segunda-feira, 29 de agosto de 2016

DAS LEIS NECESSÁRIAS

Foi hoje publicado o Decreto-Lei n.º 58/2016 que determina que em todas as entidades “públicas e privadas, singulares e colectivas que prestem atendimento presencial ao público” as pessoas com deficiência, grávidas, com crianças pequenas e idosos passam a ter direito, agora em forma de lei, a atendimento prioritário.
Vejamos o seu artigo 3º.
Dever de prestar atendimento prioritário
1 — Todas as pessoas, públicas e privadas, singulares e colectivas, no âmbito do atendimento presencial ao público, devem atender com prioridade sobre as demais pessoas:
a) Pessoas com deficiência ou incapacidade;
b) Pessoas idosas;
c) Grávidas; e
d) Pessoas acompanhadas de crianças de colo.
2 — Para os efeitos estabelecidos no presente decreto-lei, entende -se por:
a) «Pessoa com deficiência ou incapacidade», aquela que, por motivo de perda ou anomalia, congénita ou adquirida, de funções ou de estruturas do corpo, incluindo as funções psicológicas, apresente dificuldades específicas susceptíveis de, em conjugação com os factores do meio, lhe limitar ou dificultar a actividade e a participação em condições de igualdade com as demais pessoas e que possua um grau de incapacidade igual ou superior a 60 % reconhecido em Atestado Multiusos;
b) «Pessoa idosa», a que tenha idade igual ou superior a 65 anos e apresente evidente alteração ou limitação das funções físicas ou mentais;
c) «Pessoa acompanhada de criança de colo», aquela que se faça acompanhar de criança até aos dois anos de idade.
3 — A pessoa a quem for recusado atendimento prioritário, em violação do disposto nos números anteriores, pode requerer a presença de autoridade policial a fim de remover essa recusa e para que essa autoridade tome nota da ocorrência e a faça chegar à entidade competente para receber a queixa nos termos do artigo 6.º
Algumas notas.
Idealmente, uma sociedade desenvolvida, eticamente saudável e atenta a todos os seus elementos e às suas necessidades não deveria precisar de leis desta natureza. No entanto, de há muito que aprendi que a realidade não é a projecção dos meus desejos apesar de muitos discursos de lideranças políticas definirem o que é a realidade por maior que seja a diferença entre o que dizem e o que vemos e sentimos.
Esta questão e sobretudo o disposto no ponto 3 recordou-me um episódio passado não há muito tempo num evento realizado numa cidade alentejana e dedicado às questões da inclusão, em particular das pessoas com deficiência e no qual colaborei.
Uma das pessoas presentes, que se desloca em cadeira de rodas, contou uma história interessante e elucidativa.
Ao deslocar-se de automóvel para uma zona comercial da cidade onde vive e quando se preparava para estacionar no espaço reservado a pessoas com deficiência, estava a estacionar um cidadão sem deficiência a quem o nosso amigo chamou a atenção para a sua condição e para o facto de aquele ser um espaço reservado.
Sintetizando a história, acabou por ouvir do "cidadão" que "tinha sorte em ser deficiente porque se o não fosse as coisas não ficavam assim". Esclarecedor.
O meu amigo, homem que entende não dever resignar-se procurou um agente da autoridade para apresentar queixa da ameaça e da infracção.
O agente da autoridade aconselhou o nosso amigo a não se "chatear" só por causa de um lugar de estacionamento. O nosso amigo não aceitou o conselho e continuou a reclamar os seus direitos. Acontece que é brasileiro e o agente da autoridade acabou por achar que ele devia era estar no país dele em vez de andar por aqui a chatear cada um.
Creio que é dispensável comentar quer a atitude do "cidadão", quer a atitude e comportamento do "agente da autoridade".
Por este tipo de coisas e a regularidade com que acontecem, o nosso amigo que usa a cadeira de rodas dizia que mais do que o "peso" da cadeira de rodas é difícil suportar as dificuldades criadas pelas atitudes e valores de muitas pessoas.
É só um exemplo do muito que está por fazer.
Assim sendo, que se protejam legalmente os direitos das pessoas bem como se regulamentem os deveres. Pode ser que contribua para a mudança de comportamentos.

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