No Público de ontem o Professor
Filinto Lima publicou um texto “Quo vadis, Educação Especial?” no qual alertava
para um conjunto de problemas relativos à presença de alunos com necessidades
educativas especiais nas escolas regulares.
O texto tinha como base o aumento
do número de alunos com NEE em escolas de ensino regular verificado nos últimos
anos.
Cito, “O número de alunos com
necessidades educativas especiais (NEE) a frequentarem escolas regulares de
ensino, aumenta ano após ano, parecendo existir relativo descontrolo quer por
parte do ministério da Educação, quer por parte das escolas com dificuldades em
suster esta evolução desmesurada.”
Como tive oportunidade de já ter
escrito em texto de opinião no Público esta afirmação deve ser produzida e
interpretada com alguma prudência pois creio que podem estabelecer-se alguns
equívocos.
O que sucessivos relatórios vão
mostrando é que aumenta o número de alunos destinatários de dispositivos de
apoio educativo o que na verdade não significa que tenham NEE e, por outro
lado, em anos anteriores e por razões já muitas vezes abordadas existiam alunos
com dificuldades e sem qualquer apoio, ou seja em anos anteriores não tínhamos
menos alunos com NEE mas sim menos alunos apoiados em consequência das
políticas educativas o que não é a mesma coisa.
Concretizando, segundo a
Direcção-Geral de Estatísticas da Educação e Ciência, entre 2010/2011 e
2014/2015, o número de alunos com NEE subiu 73,5%, de 45.395 para 78.763. Este nível de aumento não pode, evidentemente, significar o aumento de casos de NEE mas sim
de alunos apoiados com a justificação de que apresentam NEE. Vejamos porquê.
De facto, por efeito de filtros
de uma natureza discutível na disponibilização de apoios e recursos a alunos
que evidenciam dificuldades, o número de alunos com apoio educativo era muito menor do
que o número de alunos que dele necessitavam e das estimativas de necessidades com
base em critérios internacionalmente aceites. Esta recorrente situação tem sido
objecto de análise quer pela Inspecção-Geral de Educação, quer pelo Conselho
Nacional de Educação
Neste cenário, por pressão dos
professores e pais confrontados com muitos alunos a necessitar de ajuda começou
a verificar-se progressivamente que, mesmo com os normativos desfavoráveis que
filtravam o acesso a apoios, as escolas foram tentando com os recursos
disponíveis providenciar algum tipo de ajuda o que contribui para esta subida
fortíssima de alunos com NEE em apoio nas escolas portuguesas.
No entanto, este aumento não
significa, não conheço estudos que o suportem, uma alteração com o mesmo grau
de significado no padrão e quadros de necessidades dos alunos no que se refere,
sublinho, a situações de NEE apesar da confusa e pouco sólida definição e
conceitos que os normativos utilizam. A estranha diferença entre o carácter
permanente ou “transitório(!)” das NEE que um aluno possa evidenciar é apenas
um exemplo.
Por outro lado, um sistema
educativo que tem vindo a tornar-se cada vez mais “normalizado” (currículos
extensos, prescritivos, assentes em centenas de metas curriculares por
disciplinas), competitivo, selectivo (“darwinista”), assente em filtros
sucessivos, os exames, os rankings, os incentivos às escolas com
sobrevalorização da avaliação externa dos alunos, etc. acaba, necessariamente,
por se tornar incapaz de acomodar as diferenças entre os alunos, nem sequer
estou a falar de NEE, e induz um aumento do número de alunos que podem sentir
dificuldade em acompanhar o “ritmo” do trabalho.
Mais uma vez, por inexistência de
recursos de outra natureza, muitas escolas providenciam alguns apoios a esta
franja de alunos através dos dispositivos de educação especial o que também
contribui para o aumento do número de alunos apoiados considerados como
apresentando NEE.
Tudo isto considerado surge o que
considero a questão central, que apoios e recursos estão a ser disponibilizados
a alunos, professores e pais? Serão suficientes, quer em docentes (apesar do
aumento verificado), técnicos (número de psicólogos baixou) ou assistentes
operacionais? Serão adequados? Contribuem para o sucesso real dos alunos
considerando todas as suas capacidades e competências? São informadas por
princípios de educação inclusiva cujo critério fundamental é a participação,
tanto quanto possível, nas actividades comuns das comunidades escolares?
Gostava de ser mais optimista até
porque estão em preparação alterações nesta matéria a verdade é que apesar do
esforço notável da generalidade das direcções escolares, dos professores,
técnicos e assistentes, da existência de práticas e experiências de excelente
nível, a realidade está aquém do que seria desejável.
Assim, a inquietação de
professores e pais é como responder de forma adequada e exigente, sim devemos
ser exigentes, às necessidades e dificuldades educativas ou escolares de todos
os alunos que em qualquer circunstância as possam evidenciar, independentemente
da sua natureza. Aliás, a necessidade de uma avaliação educativa sólida e
competente das reais necessidades ou dificuldades é o primeiro passo para uma
resposta adequada.
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