No DN de hoje divulga-se um
trabalho sobre uma realidade que muitos desconhecem, alguns desvalorizam,
outros negligenciam e quem conhece sabe quanto é grave e causadora de
sofrimento e, por vezes, com um fim trágico, os comportamentos autodestrutivos
em adolescentes e jovens, a automutilação. Segundo um estudo da Universidade de
Coimbra que envolveu 2.863 adolescentes, entre os 12 e os 19 anos, a frequentar
o 3.º ciclo e o ensino secundário em escolas do distrito de Coimbra cerca de
20% afirma já ter desencadeado comportamentos autolesivos pelo menos uma vez na
vida.
Estes resultados estão em linha
com trabalhos internacionais e como dados do estudo “A Saúde dos adolescentes
Portugueses”, o de 2014, que integra o estudo internacional Health Behaviour in
School-aged Children, da responsabilidade da OMS. Também um em cada cinco
alunos entre o 8º e o 10º ano já se magoou a si próprio, de propósito, nos
últimos 12 meses, sobretudo cortando-se nos braços, nas pernas, na barriga...
Referiram que se sentiam “tristes”, “fartos”, “desiludidos” quando o fizeram.
Este indicador, preocupante como
é evidente, é-o tanto mais quando representa um aumento de quase cinco pontos
percentuais do grupo dos que fazem mal a si próprios considerando o Relatório anterior.
É importante sublinhar que neste
estudo foram envolvidos no estudo 6026 alunos do 6.º, 8.º e 10.º anos, de
Portugal continental, com idades entre os 10 e os 20 anos (a média de idades é
14 anos).
Na verdade, os comportamentos de
automutilação em adolescentes são mais frequentes e graves do que muitas vezes
pensamos e devem ser encarados com preocupação.
São indicadores do mal-estar que
muitos adolescentes e jovens sentem. Em muitas situações não conseguimos estar
suficientemente atentos. Acontecem com alguma frequência situações de
sofrimento com as mais diversas origens, relações entre colegas, bullying por
exemplo nas suas diferentes formas, ou relações degradadas em família que
facilitam a instalação de sentimentos de rejeição, ausência de suporte social,
facilitadoras de comportamentos autodestrutivos.
Começa também a emergir como
causa deste mal-estar a dificuldade que algumas crianças e adolescentes sentem
em lidar com situações de insucesso escolar. Estas dificuldades são
frequentemente potenciadas pela pressão das famílias e pelo nível de competição
que por vezes se instala.
O sofrimento e mal-estar induzem
uma espiral de comportamentos em que os adolescentes causam a si próprios
sofrimento que promove mais sofrimento num ciclo insuportável e com níveis de
perplexidade, impotência e sofrimento para as famílias também
extraordinariamente significativos.
Depois das ocorrências torna-se
sempre mais fácil dizer qualquer coisa mas é necessário. Muitas crianças e
adolescentes evidenciam no seu dia-a-dia sinais de mal-estar a que, por vezes,
não damos atenção, seja em casa, ou na escola espaço onde passam boa parte do
seu tempo.
De facto em muitos casos,
designadamente, em comportamentos de automutilação, pode ser possível perceber
sinais e comportamentos indiciadores de mal-estar. Estes sinais não podem, não
devem, ser ignorados ou desvalorizados. É também importante que pais e
professores atentos não hesitem nos pedidos de ajuda ou apoio para lidar com
este tipo de situações.
Muitos pais, diz-me a
experiência, sentem-se de tal forma assustados que inibem um pedido de ajuda
por se sentirem impotentes e perplexos.
O resultado pode ser trágico e
obriga-nos a nós a uma atenção redobrada aos discursos e comportamentos dos
adolescentes.
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