Segundo um trabalho da OCDE
considerando dados de 2012 e 2015 (recolhidos no âmbito do PISA), oito em cada dez adolescentes portugueses afirmam "sentir-se mal" se não estiverem ligados à internet. Apenas os adolescentes franceses e suecos de entre os 31 países
envolvidos evidenciam uma taxa superior. Por géneros, de 79,4% e entre as
raparigas é de 79,2%, considerando os dados de 2015.
Podemos considerar mais um sinal
dos tempos as múltiplas referências ao tempo excessivo e dos riscos associados
que que muitas crianças e adolescentes despendem com a ligação à net nas suas
múltiplas possibilidades, designadamente as redes sociais.
A net e o mundo de oportunidades, benefícios e riscos
que está presente em todas as suas potencialidades é uma matéria que deve merecer a reflexão de todos os que lidam com crianças e jovens embora não lhes diga exclusivamente respeito. Consideremos alguns dos potenciais problemas.
Recordo que segundo dados do
projecto europeu EuKids Online, o uso continuado da Internet repercute-se em
45% das crianças portuguesas com um dos seguintes sintomas: não dormir, não
comer, falhar nos trabalhos de casa, deixar de socializar, tentar passar menos
tempo online.
Já aqui tenho abordado esta
problemática a propósito das implicações do uso excessivo das novas tecnologias
no desenvolvimento de crianças e adolescentes, designadamente nos hábitos e
saúde do sono.
Um estudo recente realizado nos
EUA acompanhando durante seis anos 11 000 crianças encontrou fortes indícios de
relação entre perturbações do sono e o desenvolvimento de problemas de natureza
diferenciada no comportamento e funcionamento das crianças.
Esta questão, os padrões e
hábitos de sono das crianças, é algo de importante que nem sempre parece
devidamente considerada.
Também entre nós, vários estudos
sobre os hábitos e padrões de sono em crianças e adolescentes têm sido
desenvolvidos, segundo os quais mais de metade dos adolescentes inquiridos
apresentam quadros de sonolência excessiva e evidenciam hábitos de sono pouco
saudáveis. Esta constatação vai no mesmo sentido de outros trabalhos com
crianças mais novas. A falta de qualidade do sono e do tempo necessário acaba,
naturalmente, por comprometer a qualidade de vida das crianças e adolescentes.
Várias investigações sugerem que
parte das alterações verificadas nos padrões e hábito relativos ao sono remetem
para questões ligadas a stress familiar e sublinham o aumento das queixas
relativas a sonolência e alterações comportamentais durante o dia.
Acresce, como os dados do EuKids
Online evidenciam, um conjunto de outros riscos decorrentes da utilização menos
regulada das novas tecnologias o que solicita alguma reflexão sobre hábitos e
estilos de vida dos mais novos. Um dos problemas emergentes e preocupantes neste
universo é a utilização das redes sociais e risco do cyberbullying que já aqui
tenho abordado. Segundo alguns estudos, perto de 50% das crianças até aos 15
anos terão computador ou televisor no quarto, além do telemóvel.
Acontece que durante o período de
sono e sem regulação familiar muitas crianças e adolescentes estarão diante de
um ecrã, pc, tv ou telemóvel. Com é óbvio, este comportamento não pode deixar
de implicar consequências nos comportamentos durante o dia, sonolência e
distracção, ansiedade e, naturalmente, o risco de falta de rendimento escolar
num quadro geral de pior qualidade de vida. Creio que, com alguma frequência,
alguns comportamentos, sobretudo nos mais novos, que são de uma forma
aligeirada remetidos para o saco sem fundo da hiperactividade e problemas de
atenção, estarão associados aos seus hábitos e padrões de sono como, aliás, os
estudos parecem sugerir.
Em casa, têm durante muitas horas
um ecrã como companhia durante o pouco tempo que a escola "a tempo
inteiro" e as mudanças e constrangimentos nos estilos de vida das famílias
lhes deixam "livre". Também é verdade que a crescente
"filiação" em redes sociais virtuais possam “disfarçar”, juntando
quem “sofre” do mesmo mal e o tempinho remanescente para estar em família, frequentemente ainda é passado à sombra de uma televisão.
De há muitos anos que se sabe que
não se cresce só, cresce-se na relação com pares e adultos. É por isso que,
embora entenda a expressão, ouvir chamar a este tempo, o tempo da comunicação,
me faz sorrir, acho mais apropriado considerá-lo o tempo do estar só ou a
assistir à solidão dos outros. Recordo a afirmação de um miúdo de 11 anos
colocada num desenho, "a minha consola é que me consola".
Estas matérias, a presença das
novas tecnologias na vida dos mais novos, são problemas novos para muitos pais.
Considerando as implicações sérias na vida diária importa que se reflicta sobre
a atenção e ajuda destinada aos pais para que a utilização imprescindível e
útil seja regulada e protectora da qualidade de vida das crianças e
adolescentes.
A experiência mostra-me que
muitos pais desejam e mostram necessidade de alguma ajuda ou orientação nestas
matérias. Sabemos que estratégias proibicionistas tendem a perder eficácia com
a idade.
Creio que o caminho terá de
passar por autonomia, supervisão, diálogo e muita atenção aos sinais que
crianças e adolescentes nos dão sobre o que se passa com elas.
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