Nos últimos dias encontrámos na
imprensa dois textos de opinião centrados nas provas de aferição. No Observador, Alexandre Homem Cristo designou-as como “A pior decisão do Governo na Educação”
numa terminologia que não estranho dada a linha editorial e no Público, Paulo Guinote
escreveu sobre “A aferição inútil”.
Qualquer dos textos merece
reflexão, aliás, colocam questões comuns e em linha como o que aqui tenho
escrito sobre as provas de aferição desde que que foi conhecido o actual
modelo. A reintrodução das provas de aferição, desenvolveu-se com vicissitudes
dispensáveis e com um modelo e conteúdos que me levantaram e levantam alguma reserva embora
considere genericamente que as provas de aferição são uma opção correcta, designadamente no 1º e 2º ciclo.
Não sou defensor de mudanças
sucessivas, muitas vezes … só por mudar, sem avaliação que sustente a mudança e
sem rumo que a oriente mas acho que vale a pena ir reflectindo nesta matéria a partir da
experiência que já se acumulou. Neste sentido algumas notas.
A realização de exames finais, sobretudo
nos anos iniciais da escolaridade, mais do que ser uma ferramenta de
aprendizagem, que não o é, cumpre uma função imprescindível em qualquer sistema
educativo, a avaliação externa.
Neste sentido, retirar os exames finais do 4º e do 6º ano, sendo uma medida que me parece adequada, sobretudo no 4º,
obrigaria a criar dispositivos externos de regulação que nos dessem “retratos” robustos e comparáveis dos trajectos escolares.
Seria esta a função da
reintrodução das provas de aferição. Só que o modelo decidido não cumpre esta
função, não parece, de facto, uma avaliação de aferição. Dado que ainda não foi
alterada, a Lei de Bases do Sistema Educativo define que o ensino básico se
organiza numa lógica de ciclo e não de disciplina como o secundário.
Assim, uma avaliação externa de
aferição teria de ser realizada no ano final de cada ciclo e não nos anos
intermédios, 2º, 5º e 8º ano, os alunos estão a meio do seu caminho de um
ciclo.
A argumentação foi de que,
realizadas nestes anos, a identificação de dificuldades e a devolução de
resultados permitiriam a correcção de trajectórias futuras dos alunos. Certo,
neste caso a avaliação não é de aferição mas de diagnóstico. No entanto,
espera-se que diariamente nas salas de aula os professores realizem, mais formal
ou mais informalmente, avaliações desta natureza, mais formativa, pois é a mais
sólida ferramenta que possuem de regulação do trabalho dos alunos e do seu próprio
trabalho.
Acresce que, como referem AHC e
PG a rotação em cada ano das disciplinas envolvidas nas provas não permite
estabelecer de forma sólida dados comparativos que permitam perceber eventuais
ajustamentos na trajectória dos alunos.
A função de verdadeira aferição,
regulação externa, com este modelo fica ainda mais comprometido se
considerarmos que com a recente Portaria 181/2019 as escolas terão, do meu
ponto de vista bem, a possibilidade de gestão autónoma (ainda que dependa de
aprovação do ME claro, sabe-se lá o que poderiam fazer com a “autonomia”) de
uma fatia do currículo superior aos 25% do projecto de flexibilização
experimentado.
Neste quadro, parece-me, tal como
sustentam AHC e PG, que dificilmente o actual modelo de provas de aferição cumprirá
a sua imprescindível função de avaliação externa.
Como não quero acreditar que seja
esse o objectivo julgo que com tempo, sem sobressaltos, com envolvimento de
professores e escolas, com uma avaliação, também externa, deste modelo,
deveríamos ir equacionando o seu ajustamento.
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