainda mais penalizadas do que já estão com o aumento do pagamento.
Um mês antes, dados do Eurostat mostravam como de 2009 para
2012 os países do Centro e Norte da Europa ficaram mais ricos e os do Sul mais
pobres, ou seja e como sempre, a crise tornou os ricos mais ricos e os pobres
mais pobres. Para exemplificar, Portugal em 2009 tinha Portugal um PIB per
capita 80% da média da EU27 para em 2012 passar para 75% sendo agora
um dos quatro países com menor poder de compra.
A análise dos dados mostra como os países envolvidos em
programas de austeridade impostos pela "ajuda" se afundaram em
dificuldades e os países que generosamente "ajudam" vão enriquecendo.
Deve ser a isto que chama solidariedade e coesão europeias.
Parece claro que para além das enormes responsabilidades
políticas internas, importa considerar como, sem surpresa face a muitos dados
já conhecidos, que os países mais ricos têm beneficiado fortemente com os
pacotes de "ajuda solidária" dirigidos, impostos, aos países mais
pobres com os resultados conhecidos. Esta desinteressada ajuda acontece
mediante a cobrança de juros altíssimos. Mais um exemplo, dados de final de
2013, Portugal paga por ano 4,4% do seu PIB em juros, 7,2 mil milhões de euros,
valor que voa dos nossos bolsos para "dezenas de cofres de Estados e
bancos europeus" como afirmava na altura o I num trabalho sobre esta
matéria.
Por outro lado e como também se sabe, as economias
fortes do norte da Europa financiam-se a taxa zero ou mesmo, estranhamente a
taxas negativas, enquanto nós, as economias do sul e a Irlanda pagamos
juros altos cujo montante seria um excelente contributo para a redução dos
nossos problemas de equilíbrio. Está certo, somos pobres, temos o dinheiro mais
caro, os mais ricos têm o dinheiro mais barato. Deve ser isto a que chamam os
mercados a funcionar.
Eu sei que sou estúpido, a economia e as finanças
constituem uma matéria inacessível ao cidadão comum, mas parece-me,
certamente de forma errada, que assim se torna mais difícil que os países em
dificuldades deixem de ser pobres e que haja maior equidade e coesão económica
e política na União Europeia.
Que não me levem a mal os nossos generosos amigos, mas às
vezes até penso que é justamente isso que pretendem com a ajuda desinteressada
que nos dão, que, naturalmente, temos de pagar mas que nos vai deixando pobres.
Tenho até medo de estar a ser injusto para com a sua
generosidade e para com os feitores que em seu nome nos administram e estão de
forma tão empenhada e eficaz a promover o nosso empobrecimento.
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