Depois de demasiado tempo agarrados à utopia ingénua de que todo os alunos chegariam ao ensino superior apesar dos escandalosos números do insucesso e abandono no Ensino Básico e Secundário, a partir de certa altura e timidamente, começaram a surgir ofertas de vias de ensino profissionalizante que, por má explicação política, foram sobretudo entendidas com a estrada por onde vai quem não tem "jeito" ou competência para estudar. Neste contexto, famílias e alunos sentiram dificuldade em aderir a algo percebido como sendo de segunda. Entretanto, o nível inaceitável de chumbos e abandono no secundário continuava a envergonhar-nos.
Nos últimos anos, temos finalmente assistido a uma significativa diferenciação da oferta educativa, sobretudo depois do 9º ano, e essa oferta começa agora e ainda de forma ténue a perceber-se como uma alternativa à continuação de estudos, o ensino superior politécnico ou universitário. A questão é que em muitas escolas esta oferta diversificada é ainda gerida de forma classista ainda no básico, ou seja, os bons alunos são os que se encaminham para os cursos gerais e os outros são encaminhados para os cursos profissionais que assim continuam percebidos como de segunda.
Neste universo, os Cursos de Educação e Formação cujo existência é importante e tem permitido o desenvolvimento de boas experiências em muitas escolas, também tem servido para "crivo", ou seja, para estes cursos são encaminhados basicamente os alunos com insucesso ou em risco, instalando uma imagem de "alunão" dos CEF, espaços (recipientes) para onde despejam os alunos que não prestam. Tais práticas têm ainda o efeito lateral de aliviar as estatísticas do insucesso e abandono, uma tentação maior das equipas do ME.
A determinação, hoje referida no Público, de aumentar o número mínimo de alunos exigido para criação de turmas de CEF sem o qual não há financiamento, de 10 para 15, amplia, do meu ponto de vista, o risco de que em algumas escolas se acentuem as práticas de selecção, discriminação negativa, que garantam o número de alunos necessários para se criarem as turmas e obter o financiamento.
O nível de desenvolvimento das sociedades actuais exige níveis de qualificação profissional sem os quais o risco de exclusão social é enorme, como sempre digo, a exclusão escolar é a primeira etapa da exclusão social. Assim, conseguir que os alunos, todos os alunos, cumpram a etapa escolar saindo com qualificações profissionais é o grande desafio que o nosso sistema educativo enfrenta e para cujo sucesso é fundamental a oferta de percursos formativos diferenciados mas sérios e com qualidade.
Na tentação de torcer a realidade até que esta diga aquilo que se pretende, o ME tortura os números para os transformar em sucessos que componham as estatísticas, confunde frequentemente certificar com qualificar, um equívoco de consequências devastadoras.
Não basta fazer as coisas certas, é também necessário fazer certas as coisas.
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