Gostei de ler o texto de Vítor
Belanciano no Público, “Separamos o lixo. Limpamos a consciência. Mas algo
muda?”
(…)
(…)
Deixem-me acrescentar algumas
notas sobre algo que me parece crítico o nível de absolutamente insustentável,
também pelo impacto ambiental, de desperdício nas nossas comunidades, centrando
numa matéria fundamental, a alimentação.
Em 2016 o The Guardian referia um
estudo segundo o qual metade de toda a comida produzida nos EUA é deitada ao
lixo.
Mais alguns dados. A Organização
para a Alimentação e a Agricultura, da ONU, estima que 1,3 mil milhões de
toneladas de alimentos, um terço do que é produzido, são desperdiçadas com um
custo de anual de 570 mil milhões de euros para a economia global, o suficiente
para alimentar 925 milhões de pessoas. Vivemos num mundo estranho. Na Europa,
até chegar ao consumidor perde-se entre 30 e 40% da comida, qualquer coisa como
179 quilos por habitante, 42% dos quais em casa.
Segundo o Projecto de Estudo e
Reflexão sobre o Desperdício Alimentar (PERDA), desenvolvido pela Universidade
Nova de Lisboa conhecido em 2014, estima-se que “no campo e no armazenamento,
no sector da pecuária e nas pescas, todos os anos são desperdiçadas 332 mil
toneladas de alimentos em Portugal, valor que ultrapassa o desperdício que é
feito pelos próprios consumidores (324 mil toneladas de comida deitadas fora).
Somando as 77 mil toneladas
perdidas na indústria que processa os alimentos, entre o campo e as fábricas,
desperdiçam-se no total 409 mil toneladas por ano.”
Esta escala de valores no que
respeita ao desperdício de alimentos é devastadora e, como por vezes se quer
acreditar, não é coisa de gente rica, é coisa de toda a gente e mostra o quase
tudo que está por fazer embora actualmente tenhamos em Portugal algumas
iniciativas importantes no sentido de atenuar desperdícios.
Na verdade, o desperdício é um
subproduto dos modelos de desenvolvimento e dos sistemas de valores que deveria
merecer uma fortíssima atenção.
Há algum tempo, creio que em
2013, o Parlamento Europeu aprovou um relatório segundo o qual a União Europeia
que tem 79 milhões de pessoas a viver abaixo do limiar de pobreza, 15,8% da
população, e desperdiça anualmente cerca de metade do que consome em alimentos.
Este desperdício corresponde a 89 mil milhões de toneladas, um assombro. Aliás,
o Parlamento Europeu estabeleceu como objectivo reduzir em 50% o desperdício
até 2025.
Neste quadro releva a necessidade
urgente de ponderar os modelos de desenvolvimento económico e social,
questionar o quadro de valores com que nos organizamos em comunidade,
designadamente no que respeita ao ambiente, ao consumo e aos excessos e combater
desperdícios que também são consequência desses modelos. Veja-se o caso da
quantidade de fruta de excelente qualidade rejeitada pelo aspecto ou pela
dimensão.
Escrever sobre estas questões em
espaços desta natureza terá alcance zero, mas continuo convencido que é
fundamental não deixar cair a preocupação, talvez seja melhor chamar-lhe a
indignação, com os efeitos que, naturalmente, também se traduzem em pobreza e exclusão.
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