sábado, 8 de agosto de 2009

UM HOMEM BOM

Eu não sei se Raul Solnado era um homem bom, não o conhecia, mas só consigo pensar em Raul Solnado como um homem bom.
Quando era pequeno, numa família suburbana de cultura operária, a ausência de aparelhagem musical tornava-nos ouvintes dependentes da rádio. Era pela telefonia que nos chegava o Raul Solnado com aquelas histórias incrivelmente ingénuas, que nos obrigavam a ficar calados, todos, para ouvirmos e só ríamos no fim para não perdermos nada. Depois de ter acesso a um pequeno gravador de cassetes, um salto enorme lá em casa, algumas vezes gravava as histórias nos programas de discos pedidos.
Com a televisão chegou o Zip-Zip e Raul Solnado criou algumas das personagens mais inteligentemente construídas que ainda hoje a memória cultiva. Num país e num tempo em que a inteligência fazia parte das proibições não era tarefa menor.
Nos últimos anos, sempre que me era dado ouvi-lo, a minha impressão mantinha-se, era um homem bom.
Eu acho que Raul Solnado seria um daqueles avós que todos os putos deviam ter, divertido, optimista, feliz, contador de histórias e malandro.

1 comentário:

Dylan disse...

"A vida num palco"

Não sendo eu da geração de Raúl Solnado, sei a perda irreparável que o seu desaparecimento provocou, numa época em que a comédia se confunde com o insulto brejeiro. O actor aprendeu com os melhores - João Villaret, António Silva e Vasco Santana -também por isso, merece estar na galeria dos imortais. Imaginemos a audácia e a inteligência de ridicularizar o Antigo Regime e os seus tabus, contornando a censura, utilizando jogos de palavras numa encapotada infantilidade. Foi um homem solidário que deu tudo pelo teatro, muitas vezes colocado acima dos interesses familiares.

http://dylans.blogs.sapo.pt/