domingo, 24 de fevereiro de 2019

CRIANÇAS E ADOLESCENTES ONLINE. DE NOVO


Foram divulgados resultados relativos a 2018 do projecto EU Kids Online realizado pelas Professoras Cristina Ponte e Susana Batista da Universidade Nova de Lisboa analisando a utilização da net e das redes sociais por crianças e adolescentes. Este trabalho integra um projecto europeu envolvendo cerca de 30 países e os resultados serão publicamente apresentados na próxima semana.
Foram inquiridas 2000 crianças e adolescentes entre os 9 e os 17 anos sobre os seus comportamentos e padrão de utilização.
Não é possível desenvolver aqui uma análise ao extenso volume de dados e informação disponibilizada mas comparativamente aos resultados de 2014 verifica-se uma subida da frequência das situações de risco a que parece também estar a associada a maior operacionalidade e o tempo de contacto permitido pela migração da utilização dos pc para os mais “operacionais” smartphones”. 
Curiosamente no semana que passou integrei um painel de discussão no XXIII Encontro da Adolescência que teve justamente como tema “(Des)ligados”, a relação dos adolescentes com a net e redes sociais.
Foram abordadas questões direccionadas para o impacto desta relação na saúde mental e bem-estar dos adolescente e eu com uma intervenção mais direccionada para o seu impacto nos processos educativos escolares e familiares e, naturalmente, também no bem-estar de crianças e adolescentes.
Para além dos dados do EU Kids Online recordo um trabalho da OCDE de 2018 "Curriculum Flexibility and Autonomy in Portugal – na OECDreview” em que considerando dados de 2012 e 2015 (recolhidos no âmbito do PISA), oito em cada dez adolescentes portugueses afirmam "sentir-se mal" se não estiverem ligados à internet. Apenas os adolescentes franceses e suecos de entre os 31 países envolvidos evidenciam uma taxa superior.
Podemos considerar mais um sinal dos tempos as múltiplas referências ao tempo excessivo e dos riscos associados que que muitas crianças e adolescentes despendem com a ligação à net nas suas múltiplas possibilidades designadamente as redes sociais.
Como os dados do EuKids Online evidenciam os riscos são múltiplos tal como são múltiplas as potencialidades.
Nesta perspectiva e tal como noutras áreas o recurso privilegiado a estratégias proibicionistas não funciona. São mais eficientes a promoção da utilização autoregulada e informada. A net e o mundo de oportunidades, benefícios e riscos que está presente em todas as suas potencialidades é uma matéria que deve merecer a reflexão de todos os que lidam com crianças e jovens embora não lhes diga exclusivamente respeito. É o nosso trabalho.
Em casa, têm durante muitas horas um ecrã como companhia durante o pouco tempo que a escola "a tempo inteiro" e as mudanças e constrangimentos nos estilos de vida das famílias lhes deixam "livre". Também é verdade que a crescente "filiação" em redes sociais virtuais possam “disfarçar”, juntando quem “sofre” do mesmo mal e o tempo remanescente para estar em família, frequentemente ainda é passado à sombra de uma televisão.
De há muitos anos que se sabe que não se cresce só, cresce-se na relação com pares e adultos. É por isso que, embora entenda a expressão, ouvir chamar a este tempo, o tempo da comunicação, me faz sorrir, acho mais apropriado considerá-lo o tempo do estar só ou a assistir à solidão dos outros. Recordo a afirmação de um miúdo de 11 anos colocada num desenho, "a minha consola é que me consola".
Estas matérias, a presença das novas tecnologias na vida dos mais novos, são problemas novos para muitos pais. Considerando as implicações sérias na vida diária importa que se reflicta sobre a atenção e ajuda destinada aos pais para que a utilização imprescindível e útil seja regulada e protectora da qualidade de vida das crianças e adolescentes. Existem demasiadas situações em que desde muito cedo os “smartphones” funcionam como “babysitters”.
Por outro lado, a experiência mostra-me que muitos pais desejam e mostram necessidade de alguma ajuda ou orientação nestas matérias. Sabemos que estratégias proibicionistas tendem a perder eficácia com a idade.
Creio que o caminho terá de passar por autonomia, supervisão, diálogo e muita atenção aos sinais que crianças e adolescentes nos dão sobre o que se passa com elas.
A referência final para um indicador que foi considerado pela primeira vez neste estudo e que me parece positivo e encorajador, crianças e adolescentes percebem que a sua “entrada” neste universo pode não ser por sua iniciativa. Foram inquiridos sobre “sharenting”, partilha realizada pelos pais de conteúdos que envolvem os filhos, e revelam algum desconforto, 28% afirmam que os pais publicaram conteúdos (textos, vídeos ou imagens” sobre eles sem lhes perguntarem se estavam de acordo, 13% sentiram-se incomodados com essas partilhas e 14% solicitaram aos pais que retirassem esses conteúdos.

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