Coincidindo com o início do ano lectivo foi ontem publicada
a Resolução da Assembleia da República n.º 178/2019 que recomenda ao Governo
que “Estude e avalie a possibilidade da introdução da sesta nos
estabelecimentos de educação pré-escolar”, considerando, a “importância do sono”
e a necessidade de “articulação da implementação da sesta com as orientações
curriculares para a educação pré-escolar e a organização dos horários e tempo
lectivo e não lectivo dos educadores de infância” devendo, para isso que sejam asseguradas
“As condições materiais e humanas que são necessárias garantir para um período
de sono com qualidade”.
A este propósito umas notas começando por duas referências
de natureza pessoal.
Há muitos anos o meu filho frequentou um jardim-de-infância
da rede social, onde esteve globalmente muito bem acompanhado, a adaptação
correu bem, mas a partir de certa altura começou a pedir para que se possível o
fôssemos buscar logo a seguir ao almoço. Para abreviar a história só algum
tempo depois é que percebemos que o gaiato, na altura com quatro anos e ainda
um sesto-dependente, se sentia muito desconfortável por ter de dormir calçado,
isso mesmo, calçado. Falámos com a educadora e com a auxiliar, a situação
alterou-se, a sesta ficou tranquila e o João feliz. Era um exemplo de miúdo
para o qual a sesta era importante e foi-o mais algum tempo, ainda nos rimos
hoje cá em casa porque era frequente quando passeávamos naquela época ter que
me sentar num banco de jardim onde ele adormecia facilmente durante um
tempinho, ficando pronto e em forma para o resto do dia.
Ontem, curiosamente, num outro jardim-de-infância da mesma
instituição o meu neto Pequeno de três anos, o Tomás, iniciou a sua viagem pela
educação em instituição. Tal como para o pai, para o Tomás continua a ser imprescindível
a sesta notando-se bem no seu estar os dias em que por qualquer razão não dorme
o tempinho da tarde.
Na verdade, é conhecido que em muitas instituições, por
várias razões, logísticas por exemplo, se determina uma idade, quase sempre aos
três anos e menos frequentemente aos quatro, a partir da qual se retira às
crianças a possibilidade da sesta, "proibindo-a".
Como em muitos outros aspectos as crianças não têm padrões
de sono/vigília iguais pelo que umas, mais cedo que outras, começam a dispensar
a sesta e algumas, é bom não esquecer, a adquirir estilos de vida que não sendo
contrariados pelas famílias as levam rapidamente a viver com menos horas de
sono do que seria desejável com várias consequências menos positivas. Todos os
estudos sobre esta questão assinalam a falta de qualidade do sono nas nossas
crianças e também nos mais velhos com consequências significativas em várias
dimensões, comportamento, rendimento escolar, saúde física, etc.
Por outro lado, muitas vezes a alternativa que em muitas
instituições é oferecida para ocupar este tempo é ela também de má qualidade.
Não há muito tempo foi divulgada a situação de crianças que não faziam a sesta
e ficavam numa sala na penumbra a olhar para um ecrã.
Deve ainda considerar-se que boa parte das
crianças estão nas instituições durante um número de horas significativo pelo
que a sesta poderia ser um factor de repouso e corte numa presença
institucional diária de longa duração.
Assim, parece uma questão de bom senso e qualidade
educativa, permitir que nos jardins-de-infância da rede pública, social ou
privada se disponibilizem as condições adequadas e sem o limite rígido da idade
para que as crianças cumpram uma sestazinha que para muitos é um bem de
primeira necessidade.
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