Os estabelecimentos de ensino
privado com contratos de associação estão hoje em protesto em Lisboa contra a
decisão do ME de apenas aceitar o financiamento de novas turmas em início de
ciclo quando não exista resposta nas escolas públicas da mesma área geográfica.
Como tenho vindo a afirmar este protesto tem assumido contornos feios com a
utilização e manipulação inaceitável de informação e mesmo das crianças que
frequentam alguns dos estabelecimentos envolvidos.
Entretanto, é também anunciada
pela FENPROF a realização de uma manifestação em defesa da escola pública a realizar
em Junho.
Algumas notas breves.
Um dos grandes equívocos intencionalmente
criados neste processo é a ideia de que está em causa o ensino privado. Não,
não está em causa o ensino privado. Este subsistema é imprescindível até como
como forma de pressão sobre a qualidade da resposta pública e a questão dos
contratos de associação envolve apenas 3% dos estabelecimentos de ensino
privado. Veja-se por exemplo, a habilidosa nota do Conselho
Permanente da Conferência Episcopal Portuguesa que “manifestou o seu apoio “a
esta e outras iniciativas que, com ordem e civismo, defendam a liberdade dos
pais escolherem a escola e projectos educativos que desejam oferecer aos seus
filhos”. Estes senhores sabem muito bem que não é isto que está em causa.
Um outro equívoco tem sido
afirmar que a questão dos contratos de associação tem a ver com a designada “liberdade
de escolha”. Não, não tem a ver com a liberdade escolha pois só se aplicam em
3% do universo dos estabelecimentos e foram criados porque … não há escolha,
não existindo resposta nas escolas públicas o estado financia a resposta
disponibilizada por privados. A alteração habilidosa de Nuno Crato retirando
este requisito não chega para alimentar a ideia de que está em causa a “liberdade
de escolha”.
A hipocrisia de proprietários,
direcções e Igreja sobre as consequências nos postos de trabalho e nas
movimentações de alunos dos estabelecimentos é sem limites. Para além de serem
conhecidas condições degradantes de trabalho e precariedade em vários
estabelecimentos, nunca se lhes ouviu um lamento pelas consequências do
encerramento de milhares de escolas e consequente deslocação das crianças e
pela saída de milhares de professores do sistema público em consequência de
políticas educativas que, simultaneamente, protegiam interesses privados.
Um outro equívoco instalado e
alimentado nos protestos é a ideia de que o ensino privado é garantia de
qualidade e o ensino público é o inferno. A excelência não é um exclusivo da
escola pública nem do ensino privado. As análises de resultados quando
devidamente consideradas todas as variáveis mostram isso mesmo, sendo ainda
que, e isto é o mais importante, só a educação e escola pública podem garantir
a equidade de oportunidades. Mais uma vez se foram disponibilizados
publicamente os dados sociodemográficos dos alunos do ensino privado esta
questão fica absolutamente esclarecida.
Finalmente, do meu ponto de
vista, não podemos diabolizar o ensino privado, é legítimo e necessário.
No entanto, é fundamental que o financiamento
público aos estabelecimentos de ensino privado deve acontecer apenas quando justificado o que,
aliás, esteve na génese dos contratos de associação.
A avaliação, regulação e
escrutínio sobre o funcionamento do ensino privado deve, tal como no sistema
público, ser rigoroso, transparente e conhecido.
A defesa da educação e da escola
pública não deve ser feita em luta contra o ensino privado, Deve ser assumida
face às decisões políticas e aos interesses e visão que nela desinveste.
Sem demagogia é bom não esquecer que nos
estabelecimentos de ensino privado existem muitas crianças, pais, professores e
funcionários que se vêem manipulados, atropelados e pressionados pela defesa dos interesses
de direcções e empresários.
Seria desejável fôssemos capazes
de com a serenidade possível evitar esta crispação que, basicamente, apenas
serve quem se serve da educação como negócio.
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