Foi hoje divulgado um ensaio da Fundação
Francisco Manuel dos Santos. “Pessoas com deficiência em Portugal” em que se
analisa os problemas e contextos de vida da população com deficiência nas
últimas décadas. Não tendo ainda acesso ao trabalho cito do Público uma síntese
do autor, Fernando Fontes, da Universidade de Coimbra, “Desde os anos 1980, as mudanças reais nas vidas das pessoas com deficiência em Portugal têm sido mínimas: os benefícios sociais são insuficientes para elevar a vida das pessoas acima da linha de pobreza, os problemas no acesso ao emprego mantêm-se e continuam a ser excluídas por um sistema de ensino que não considera as suas necessidades e por um mercado de trabalho que exclui a diferença”.
Em primeiro lugar deve dizer-se
que, como acontece em outras áreas, a legislação portuguesa já tem alsuns aspectos globalmente
positivos,. No entanto, no caso da educação e do direito à independência e autonomia, por exemplo, é
urgente promover mudanças pois o quadro actual não é promotor dos direitos e da
inclusão.
Por outro lado, em muitos
aspectos a qualidade da sua operacionalização e falta de eficácia e
operacionalização são bem evidenciadas na tremenda dificuldade que milhares de
pessoas experimentam no dia-a-dia que decorre, por exemplo, da falta de
fiscalização relativa às questões das acessibilidades e barreiras nos
edifícios, mobiliário urbano e acessibilidade em geral.
De facto, existem ainda muitos serviços
públicos e outro tipo de equipamentos de prestação de serviços com barreiras
arquitectónicas intransponíveis, a que os cidadãos com deficiência só podem
aceder com ajuda de terceiros e, mesmo assim, com dificuldade. Os transportes
públicos de diferente natureza também colocam enormes problemas na
acessibilidade por parte de pessoas com mobilidade reduzida.
As normas de construção não são
respeitadas, mantendo-se em edifícios novos a ausência de rampas ou a sua
existência com desníveis superiores ao estabelecido, constituindo, assim, um
risco sério de queda.
Para além deste quadro,
suficientemente complicado, ainda há que contar com a prestimosa colaboração de
muitos de nós que estacionamos o belo carrinho em cima dos passeios,
complicando ou proibindo, naturalmente, a circulação de cadeiras de rodas. Os
passeios, nem sempre com as medidas determinadas por lei, são, por vezes e
quase na totalidade, ocupados com esplanadas que, claro, são só mais uma
dificuldade para muita gente.
A vida de boa parte das pessoas com
deficiência é uma constante e infindável prova de obstáculos, muitas vezes
intransponíveis, que tanto ampliam de forma inaceitável problemas decorrentes da sua condição como minimizam os seus direitos.
Também para as crianças com
deficiência e respectivas famílias a vida é muito complicada face à qualidade e
acessibilidade aos apoios educativos e especializados necessários apesar do
empenho e profissionalismo da maioria dos profissionais que trabalham nestas
áreas. Os tempos que correm são particularmente gravosos nesta matéria como
muitas vezes tenho afirmado.
Como é evidente, existem muitas
outras áreas de dificuldades colocadas às pessoas com deficiência,
designadamente apoios sociais, qualificação profissional e emprego, em que a
taxa de pobreza, a vulnerabilidade e o risco de exclusão, a taxa de desemprego são
muitíssimo superiores às verificadas com a população sem deficiência.
Uma referência particular a uma
dimensão em quase tudo está por fazer, a independência e autodeterminação das
pessoas com deficiência considerando a política de institucionalização que tem
vigorado.
De facto, o estado subsidia as
instituições para apoio a deficientes em 951€ mais uma parte dos rendimentos
dos cidadãos institucionalizados mas não apoia as próprias pessoas que poderiam
encontrar por sua iniciativa respostas e, provavelmente, com menores custos. Os
cidadãos com deficiência exigem também assumir a decisão sobre a escolha do seu
cuidador(a) dada a natureza da relação que se estabelece.
Mas é esse o entendimento
subjacente a boa parte das políticas sociais, os pobres, tal como as pessoas
com deficiência, não sabem tomar conta de si, precisam sempre da presença de
uma instituição prestadora de cuidados, não são autodeterminadas, independentes.
Como é evidente, este discurso
não pretende tornar dispensáveis as instituições, são necessárias
particularmente em situações de crise ou de problemáticas mais severas, mas,
simplesmente, de defender que as pessoas, muitas delas, são capazes de tomar
conta de si próprias, incluindo a gestão dos apoios que a sua situação possa
justificar.
No fundo, é, simplesmente, uma
questão de direitos individuais e sociais.
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