Acabada a época de repouso
activo, há quem lhe chame férias, estava por aqui a preparar a semana ao som do
Manu Chao. O tema Clandestino ficou-me na cabeça e na inquietude.
Na sociedade portuguesa a
condição de clandestinidade foi, há muitos anos, o refúgio de muita gente por
razões conhecidas. A democracia viria, esperávamos, a acabar com esta condição.
Passados muitos anos, creio que nunca como agora a clandestinidade acolheu
tanta gente.
Estou a lembrar-me de miúdos em
dificuldades que vivem clandestinamente nas escolas, sem ajudas e com os seus
direitos atropelados por políticas incompetentes e delinquentes.
Estou a lembrar-me de miúdos que
vivem em famílias de que não sentem fazer parte.
Estou a lembrar-me de miúdos,
demasiados miúdos, que vivem clandestinamente em instituições que, mantendo-os
assim, se justificam e eternizam.
Estou a lembrar-me de miúdos que,
clandestinamente, são vítimas de abusos e maus tratos, muitos deles, por parte
de gente de quem só sabiam esperar apoio e afecto.
Estou a lembrar-me da imensa
minoria de jovens que vivem clandestinos num mercado de trabalho que lhes adia
ou rouba o projecto de vida.
Estou a lembrar-me de gente,
muita gente, que vive clandestinamente do lado de fora da vida.
Estou a lembrar-me dos milhares
de portugueses que vivem clandestinamente numa pobreza que conhecem mas que não
querem que se conheça.
Estou a lembrar-me de velhos que
vivem clandestinamente sós numa vida que não querem largar mas que já os
largou.
O Manu Chao só falou dos outros. E bem.
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