Foram divulgados resultados
relativos a 2018 do projecto EU Kids Online realizado pelas Professoras Cristina
Ponte e Susana Batista da Universidade Nova de Lisboa analisando a utilização da net e das
redes sociais por crianças e adolescentes. Este trabalho integra um projecto
europeu envolvendo cerca de 30 países e os resultados serão publicamente apresentados na próxima semana.
Foram inquiridas 2000 crianças e
adolescentes entre os 9 e os 17 anos sobre os seus comportamentos e padrão de
utilização.
Não é possível desenvolver aqui
uma análise ao extenso volume de dados e informação disponibilizada mas
comparativamente aos resultados de 2014 verifica-se uma subida da frequência
das situações de risco a que parece também estar a associada a maior operacionalidade e o
tempo de contacto permitido pela migração da utilização dos pc para os mais “operacionais”
smartphones”.
Curiosamente no semana que passou
integrei um painel de discussão no XXIII Encontro da Adolescência que teve
justamente como tema “(Des)ligados”, a relação dos adolescentes com a net e
redes sociais.
Foram abordadas questões direccionadas
para o impacto desta relação na saúde mental e bem-estar dos adolescente
e eu com uma intervenção mais direccionada para o seu impacto nos processos
educativos escolares e familiares e, naturalmente, também no bem-estar de
crianças e adolescentes.
Para além dos dados do EU Kids
Online recordo um trabalho da OCDE de 2018 "Curriculum Flexibility and Autonomy in Portugal – na OECDreview” em que considerando dados de 2012 e
2015 (recolhidos no âmbito do PISA), oito em cada dez adolescentes portugueses
afirmam "sentir-se mal" se não estiverem ligados à internet. Apenas
os adolescentes franceses e suecos de entre os 31 países envolvidos evidenciam
uma taxa superior.
Podemos considerar mais um sinal
dos tempos as múltiplas referências ao tempo excessivo e dos riscos associados
que que muitas crianças e adolescentes despendem com a ligação à net nas suas
múltiplas possibilidades designadamente as redes sociais.
Como os dados do EuKids Online
evidenciam os riscos são múltiplos tal como são múltiplas as potencialidades.
Nesta perspectiva e tal como
noutras áreas o recurso privilegiado a estratégias proibicionistas não funciona.
São mais eficientes a promoção da utilização autoregulada e informada. A net e
o mundo de oportunidades, benefícios e riscos que está presente em todas as
suas potencialidades é uma matéria que deve merecer a reflexão de todos os que
lidam com crianças e jovens embora não lhes diga exclusivamente respeito. É o
nosso trabalho.
Em casa, têm durante muitas horas
um ecrã como companhia durante o pouco tempo que a escola "a tempo
inteiro" e as mudanças e constrangimentos nos estilos de vida das famílias
lhes deixam "livre". Também é verdade que a crescente
"filiação" em redes sociais virtuais possam “disfarçar”, juntando
quem “sofre” do mesmo mal e o tempo remanescente para estar em família,
frequentemente ainda é passado à sombra de uma televisão.
De há muitos anos que se sabe que
não se cresce só, cresce-se na relação com pares e adultos. É por isso que,
embora entenda a expressão, ouvir chamar a este tempo, o tempo da comunicação,
me faz sorrir, acho mais apropriado considerá-lo o tempo do estar só ou a
assistir à solidão dos outros. Recordo a afirmação de um miúdo de 11 anos
colocada num desenho, "a minha consola é que me consola".
Estas matérias, a presença das
novas tecnologias na vida dos mais novos, são problemas novos para muitos pais.
Considerando as implicações sérias na vida diária importa que se reflicta sobre
a atenção e ajuda destinada aos pais para que a utilização imprescindível e
útil seja regulada e protectora da qualidade de vida das crianças e
adolescentes. Existem demasiadas situações em que desde muito cedo os “smartphones”
funcionam como “babysitters”.
Por outro lado, a experiência
mostra-me que muitos pais desejam e mostram necessidade de alguma ajuda ou
orientação nestas matérias. Sabemos que estratégias proibicionistas tendem a
perder eficácia com a idade.
Creio que o caminho terá de
passar por autonomia, supervisão, diálogo e muita atenção aos sinais que
crianças e adolescentes nos dão sobre o que se passa com elas.
A referência final para um indicador que
foi considerado pela primeira vez neste estudo e que me parece positivo e
encorajador, crianças e adolescentes percebem que a sua “entrada” neste
universo pode não ser por sua iniciativa. Foram inquiridos sobre “sharenting”, partilha
realizada pelos pais de conteúdos que envolvem os filhos, e revelam algum
desconforto, 28% afirmam que os pais publicaram conteúdos (textos, vídeos ou
imagens” sobre eles sem lhes perguntarem se estavam de acordo, 13% sentiram-se incomodados
com essas partilhas e 14% solicitaram aos pais que retirassem esses conteúdos.
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