domingo, 18 de janeiro de 2015

DA AVALIAÇÃO DAS ESCOLAS

O Público faz hoje referência a um recente relatório da rede Eurydice, "Assuring Quality in Education — Policies and Approaches to School Evaluation in Europe" sobre a avaliação da qualidade das escolas e dos modelos e dispositivos utilizados em 31 sistemas educativos europeus, todos os da UE bem como Islândia, Noruega, Turquia e Macedónia.
A importância e análise do Relatório não são compatíveis com um espaço desta natureza mas justificam algumas notas.
A avaliação é, seguramente, uma ferramenta de promoção e regulação da qualidade do trabalho desenvolvido o que a torna imprescindível nos vários patamares do sistema. Em Portugal, no universo da educação, a avaliação, seja de alunos, de professores ou das escolas tem sido um  terreno de enorme instabilidade e conflitualidade, seja pela incoerência e incompetência de diferentes iniciativas do MEC, seja pela contaminação da normal conflitualidade destas matérias pelos interesses conjunturais da partidocracia, traduzidos numa volatilidade espantosa de mudanças e alterações que nem tempo têm se ser avaliadas antes de ser novamente ... alteradas e sempre recebidas reactivamente.
Posto isto, algumas notas, também sublinhadas no trabalho do Público sobre o Relatório.
Para além da semelhanças verificadas entre o que se passa em Portugal e a realidade de outros países, relevam algumas diferenças significativas. Nesta perspectiva duas referências.
Uma primeira nota sublinhar a referência à baixa participação de alunos e pais na avaliação das escolas. Tal não surpreenderá dada a cultura, modelos e práticas de centralização que genericamente conhecemos, do pouco envolvimento dos alunos que também não será alheio à falta de autonomia que inibe mudanças a partir da escola.
No que respeita aos pais, também aqui, apesar das inúmeras experiências positivas, a centralização e a conflitualidade de interesses, sem sempre interiores à educação, não é favorável à participação dos pais, ainda que prevista, na avaliação das escolas. É ainda de realçar que temos, genericamente,  um baixo envolvimento dos pais na vida da escola.
A segunda nota relativa a diferenças importantes prende-se com o facto de Portugal ser um dos três únicos países em que a avaliação das escolas não contempla a observação de aulas. Esta matéria é mais uma das muitas em que a polémica é forte. Recordem-se as discussões sobre a observação de aulas no contexto da avaliação de professores e os discursos, práticas e equívocos instalados.
Aliás, à consideração dos técnicos os técnicos da Eurydice, é de realçar que seremos dos poucos países em que o Ministro da Educação entende que para avaliar a qualidade de um candidato a professor que, aliás, já possui experiência  e, naturalmente, formação, é suficiente a realização de uma Prova de Avaliação de Conhecimentos e Capacidades que mais parece um exercício de charadas lógicas com 32 itens fechados acompanhado de uma "redacção" e, numa segunda fase, uma prova, também escrita, sobre o conhecimento da área científica que leccionará e dispensa o essencial, a observação desse "candidato" no desempenho das funções a que se quer dedicar, dar aulas, ou seja, também não é observado o seu funcionamento em sala de aula. Aqui, lamentavelmente, podemos afirmar a coerência do sistema.
Finalmente, creio que se deve reflectir na forma como a  avaliação interna e externa é realizada, altamente burocratizada, solicitando uma carga enorme de informação, extensa, redundante e parte dela inútil, da forma que é requerida. A produção desta informação consome centenas de horas de trabalho a muitos docentes roubadas à essência do seu trabalho.
O nível de informação solicitada e as regras impostas de funcionamento e organização mostra, de facto, um sistema altamente centralizado, burocratizado e com a tentação de manter um controlo absoluto sobre a organização e funcionamento das escolas.
A minha experiência em processos desta natureza, como membro de Conselho Geral, incluindo escolas com contrato de autonomia, é elucidativa.
No último caso, o volume de informação produzido por exigência do quadro normativo global e do contrato de autonomia ocupava um espaço virtual de 4 MB para ser analisado na reunião do Conselho Geral. É obra e o problema é que tinha pouco de virtual e ... eficiente.
O desgaste e desperdício de tempo e esforço investidos na produção desta informação que, sendo lida algures no MEC também implicará mais uma enorme carga de trabalho mas que alimenta a máquina, não podem deixar de ter custos significativos na qualidade do trabalho das escolas.
A avaliação, sendo imprescindível na promoção da qualidade é tanto mais eficaz nessa função quanto mais competente e simples possa ser.
A questão é que, como dizia o Mestre João dos Santos, o mais difícil em educação é trabalhar de uma forma simples.

Sem comentários: