Segundo o Público, a Ordem dos Médicos irá apresentar em breve uma proposta ao Ministério da Saúde no sentido de dispensar a exigência de atestado médico impeditivo de trabalho em algumas circunstâncias clínicas, como casos de gripe ou enxaquecas. A proposta radica, de forma sintética em duas ordens de razões, a sobrecarga dos serviços com estes pedidos e a dificuldade que em alguns quadros clínicos o próprio médico terá em atestar a impossibilidade de trabalho. Assim, a proposta da Ordem remete para responsabilidade do cidadã ou seja, para sua consciência ética e deontológica. É aqui que, do meu ponto de vista reside a questão. A realidade não é a projecção dos meus desejos pelo que vejo com sérias reservas esta confiança depositada no cidadão.
Todos nós a temos mais profunda consciência que a utilização da baixa é apenas mais um dos muitos "esquemas" em que vivemos mergulhados. A baixa permite o biscate que compõe orçamentos familiares, liberta uns diazinhos de descanso, etc., e, é bom que se diga, trata-se de um fenómeno que atravessa várias estratos sociais. Ainda há pouco tempo, se noticiava a existências de milhares de casos de baixa médica que não resistiram a uma acção de fiscalização, trata-se da cultura instalada e da relação ética com o trabalho, trata-se do "porreirismo" e, finalmente, da impunidade e bonomia laxista com que tudo isto é encarado.
Por outro lado, apesar da dificuldade dos clínicos na avaliação de sintomas eventualmente impeditivos de trabalho, também todos conhecemos casos, muitos casos, de baixa consciência deontológica, para ser simpático, de médicos que de forma leviana assinam baixas médicas com a maior das facilidades. Em muitos locais se conhecem uns "doutores" a quem recorrer para arranjar um "atestadinho".
Eu ainda gostava de viver num tempo em que a proposta da Ordem do Médicos no sentido do cidadão avaliar as suas próprias condições para trabalhar, fosse a regra e aceite sem desconfiança. No entanto, como já disse, a realidade não é a projecção dos meus desejos.
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