quarta-feira, 22 de fevereiro de 2017

DA DIRECÇÃO DAS ESCOLAS, DE NOVO

Foram divulgados os resultados do inquérito realizado pela Fenprof sobre a gestão das escolas. Das perto de 25 000 resposta releva 92% dos inquiridos defendem um modelo colegial de direcção e 75 defendem o modelo de direcção unipessoal em vigor.
É ainda de considerar que 71% dos professores que responderam entendem terem aumentado as situações de abuso do poder, o clima de insegurança e de medo e o alheamento relativamente aos assuntos da vida escolar. Ao contrário, 18% acredita que o actual modelo melhorou as relações de trabalho e as condições de participação nos processos de discussão e decisão.
Verifica-se mais equilíbrio no entendimento sobre quem deve presidir ao conselho Pedagógico, 52% entende que pode ser qualquer dos seus membros e 47% defende que apenas deve ser presidido pelo director ou pelo presidente do conselho de gestão.
Estes dados não são de todo inesperados, antes pelo contrário.
Como já tenho escrito a questão da direcção das escolas e agrupamentos entrou definitivamente na agenda. Como se recordam estão em análise na AR algumas propostas de origem partidária e de estruturas sindicais e em Dezembro foi divulgado um Manifesto subscrito por algumas individualidades. As posições expressas têm sido no sentido de repensar do actual modelo de gestão das escolas. Afirma-se no Manifesto citado que o modelo de direcção unipessoal está associado “a uma crescente desvalorização da cultura democrática nas escolas e à anulação da participação colectiva dos professores, dos alunos e da comunidade educativa” pelo que defendem a retoma da “gestão democrática” assente no anterior modelo de natureza colegial, “conselho directivo”.
Entretanto foi conhecido também um texto de opinião do Professor José Eduardo Lemos, Presidente do Conselho de Escolas que entende justamente o contrário, a adequação do modelo de gestão unipessoal, a bondade da sua forma de eleição e afirma “É necessário dizer isto de forma clara e inequívoca: ao contrário do que sugerem e afirmam alguns políticos e outras personalidades, é absolutamente falso que não haja democracia nas escolas bem como assim, que a substituição de órgãos unipessoais por órgãos colegiais garanta mais democracia na organização escolar.”
Os dados do inquérito agora conhecidos sugerem alguma necessidade de melhor avaliar o clima das escolas.
Como já tenho afirmado a propósito de outras matérias, talvez fruto do ambiente de fortíssima crispação que nos últimos anos envolve a educação, os debates e as ideias também tendem a ser crispados, com opiniões definitivas e sem margem de entendimento e, frequentemente, com agendas menos explícitas. O modelo de gestão das escolas será apenas mais exemplo deste cenário.
Com o atrevimento de quem não vive por dentro o quotidiano das escolas mas procura acompanhar de forma atenta o universo da educação, retomo algumas notas.
Conforme tenho dito sempre me pareceu claro que a transformação da direcção de escolas e agrupamentos num modelo unipessoal e a sua forma de eleição através dos conselhos gerais, acompanhada por uma política de mega-agrupamentos diminuindo substancialmente o número de unidades orgânicas, gosto desta designação, se inscreveu na sempre presente tentação de controlo político do sistema. São conhecidos casos, alguns chegam à imprensa, de processos de eleição de direcções escolares que mais não são do que formas de colocar pessoas com o alinhamento certo na função. Aliás, o próprio funcionamento dos conselhos gerais é, em algumas situações, um exemplo disto mesmo. Assim sendo, o modelo de gestão unipessoal e a forma de eleição dos directores não são garantias de “mais democracia” ou “melhor democracia” nas escolas.
Dado um pecado estrutural do nosso sistema educativo, a ausência de dispositivos de regulação ao longo de décadas, coexistem boas experiências e práticas em situações de direcção unipessoal com situações bem negativas.
Por outro lado, importa recordar que em muitas circunstâncias a “gestão democrática", de democrática não tinha assim tanto e também se verificavam casos gritantes de menor competência.
Dito isto, parece-me que tanto quanto ou mais do que o modelo de direcção, unipessoal ou colegial, julgo de reflectir na forma de eleição, participam todos os docentes ou um pequeno grupo que “representa” o corpo docente no conselho geral, o mesmo se passando com os funcionários.
Por outro lado, também me parece que deve existir um claro reforço do papel dos Conselhos Pedagógicos no funcionamento de escolas e agrupamentos. Parece-me também clara a vantagem da presidência do Pedagógico ser independente da direcção da escola, sobretudo num modelo de direcção unipessoal
Importa também que a reflexão sobre a direcção de escolas e agrupamentos seja acompanhada de uma verdadeira reflexão sobre o quadro de autonomia nas suas várias dimensões e equilíbrios. Qual o efeito da anunciada municipalização ou “proximidade”, como também lhe chamam, na autonomia de escolas e agrupamentos.
É claro que quanto mais sólido for o modelo de autonomia das escolas mais importante se torna o papel e função da direcção, independentemente do modelo. Esta é do meu ponto de vista a questão central.
Muitos estudos e a experiência mostram que nas organizações, incluindo escolas, a qualidade das lideranças tem um impacto forte no desempenho das instituições e também de todos os que nela funcionam. Boas lideranças escolares traduzem-se em melhores e mais estáveis climas de trabalho, maior nível de colaboração entre os profissionais, menor absentismo, melhores resultados ou menos incidentes de natureza disciplinar, melhor relação com pais e comunidade, entre outros aspectos.
Camões já afirmava que um fraco Rei faz fraca a forte gente” o que numa actualização republicana poderá entender-se como a defesa de lideranças competentes, com um gestão participada, com mecanismos de eleição alargados, transparentes, escrutinados e com, insisto, mecanismos de regulação que previnam excessos e abusos.
Alguns episódios na contratação de docentes, de funcionários ou nos processos que envolvem técnicos e docentes envolvidos nas AECs são exemplos a ter em conta pela forma negativa como foram geridas por algumas direcções de escolas e agrupamento.

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