A preocupação hoje conhecida do
Conselho Nacional de Educação relativa ao impacto negativo que o programa “Escola a tempo inteiro” pode
implicar levou-me a procurar um dos primeiros textos que escrevi no Atenta
Inquietude, “Escola a Tempo Inteiro –
mais um equívoco”, em Fevereiro de 2007. Aliás, tendo participado em várias iniciativas e debates na altura do seu lançamento já estava habituado a ser o tipo que levantava dúvidas sobre algo que parecia e era apresentado como cheio de virtudes.
Por curiosidade ecom a vossa licença aqui fica,
dez anos depois ainda parece actual no seu conteúdo apesar da desactualização histórica. Coisa estranha não é?
“A iniciativa do Ministério da Educação divulgada sob o desígnio
"ESCOLA A TEMPO INTEIRO" sendo dirigida a um problema presente na
generalidade das comunidades educativas, a ocupação e supervisão das crianças
fora dos tempos lectivos/escolares, tem, na sua implantação e desenvolvimento,
evidenciado mais um dos muitos equívocos presentes nas políticas e iniciativas
subscritas por esta equipa ministerial.
Não me refiro aos incidentes relativos à organização e ao mau
aproveitamento do muito que nesta matéria era já realizado, por exemplo,
através de ATL(s) a funcionar no âmbito de parcerias com as Associações de
Pais. Interessa-me sobretudo a dimensão da qualidade educativa dos espaços e
conteúdos definidos, fundamentalmente, nas escolas do 1º ciclo do ensino básico
pela reconhecida importância de promover desde início experiências educativas
de qualidade, pois ... "o que nasce torto, tarde ou nunca se
endireita".
O equívoco existe ao confundir a importante necessidade de
"EDUCAÇÃO A TEMPO INTEIRO" com "ESCOLA A TEMPO INTEIRO". Na
prática em muitas situações que conheço verifica-se:
- A dificuldade óbvia e esperada de encontrar recursos humanos com
experiência e formação para ensino de inglês ou trabalho noutras actividades,
com crianças dos 6 aos 10. Recorre-se então a docentes de inglês do 2º e 3º
ciclo e ensino secundário ou, em alguns casos, a pessoas com formação académica
mas sem formação pedagógica, em inglês, por exemplo. Em muitas situações este
procedimento resulta na réplica para as crianças de aulas e actividades
pensadas para pré-adolescentes e adolescentes. O benefício imediato é quase
nulo e a consequência a prazo poderá ser a desmotivação, no mínimo.
- O modelo de organização do trabalho, sendo desenvolvido por
professores ou outros elementos desconhecedores do modelo de funcionamento do
1º ciclo, mostra-se, com frequência, completamente desajustado. Como exemplo,
refiro o horário de um grupo de 1º ano (crianças com 6 anos): trabalham com a
professora da turma das 9h às 12 e das 13 e 15 às 15 e 15, e todos os dias têm
a seguir dois ou três tempos de 45 minutos até às 17 e 30 ou 18.
Verificamos assim que as crianças estão envolvidas em tarefas de
natureza escolar durante um tempo que nestas idades se torna completamente
excessivo e contraproducente. Quero sublinhar que o que me parece errado não é tanto o tempo em que as crianças se envolvem em trabalho e que estão na escola, mas
sim a natureza desse trabalho, "licealizado", ou seja, organizado por
tempos, de forma rígida e ocupado com conteúdos e tarefas não compatíveis com
crianças deste escalão etário.
Este quadro ilustra, creio, o equívoco a que me referi. Em vez de
tentarmos estruturar um espaço que seja educativo a tempo inteiro, preenchido
na escola e com qualidade, assistimos à definição de uma pesada agenda de
actividades que está a motivar situações de relação com a escola turbulenta e
reactiva. Alguns pais têm optado por retirar (quando e se podem) os seus filhos
deste tipo de actividades.
Como entendo que esta matéria é susceptível de diferentes
entendimentos, gostaria de conhecer opiniões e experiências que ajudassem à
reflexão e ao conhecimento de outras realidades que desejaria mais positivas.”
O resto tem sido conhecido e ainda penso da mesma forma sobre este
equívoco
Sem comentários:
Enviar um comentário