O Público de hoje retoma a questão do consumo de álcool entre os mais novos fazendo uma elucidativa viagem à versão portuguesa do "botellon" espanhol, o consumo na rua. O consumo de álcool tem vindo a crescer alterando-se também os padrões de consumo, beber na rua (é bastante mais barato, e o consumo excessivo e rápido (binge drinking). João Goulão, presidente do Instituto da Droga e da Toxicodependência refere que em termos de padrões de consumo, a embriaguez parece deixar de ser uma consequência do consumo excessivo para passar a ser um objectivo em sim mesmo. Este padrão tem vindo a ser sublinhado por diferentes estudos sobre os hábitos dos adolescentes e jovens portugueses, cerca de 80% dos jovens com 15 anos consomem álcool segundo um trabalho da Unidade de Alcoologia de Coimbra do IDT e em 2007, 56% dos jovens com 16 anos inquiridos referiram este tipo de consumos enquanto que em 2003 o indicador era de 25%.
Este quadro e, sobretudo, o significado dos seus potenciais efeitos, merece alguma reflexão, sobretudo no que respeita à facilidade de consumo e aquisição e aos estilos de vida, questão que é, aliás, abordada no trabalho jornalístico.
Uma primeira nota é o facto de os adolescentes poderem facilmente comprar cerveja e outras bebidas, as litrosas ou os shots, como lhes chamam, no comércio mais habitual, lojas de conveniência ou pequenos estabelecimentos de bairro, a um preço bem mais acessível que nos estabelecimentos que frequentam na noite e recorrendo à “toma” simples ou com misturas ao longo da noite, comprida aliás. O consumo em quantidade e em grupos, sobretudo ao fim-de-semana, é muitas vezes entendido e sentido como o factor de pertença ao grupo, potenciando a escalada do consumo, juntos bebemos mais do que sós, como é óbvio e o estado que se atinge é sentido como um "facilitador" relacional. Por outro lado, a venda processa-se com a maior das facilidades e sem qualquer controlo da idade dos compradores. Muitos adolescentes, ouvidos em estudos nesta matéria, referem ainda a ausência de regulação dos pais sobre os gastos, sobre os consumos ou sobre as horas de entrada em casa, que muitas vezes tem que ser discreta e directa ao quarto devido ao “mau estado” do protagonista.
Como é evidente, já muitas vezes aqui o tenho referido com base na minha experiência de contacto com pais de adolescentes, não estamos a falar de pais negligentes. Pode haver alguma negligência mas, na maioria dos casos, trata-se de pais, que sabem o que se passa, “apenas fingem” não perceber desejando que o tempo “cure” porque se sentem tremendamente assustados, sem saber muito bem o que fazer e como lidar com a questão. De fora parece fácil produzir discursos sobre soluções, mas para os pais que estão “por dentro” a situação é muitas vezes sentida como maior que eles.
É preciso que a comunidade esteja atenta a estes adolescentes de 13 ou 14 anos que, ilegalmente” compram as litrosas e acedem aos shots e aos seus pais que estão tão perdidos quanto eles.
Fala-se com frequência em alterar a legislação no sentido de apenas permitir o consumo aos 18 anos. No entanto, parece-me mais importante a adequada fiscalização e a criação de programas destinados a pais e aos adolescentes que minimizem o risco do consumo excessivo.
A proibição, como sempre, não basta.
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