Não sei se será algo que a idade explique
mas com alguma frequência o pensamento foge para um tempo lá muito atrás.
Numa dessas viagens realizada há minutos,
provavelmente por razões que a trama de que se faz a memória tece lembrei-me do
meu amigo Fernando, meu colega no início da minha caminhada na escola. Era um tempo em que as redes sociais se construíam fundamentalmente na escola e na nossa rua.
Num grupo de miúdos completamente
doidos por futebol o Fernando era o maior. Nunca voltei a ver ninguém pequeno
com tanto jeito para jogar futebol como Fernando. Quando jogávamos entre nós
era difícil fazer equipas equilibradas, quem tinha o Fernando estava em
vantagem e, quase sempre, ganhava os jogos, quando jogávamos com a malta das
outras escolas era, como agora se diz, o nosso grande trunfo.
Devo dizer que o Fernando tinha
tanto jeito para a bola, sobretudo nos toques e fintas que ninguém conseguia
imitar, que não lhe sobrava jeito para a escola, arrastava-se, arrastou-se, até
que começou a chumbar.
O Fernando também tinha uma
particularidade que nos tornava mais próximo dele, o pai, não tinha mãe,
batia-lhe muito e naquela altura ainda não se tinha inventado a protecção de
menores. Sabíamos, embora ele não falasse disso, que frequentemente levava
grandes tareias. Mas quando a bola chegava ao pé dele, só visto, o Fernando era
o puto mais feliz do mundo e a gente, os da equipa dele, também. Vi-o uma vez
com um braço engessado fazer uma jogatana que só dava vontade de parar para o
ver jogar.
Quando tínhamos por aí uns doze
anos o Fernando e o pai mudaram-se e nunca mais soube dele, mantive-me atento
porque esperava que o Fernando viria, com toda a certeza, a tornar-se um craque
mas em vão, o Fernando não mais se viu e ninguém soube nada dele.
O Fernando, provavelmente, foi um
daqueles muitos miúdos que falham o encontro que têm marcado com o futuro e cuja estrada passa incontornavelmente pela escola.
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