domingo, 11 de fevereiro de 2018

DO PROJECTO DE AUTONOMIA E FLEXIBILIDADE CURRICULAR

Com a chancela da OCDE e com a opinião de professores, direcções e consultores a avaliação intermédia do Projecto de Autonomia e Flexibilidade Curricular parece positiva embora aponte algumas fragilidades.
Antes de mais quero reafirmar que o Projecto contém aspectos positivos e que como escrevi torço para que resulte. Por outo lado, também é verdade que em educação os projectos raramente são avaliados de forma consistente e isenta e já nascem condenados ao sucesso até ao próximo “projecto inovador”, tentação de todas as equipas ministeriais. Também estava escrito nas estrelas que este Projecto seria bem-sucedido.
Pensando sobretudo na sua potencial generalização, “sugestão” da OCDE e intenção já expresso pela 5 de Outubro algumas notas.
Parece-me ajustado definir autonomia e diferenciação (mais do que flexibilidade e bem mais que flexibilidade curricular) como eixos centrais do trabalho das escolas no sentido de responder à diversidade de alunos e contextos, única forma de promover sucesso educativo e inclusão.
Em primeiro lugar a autonomia das escolas terá de ser real, não assente numa ideia de “municipalização” e deverá envolver desde logo a possibilidade de diferenciação na organização e funcionamento das escolas, nos horários, na constituição das turmas ou grupos de alunos, na gestão curricular e caminha até à sala de aula ao nível das práticas pedagógicas. Para tal serão necessários os meios e os recursos bem como os dispositivos de regulação e de avaliação.
No que diz respeito à diferenciação no contexto onde tudo se decide, a sala de aula, apesar do currículo ser uma questão crítica a diferenciação está para além da “flexibilização curricular”.
A característica mais evidente de qualquer sala de aula ou escola é a diversidade. Em muitas conversas que realizo com pais pergunto aos corajosos que têm mais que um filho se os tratam da mesma maneira. Nunca alguém me responde que sim e se pergunto porquê, respondem com um ar óbvio qualquer coisa como “então, eles são diferentes”.
Esta é questão central, com grupos diversos e escolas diversas a resposta deve, tem que ser, diferenciada sob pena de não acomodar as diferenças entre os alunos comprometendo a qualidade, o sucesso e a inclusão.
Todo o sistema educativo e as políticas educativas devem servir de suporte a esta visão.
Indo um pouco mais longe nas práticas pedagógicas e como nestas se traduz um princípio de diferenciação umas notas breves sublinhando que alterar alguns aspectos não tem a ver com “inovação”, termo cuja utilização frequente me irrita um bocado. A questão central pode ser alterar e não inovar, são de há muito conhecidas boas práticas que diariamente são mobilizadas em muitas escolas quase sempre com pouca divulgação, até mesmo interna.
Uma primeira nota sobre o equívoco habitual de que diferenciação é sinónimo de trabalho individual. Considerando as dificuldades (e o desajustamento) de fazer assentar o trabalho educativo no trabalho individual, encontra-se assim um suposto “impedimento” à diferenciação. De facto, diferenciar não é igual a trabalho individualizado, pelo contrário, implica muito fortemente a aprendizagem cooperada e a cooperação entre professores. Aliás, verificando-se desejavelmente a aprendizagem individual por parte de cada aluno a sua construção é social pelo que mesmo que fosse possível o recorrer exclusivamente ao trabalho individual, (o que nem com turmas mais pequenas aconteceria) não seria a melhor forma de trabalhar.
Assim, só o desenvolvimento de formas diferenciadas de organizar os processos educativos, de gerir a sala de aula, de avaliar, de gerir a estrutura curricular ela própria com uma concepção e conteúdos que sejam amigáveis desta diferenciação, de comunicar, de cooperar com pais e encarregados de educação, etc., poderá permitir responder tão bem quanto possível à diversidade dos alunos e contextos.
Nesta perspectiva, a organização e funcionamento de uma sala de aula da forma mais ajustada a recursos e necessidades contemplar alguma foram de diferenciação em dimensões como: Planeamento educativo/gestão curricular; Organização do trabalho dos alunos – as múltiplas formas de organizar o trabalho dos alunos relativamente às situações de aprendizagem; Clima de aprendizagem – a qualidade e nível de interacção e relacionamento social entre alunos e entre professor e alunos; Avaliação – os processos relativos à avaliação e regulação do processo de ensino e aprendizagem (sem surpresa, uma das dificuldades expressas na avaliação intermédia); Actividades / Tarefas de aprendizagem – a escolha das diferentes tarefas ou situações de aprendizagem a propor aos alunos e Materiais e Recursos – a definição, utilização e gestão dos materiais e recursos que funcionarão como suporte ao processo de ensino/aprendizagem.
Como nota final sublinhar o que tantas vezes afirmo, um dos factores individuais mais contributivos para a qualidade dos processos educativos e dos processos de mudança em educação é a presença e valorização de um professor empenhado e qualificado.

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