De acordo com dados ainda não
definitivos divulgados pelo ME, apesar do ligeiro aumento de alunos inscritos
para os exames nacionais do secundário voltou a baixar, ainda que ligeiramente
o número de estudantes que refere a intenção de frequentar o ensino superior,
54%.
Esperemos que a situação se possa
reverter pois creio que apesar de existir, felizmente, oferta formativa para
além do ensino superior, se venha a verificar o abandono precoce de um percurso
de qualificação com os riscos associados de exclusão e pobreza sobretudo em
sociedades mais desenvolvidas e, portanto, mais exigentes na qualificação dos
cidadãos.
A abordagem às razões para este
cenário de preocupante desinvestimento na formação superior, politécnica ou
universitária, remete quase sempre para as dificuldades económicas das
famílias.
Dados disponíveis têm sustentado
este entendimento mas, do meu ponto de vista, há ainda que considerar os
eventuais efeitos de um discurso recorrentemente difundido de que, dada a elevada
taxa de desemprego de jovens com qualificação superior, o investimento numa
qualificação superior não compensa pois não existe mercado de trabalho, o
emprego que surge é precário e mal pago.
Por partes. Na verdade, Portugal,
conforme alguns estudos demonstram, tem comparativamente a muitos outros países
da Europa, um dos mais altos custos para as famílias a situação de um filho a
estudar no ensino superior, ou seja, as famílias portuguesas fazem um esforço
bem maior, em termos de orçamento familiar, para que os seus filhos acedam a
formação superior. Se considerarmos a frequência de ensino superior privado o
esforço é ainda maior. Tem vindo a ser regularmente noticiada a desistência da
frequência dos cursos por muitos alunos que, por si, ou os respectivos
agregados familiares não suportam os encargos com o estudo.
Estas dificuldades são, do meu
ponto de vista, considerados frequentemente de forma ligeira ou mesmo
desvalorizadas. Tal entendimento parece assentar na ideia de que a formação de
nível superior é um luxo, um bem supérfluo pelo que ... quem não tem dinheiro
não tem vícios.
Neste contexto, o abaixamento na
intenção de prosseguir estudos superiores pode estar associado às dificuldades
enormes que muitas famílias atravessam e o desemprego mais elevado entre os
jovens, que poderia constituir uma pressão para continuar os estudos a que
acresce a redução significativa das bolsas e apoios, tornam ainda mais difícil
a realização de percursos escolares que promovam mobilidade social e que se
traduz, por exemplo, no aumento das desistências ou mesmo na intenção e disponibilidade
para estudar.
Relativamente aos discursos sobre
“estudar não compensa”, umas notas repescadas.
Não esqueço o altíssimo e
inaceitável nível de desemprego entre os jovens, em particular entre os jovens
com qualificação superior, mas esta questão decorre do baixo nível de
desenvolvimento do nosso mercado de trabalho, de circunstâncias conjunturais e
de erradas políticas de emprego e não da sua qualificação.
Neste cenário e como sempre
afirmo, o discurso muitas vezes produzido no sentido de que "não adianta
estudar" não colhe e não tem sustentação sendo, um autêntico tiro no pé de
uma sociedade pouco qualificada como a nossa que, efectivamente e
contrariamente à tão afirmada quanto errada ideia de que somos um país de
doutores, continua, em termos europeus, com uma das mais baixas taxas de
qualificação superior em todas as faixas etárias incluindo as mais jovens.
Aliás, estamos longe de poder vir a cumprir a meta a que nos comprometemos com
a UE para 2020, 40% de pessoas licenciadas entre os 30 e os 34 anos.
Conseguir níveis de qualificação
compensa sempre e é imprescindível.
O que acontece verdadeiramente é
termos desenvolvimento a menos, não é qualificação a mais, temos um mercado de
trabalho que a cegueira da austeridade e do empobrecimento proletarizou e
precarizou e que não absorve a mão-de-obra qualificada. Não podemos passar a
mensagem de que a qualificação não é uma mais-valia.
É um tiro no pé.
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