sexta-feira, 7 de junho de 2019

RANKINGS ESCOLARES REVISTOS EM BAIXA


Talvez porque estejamos à porta de nova época de exames a que, evidentemente se seguirá a divulgação de um produto sazonal que dá pelo nome de “rankings escolares”, o DN retoma uma notícia de Outubro de 2018 que também na altura tive oportunidade de aqui referir e me parece merecer discussão alargada mas, certamente, inconclusiva dada a sua natureza.
Em Singapura terá sido decidido abolir a partir do próximo ano lectivo a construção e divulgação de rankings escolares com base nos resultados em exames bem como não divulgar outras informações de natureza comparativa sobre o desempenho escolar dos alunos.
A decisão, de acordo como o Ministro da Educação, Ong Ye Kung, assenta no princípio a promover junto dos alunos e famílias que “aprender não é uma competição”. Aliás, será interessante considerar toda a argumentação e sustentação da medida. A decisão é ainda mais surpreendente considerando a posição cimeira habitualmente ocupada por Singapura nos estudos comparativos internacionais e na sua habitual defesa destes dispositivos.
Como escrevi na altura, esta decisão merece umas notas.
Apesar de continuar com dificuldade em defender a sua bondade não tenho uma atitude fundamentalista face à sua construção, sobretudo considerando a evolução que se tem verificado nos últimos anos, quer na disponibilização de informação por parte do ME para além dos “meros” resultados da avaliação externa, quer na forma como essa informação é tratada e divulgada por diferentes entidades.
No entanto, apesar da muita informação revelada, os rankings não revelam, e não revelam, sobretudo, que se fará a seguir com a informação que os rankings mostram (e não mostram). Na verdade, também não mostram o que não se pode medir mas se pode avaliar e que é tão essencial como o que se mede. Dito de outra maneira, mantenho a dúvida expressa por Gil Nata e Tiago Neve do Centro de Investigação e Intervenção Educativas da U. do Porto que num texto no Público no início deste ano questionavam, “Assim, passados 20 anos, a pergunta impõe-se, onde estão as evidências de que a publicação dos rankings tenha contribuído para a melhoria do sistema educativo? “
Sendo um defensor intransigente de uma cultura e prática de exigência, avaliação e qualidade, parece-me bem mais importante o aprofundamento dos mecanismos de autonomia e responsabilização com a existência em todos os agrupamentos ou escolas de Observatórios de Qualidade (muitas têm) que integrem também elementos exteriores à escola. Existem capacidade técnica e recursos suficientes. O trabalho realizado por esses Observatórios, este sim, deveria ser divulgado e discutido em cada comunidade e passível de leituras cruzadas com dados nacionais.
Ainda a propósito e como aqui já tenho citado, Gert Biesta da Universidade Stirling numa obra notável, "Good Education in a Age of Measurement - Ethics, Politics, Democracy", afirma que uma obsessão centrada na medida, assenta na gestão continuada de uma dúvida, "medimos o que valorizamos ou valorizamos o que medimos?". No mesmo sentido e numa entrevista ao Público em 2011, o Professor Biesta afirmava sugestivamente, “Os rankings são muito antiquados e não devem ter lugar numa sociedade civilizada". Aliás, nesta altura assisti a uma sua notável conferência sobre a questão da medida e da avaliação em educação.
Uma pequena curiosidade ainda relativa a Singapura. Em 2014 o Expresso dedicou um trabalho a alguns países asiáticos que habitualmente ocupam lugares cimeiros nos estudos comparativos internacionais. Foram referidas as experiências de famílias portuguesas com filhos nesses sistemas educativos. Uma mãe referiu que em Singapura uma das primeiras coisas que mais a impressionou foi a dimensão das filas de crianças à porta dos centros de explicações ao fim de semana, "parecem formigas", "No 6º ano os alunos são submetidos a um exame nacional, Só os mais bem classificados acedem às escolas secundárias de elite, a que todos aspiram". Uma outra mãe portuguesa também em Singapura afirmou "Há a assumpção de que todos têm de ser bem-sucedidos. Quem tem mais dificuldade é posto de parte. Estão a surgir cada vez mais casos de depressão entre as crianças".
Como escrevi na altura, não quero esta escola e esta educação para os meus netos e para todos os outros miúdos.
Pode ser que a decisão agora tomada mostre ser possível que a imprescindibilidade de avaliar e medir em educação não tem que a transformar numa competição exacerbada e promotora de mal-estar.

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