Ontem foi apresentado com a presença
do Secretário de Estado, João Costa, um trabalho resultante do Projecto ComParte
& Educação iniciado em 2015 visando conhecer a opinião dos alunos sobre
eventuais mudanças nas escolas que melhorassem o ensino. Desde 2015 terão sido
recolhidas recomendações com a participação de mais de 3800 alunos.
Não conheço o trabalho mas
referências da imprensa sublinham aspectos como a duração das aulas com a
eventual existência de pausas e a necessidade maior comunicação entre docentes,
mas também funcionários, e os alunos com dimensões a considerar em termos de
melhoria.
Se bem estarão recordados em
Novembro de 2016 o ME organizou em Leiria um encontro que reuniu alunos do
ensino básico e secundário sobre temáticas como “O que aprendemos? Como
aprendemos melhor? O que distingue os professores que constituem referências
para nós? O que retemos do que aprendemos? Como utilizamos o que aprendemos? O
que (não) mudaríamos na escola?”.
Na altura, escrevi sobre isso
aqui, os alunos apresentaram questões como aulas mais práticas, mais debates,
mais trabalho colaborativo, mas saídas da escola, diversificação das opções de
escolha das disciplinas no secundário, mais actividades ligadas às expressões, mais
conteúdos ligados à cidadania, maior ligação com a prática, promoção do
espírito crítico, turmas mais pequenas, professores motivados e que não
desistam dos alunos.
Não tenho um entendimento
idealizado ou romântico do “diálogo” e do “ouvir os alunos” mas creio que
importará, de facto, ouvir os alunos, todos os alunos, com real interesse no
seu olhar e ideias sobre a sua vida escolar. Também sei que a voz de muitos alunos nas salas de aula são vozes perturbadoras e, também, frequentemente sinais de outros "mal-estares" e problemáticas, familiares, por exemplo.
Parece-me, portanto, uma
iniciativa positiva esperando que seja mais uma iniciativa avulsa que
possibilita uns títulos na imprensa e umas referências elogiosas da OCDE mas
com pouco impacto no que se pretende, melhorar o trabalho de alunos e
professores.
A propósito de ouvir os alunos,
recordo que há algum tempo participei num conjunto de conversas com alunos do
2º e 3º ciclo em que se discutia o que era essa coisa de ser um bom professor.
A maioria dos alunos envolvia-se
activamente e a continuidade das referências levou à identificação de uma
resposta que se poderia sintetizar na ideia de que "bom professor é o que
fala com a gente e explica bem".
Este entendimento lembrou-me,
cito-o aqui frequentemente, o Mestre João dos Santos quando afirmava que alguém
tinha sido seu professor "porque foi seu amigo".
De facto, o sucesso dos processos
de ensinar e aprender assenta em dois eixos fundamentais, a qualidade do
ensinar e a relação entre quem ensina e quem aprende. Do meu ponto de vista, a
grande maioria dos professores estará equipada sobre o ensinar. A grande
questão é que a nossa escola, de uma forma geral, não facilita a relação. Esta
dificuldade decorre, fundamentalmente, da organização dos tempos lectivos, da
natureza e extensão dos conteúdos curriculares das diferentes e muitas
disciplinas, da crescente pressão para resultados tangíveis, o número de alunos
por turmas em algumas escolas e agrupamentos, e do número de turmas leccionado
por muitos professores, de um ensino demasiado assente no manual, da burocracia
esmagadora, etc. para além, naturalmente, das concepções de alguns professores.
Os professores, muitos
professores, sentem-se "escravos" do programa que deverá ser dado,
sobretudo nos anos de exame e no ensino secundário e do pouco tempo disponível
para construção da relação que na verdade se torna muito difícil.
Muitas vezes digo que os
professores "falam" para o programa, para o explicar, e os alunos
"falam" para o programa para o aprender. Não falam entre si sendo
que, além disso, existe um grupo significativo de alunos que, por diversas
razões como dificuldades ou desmotivação ou associadas a variáveis de contexto,
não conseguem "falar" com o programa. Para estes, os professores
vêem-se obrigados a falar, sobretudo para controlar os seus (maus)
comportamentos.
Também por estas razões, continuo
a entender como necessária uma mudança mais significativa na organização dos
tempos da escola e dos conteúdos curriculares que tornassem mais fácil podermos
ouvir os alunos dizer, "a gente tem bons professores porque explicam bem e
falam com a gente".
Esta ideia não tem nada de
romântico nem de utópico, assenta em algo de muito simples, a educação
constrói-se com a relação que se alimenta com a comunicação.
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