sábado, 22 de janeiro de 2011

OS MANUAIS DE UM ENSINO MANUALIZADO

No público de hoje aparece um trabalho divulgando um estudo do Observatório dos Recursos Educativos sobre a questão dos manuais escolares. Este estudo, em síntese, sustenta que o fornecimento por parte do estado dos manuais seria negativo para editores e livreiros, que o empréstimo de manuais escolares seria negativo para o estado e para as famílias, discriminativo para os alunos a quem fossem emprestados e que sentimento de posse do manual é positivo para os alunos pelo que, deve concluir-se, é muito difícil alterar a situação, eu diria, o mercado. Antes de umas notas breves importa sublinhar que este Observatório dos Recursos Educativos é apoiado pela Porto Editora uma das maiores, senão a maior editora de manuais escolares, mercado que vale entre 80 e 100 milhões de euros, o que, pela óbvia conflitualidade de interesses, fere definitivamente o estudo. Por curiosidade, há algum tempo, o mesmo Observatório num estudo junto de pais e alunos revelava que 80 % dos pais preferem que os filhos estudem pelos manuais por se encontrar aí reunida a informação essencial e porque os manuais são o “guião de trabalho do professor”. Relativamente aos alunos, 70 % dos inquiridos prefere estudar pelo manual. Quanto aos aspectos negativos dos manuais é referido o preço e o peso, aspectos que sendo importantes não são centrais, claro, acrescento eu.
As conclusões destes estudos vão sempre, naturalmente, no mesmo sentido, a imprescindibilidade de manter o mercado dos manuais escolares.
No trabalho do Público são referidas experiências de outros países em que o fornecimento dos manuais por parte do estado é positivo e garante da equidade mas, diz o responsável do Observatório, a nossa realidade é diferente. Claro que é diferente, o mercado manda muito. O facto de alunos com manuais emprestados poderem sentir-se discriminados é uma realidade que se coloca com qualquer dispositivo de apoio o que não obsta a que se tornem necessários, deve, isso sim, pensar-se como minimizar os riscos de discriminação que, é claro para toda a gente, nem sequer serão os maiores riscos que os alunos carenciados correm.
Estes dados sublinham uma realidade a que já me tenho referido, uma excessiva manualização do ensino. Apesar da progressiva disponibilização de outras fontes de informação e do acréscimo de acessibilidade através das tecnologias de informação e de outros suportes, a utilização dessas fontes alternativas aos manuais é baixa e pouco valorizada por pais e alunos. De facto, embora o abandono do “livro único” tenha ocorrido há já bastante tempo e de uma preocupação, ainda pouco eficaz, com a qualidade dos manuais, predomina a sua utilização e das respectivas fichas e instrumentos como materiais de apoio às aprendizagens e à “ensinagem” e que agravam substantivamente os custos das famílias. Aliás, nota-se ainda no ensino superior a dificuldade que muitos alunos afirmam sentir quando percebem que não têm um “manual”.
Do meu ponto de vista, a minimização da dependência dos manuais passará, entre outros aspectos, por uma reorganização curricular, diminuindo a extensão de algumas conteúdos, por exemplo, o que permitiria a alunos e professores um trabalho de pesquisa e construção de conhecimentos com base noutras fontes potenciando efectivamente a acessibilidade que as novas tecnologias oferecem.
É importante caminharmos no sentido de atenuar a fórmula única instalada, o professor ensina com base no manual o que o aluno aprende através do manual que o pai acha muito importante porque tem tudo o que professor ensina.

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