No Expresso encontram-se duas
peças sobre uma mas mais preocupantes questões no universo dos mais novos e da
educação, a violência de diferente natureza, incluindo psicológica, presente
nas relações interpessoais entre adolescentes e jovens e a percepção de
normalidade relativa a vários tipos de comportamento. Muitas vezes aqui tenho
abordado esta questão mas é preciso insistir.
O primeiro trabalho refere que o
ME tem em preparação um plano e uma campanha com o lema, “Escola sem bullying.
Escola sem violência” dirigida para o bullying que envolverá a rotina de
serem reportados pelas escolas todos os episódios de bullying e iniciativas que
visam melhorar a identificação de alerta, orientação para docentes e escolas ou
a disponibilização de formação para professores e de uma plataforma com
conteúdos de orientação para alunos, famílias e escolas.
A generalidade dos estudos sugere
valores entre 10 e 25% de vítimas de bullying envolvendo adolescentes e jovens
sendo que é ainda mais preocupante o crescimento da variante cyberbullying que,
dada a sua natureza não presencial e permanente, contém riscos de crescimento e
sofrimento muito fortes.
Na segunda peça é divulgado o
programa de intervenção da responsabilidade do Departamento de Educação e
Psicologia da UTAD, designado Prevint, que foi operacionalizado em mais de 100
escolas e apresentado a perto de 14 000 alunos e que originou uma
ferramenta de apoio agora disponível online. O Programa é direccionado para a identificação,
intervenção e prevenção no âmbito da violência presente de diferentes formas e
com incidência preocupante nas relações interpessoais de adolescente e jovens.
Retomando notas já aqui escritas
é importante sublinhar que uma das características do fenómeno, nas suas
diferentes formas, incluindo o emergente cyberbullying, é justamente o medo e a
ameaça de represálias a vítimas e assistentes que, evidentemente, inibem a
queixa pelo que ainda mais se justifica a atenção proactiva e preventiva de
adultos, pais, professores ou funcionários. Importa ainda não esquecer o risco
acrescido e documentado de alunos de grupos minoritários, alunos com
necessidades especiais ou com orientação sexual diversa, por exemplo.
Tal como se define na iniciativa
do ME e no trabalho da UTAD, neste universo importa considerar dois eixos
fundamentais de intervenção por demais conhecidos, a prevenção e a intervenção
depois dos problemas ocorrerem. Esta intervenção pode, por sua vez e de forma
simplista, assumir uma componente mais de apoio e correcção ou repressão e
punição, sendo que podem coexistir. Com alguma demagogia e ligeireza a propósito
do bullying, como de outras matérias como a indisciplina, por exemplo, as vozes
a clamar por castigo têm do meu ponto de vista falado mais alto que as vozes
que reclamam por dispositivos de prevenção, intervenção e apoio para além da
óbvia punição, quando for caso disso.
A incidência de episódios de
bullying, como também de indisciplina, mostra a necessidade de
dispositivos de apoio e orientação absolutamente fundamentais para que pais,
professores e alunos possam obter informação e apoio. Existem, felizmente,
várias iniciativas com um trabalho positivo, mas apesar da colaboração em
projectos nas escolas, muitas destas iniciativas vêm de fora da escola. Todas as
iniciativas, campanhas e projectos são relevantes mas é nas escolas e com as
escolas e as suas equipas que tudo deve acontecer, não esquecendo, obviamente, o contexto da educação familiar.
Assim, a existência de
dispositivos de apoio sediados nas escolas, com recursos qualificados e suficientes,
a presença suficiente de assistentes operacionais com funções de supervisão dos
espaços escolares, são algumas das prioridades. Sem entrar numa lógica de
corporativismo profissional, creio que o papel dos psicólogos de educação podem
dar um contributo sério mas o seu número nas escolas e agrupamentos e rácio
excessivo verificado inibem uma melhor intervenção e participação.
Do meu ponto de vista, o
argumento custos não é aceitável porque as consequências de não mudar são
incomparavelmente mais caras. Depois das ocorrências torna-se sempre mais fácil
dizer qualquer coisa mas é necessário. Muitas crianças e adolescentes
evidenciam no seu dia-a-dia sinais de mal-estar a que, por vezes, não damos
atenção, seja em casa, ou na escola, espaço onde passam um tempo enorme.
Estes sinais não podem, não
devem, ser ignorados ou desvalorizados. O resultado pode ser grave.
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