terça-feira, 5 de junho de 2018

AINDA ESTA QUESTÃO DA EDUCAÇÃO INCLUSIVA


Há alguns dias coloquei aqui umas notas sobre o Regime Jurídico para a Educação Inclusiva aprovado em Conselho de Ministros onde expressei a necessidade imperiosa de alteração do quadro legislativo anterior, a mudança positiva em vários aspectos agora contemplados mas também algumas dúvidas ou inquietações sobre algumas opções, incluindo teóricas e, sobretudo sobre o seu impacto real na resposta à diversidade dos alunos com qualidade e sustentada em princípios de educação inclusiva.
Como também disse, quero muito que do processo de alteração resulte mais qualidade nos processos educativos de todos os alunos, menos exclusão, tantas vezes em nome da … inclusão, mais participação de todos os alunos nas actividades comuns, mais apoios e de qualidade aos professores de ensino regular, os actores centrais nos processos educativos de todos os alunos para além dos pais, a disponibilização de recursos suficientes, adequados e em tempo oportuno e dispositivos de regulação do trabalho desenvolvido que minimizem os efeitos em que, perdoem-me o excesso e a repetição, da dimensão o sistema é verdadeiramente inclusivo, coexistem sem um sobressalto práticas excelentes com práticas e discursos que atentam contra os direitos de alunos, famílias e docentes.
O grande risco é que apesar de uma “nova lei” se mantenha o “velho” quadro que referi acima, escolas, professores e técnicos a desenvolver trabalhos de qualidade e assentes numa perspectiva de educação inclusiva e que assim continuarão a tentar fazer, seja qual for o quadro legal e escolas, professores e técnicos envolvidos em práticas que, seja qual for o quadro legal, guetizam, excluem, não promovem direitos, participação, pertença e aprendizagem, os verdadeiros critérios de educação inclusiva que transformam a “integração” em “entregação”, os alunos estão “entregados”, não integrados.
Por estas razões parece-me ainda indispensável a existência de dispositivos de avaliação e regulação que não se confundam com as competências da Inspecção-Geral da Educação e Ciência.
A propósito do que escrevi uma colega de longos anos nestas lides comentou o meu texto no sentido em que a perfeição não existe e … o caminho faz-se caminhando.
Não me quero sentir o Waldorf ou o Statler, os velhos dos Marretas que estão sempre na crítica mas a verdade é que julgo que só mudar mesmo que num caminho ajustado não significa … mudar.
Um pequeno exemplo. O regime de matrícula e de frequência no âmbito da escolaridade, Despacho Normativo 6/2018 de 12 de Abril deste ano, no Artigo 11.º “Prioridades na matrícula ou renovação de matrícula no ensino básico” refere com segunda prioridade os alunos “Com necessidades educativas especiais de caráter permanente não abrangidos pelas condições referidas na prioridade anterior e com currículo específico individual, conforme definido no artigo 21.º do Decreto -Lei n.º 3/2008, de 7 de janeiro, na sua redação atual ou do diploma sobre educação inclusiva que lhe venha a suceder”.
Desde 2008 que entendo que o Currículo Específico Individual é uma das maiores ferramentas de exclusão do DL3/2008, foi muitas vezes utilizado de uma forma desregulada empurrando crianças e adolescentes para trajectos que de inclusão têm nada. A sua própria designação sempre me surpreendeu, um “currículo individual” só pode, acho eu, ser “específico.
Como é que um novo “paradigma”, a eliminação da categorização, o fim das “necessidades educativas especiais”, educação inclusiva x.0 vai acomodar, para usar um termo em moda, o CEI, esta aberração perigosa.
O exemplo é um mau prenúncio e leva-me a manter alguma reserva apesar de preferir o optimismo e a confiança.
A propósito, o Ministro da Educação deu uma entrevista ao DN de natureza pessoal que achei interessante e em cujo final se lê:
Falou das diferenças entre alunos. A escola está preparada para isso: respeitar a diferença?
Também aqui temos um caminho a fazer. Estamos a trabalhar muito na inclusão. Tínhamos um processo de absoluta segregação, depois começámos a trabalhar num processo de integração. E agora estamos a trabalhar na verdadeira inclusão. Obviamente, com todos os instrumentos para que essa inclusão possa ser total. Mas o caminho da segregação para a integração e até à inclusão é um passo civilizacional.
Estarei de novo a parecer-me com Waldorf ou o Statle mas a coisa não é bem assim. É verdade que a inclusão é um passo civilizacional … se existir inclusão.
Por outro lado, nos últimos anos, na generalidade dos nossos territórios educativos, mesmo em cada comunidade, tivemos, temos e é o meu receio, teremos, crianças excluídas da escola, excluídas na escola, crianças integradas na escola e também, felizmente, crianças incluídas na escola e na comunidade. Aqui sim, como digo, o sistema é verdadeiramente inclusivo.
Por isso as minhas inquietações. Repito o que acima escrevi. Um melhor quadro normativo é necessário e uma boa base de trabalho mas mais recursos e apoios de qualidade aos professores de ensino regular, os actores centrais nos processos educativos de todos os alunos para além dos pais, a disponibilização de recursos suficientes, adequados e em tempo oportuno e dispositivos de regulação do trabalho desenvolvido são aspectos críticos.

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