Voltando ao recentemente
publicado pela OCDE, “
TALIS 2018 Results (Volume I) Teachers and School Leaders as Lifelong Learners”, em Portugal e de acordo com as respostas dos docentes
inquiridos, o tempo gasto em sala de aula no controle do
comportamento dos alunos é superior à média da OCDE. Nas nossas salas de aula, 73.5% do tempo é
usado em actividades de ensino e aprendizagem e na OCDE a média é de 78.1% sendo
o tempo restante dedicado a questões de burocracia, controle de assiduidade e,
sobretudo ao comportamento.
Recordo que o comportamento dos
alunos em sala de aula é também um dos factores fortemente associados aos
níveis de cansaço e risco de exaustão verificados na classe docente e potenciados
pela elevada média de idades.
Algumas notas sobre o
comportamento dos alunos em sala de aula, designadamente, as situações de
indisciplina que tanto solicitam a intervenção dos docentes com impacto nas
actividades de ensino e aprendizagem.
Em primeiro lugar julgo que
importa clarificar o que está em causa. Quebrar as regras de funcionamento da
sala de aula ou da escola serão indisciplina, insultar, humilhar, confrontar
fisicamente um professor, comportamentos frequentes de agressão ou roubos a
colegas configuram pré-delinquência ou delinquência e comportamentos
disruptivos podem ainda estar ligados a perturbações de natureza psicológica.
A escola, os professores, não
pode ser responsabilizada e considerada competente por e para todo este
universo de problemas nos comportamentos dos mais novos. Para situações de
pré-delinquência ou perturbações do comportamento pode, evidentemente, dar
contributos mas não assumir a responsabilidade pelo que importa clarificar a análise.
Centremo-nos então na
indisciplina escolar que considero matéria de competência da escola e matéria
de responsabilidade de toda a comunidade, incluindo obviamente os pais.
Ainda no 1º ciclo e de uma forma
geral as crianças têm um entendimento ajustado sobre comportamentos adequados
em sala de aula que, naturalmente, com a idade se torna mais sólido. Assim
sendo e numa abordagem simples, sabendo as crianças e adolescentes quais os
comportamentos adequados por que razão ou razões não os assumem de forma
consistente? Não estou a falar de alunos “certinhos”, testar regras e limites
faz parte do desenvolvimento, mas de comportamentos que de uma forma continuada
e excessiva perturbam o funcionamento das aulas.
A este cenário e para além do que
se passa em matéria de educação familiar em matéria de promoção da auto-regulação
dos comportamentos parece-me importante referir que
todas as figuras sociais a que se
colam traços de autoridade por exemplo, pais, professores, médicos, polícias,
idosos, etc., viram alterada a representação social sobre esses traços. Dito de
outra maneira, o facto de ser velho, polícia, professor ou médico, já não
basta, só por si, para inibir comportamentos de desrespeito pelo que importa
perceber o impacto destas alterações nas relações entre professores e alunos.
As mudanças significativas no
quadro de valores e nos comportamentos criam dimensões novas em torno de um
problema velho, a indisciplina. Daqui decorre, por exemplo, que restaurar a
autoridade dos professores, tal como era percebida há décadas, é uma
impossibilidade porque os tempos mudaram e não voltam para trás. Pela mesma
razão, não se fala em restaurar a relação pais – filhos nos termos em que se
processava antigamente e falar da "responsabilização" dos pais é
interessante, mas é outro nada.
Um professor, de qualquer ciclo ou nível de ensino, ganha tanta mais
autoridade quanto mais competente, apoiado e valorizado se sentir. Os dispositivos de apoio suficientes e competentes ao trabalho de professores e alunos constituem uma variável central no que respeita à indisciplina mas não só à
indisciplina.
Também por isto se questiona a
constituição de mega-agrupamentos e de escolas e turmas com dimensões
excessivas, variável associada à indisciplina escolar.
É também importante reajustar a
formação de professores. As escolas de formação de professores não podem
“ensinar” só o que sabem ensinar, mas o que é necessário ser aprendido pelos
novos professores e pelos professores em serviço. Problemas "novos"
carecem também de abordagens "novas".
Parece também importante a
existência de estruturas de mediação entre a escola e a família o que implica a
existência de recursos humanos qualificados e disponíveis. Veja-se o trabalho
dos GAAF apoiados pelo IAC, experiências no âmbito da intervenção da Associação
EPIS ou iniciativas que algumas escolas conseguem desenvolver e que permitam
apoiar os pais dos miúdos maus que querem ter miúdos bons e identificar as
situações para as quais, a comprovada negligência dos pais exigirá outras
medidas que envolvam, eficazmente e em tempo oportuno as CPCJ.
Um caminho de autonomia, com a
alteração desejável dos modelos de organização e funcionamento das escolas e na
gestão curricular, deve permitir que as escolas, algumas escolas, mais
problemáticas, estando ou não integradas em TEIP tivessem menos alunos por
turma, mais assistentes operacionais com formação em mediação e gestão de
conflitos, mais técnicos ou ainda que se utilizassem mais professores em dispositivos
de apoio a alunos em dificuldades. As dificuldades dos alunos estão com muita frequência na base do absentismo e da indisciplina, os alunos com sucesso, em princípio, não faltam e não apresentam grandes problemas de indisciplina. A recente publicação da Portaria 181/2019
traz alguma mudança mas veremos que impacto terá ao nível dos recursos
disponíveis.
Parece-me de acentuar que os
estudos sugerem com clareza a existência de impacto positivo do menor número de
alunos por turma no clima e comunicação na sala de aula, na maior facilidade de
práticas educativas mais diferenciadas, no comportamento dos alunos, etc., o
que, evidentemente deve ser considerado.
Dispositivos assentes em tutorias
que envolvam os alunos mais problemáticos parecem um bom contributo desde que
realizadas com tempo, recursos e formação ajustados.
Por outro lado, os estudos e as
boas práticas mostram que a presença simultânea de dois professores é um
excelente contributo para o sucesso na aprendizagem e para a minimização de
problemas de comportamento bem como se conhece o efeito do apoio precoce às
dificuldades dos alunos também na prevenção da indisciplina.
As dificuldades dos alunos estão
com muita frequência na base do absentismo e da indisciplina, os alunos com
sucesso, em princípio, não faltam e não apresentam grandes problemas de
indisciplina.
Os professores também sabem que
na maior parte das vezes, os alunos indisciplinados não mudam os seus
comportamentos por mais suspensões que sofram. É evidente que importa admitir
sanções, no entanto, fazer assentar o combate à indisciplina nos castigos aos
alunos e, eventualmente, nas multas e retirada de apoios aos pais, é ineficaz,
é facilitista na medida em que é a medida mais fácil e mais barata, é
demagógica porque vai ao encontro dos discursos populistas que aplaudem a ideia
do "prender" do "expulsar" até ficarem só os nossos filhos.
O problema é quando também nos
toca a nós, aí clamamos por apoios.
Os discursos demagógicos e
populistas, ainda que bem-intencionados, não são um bom serviço à minimização
dos muito frequentes incidentes de indisciplina que minam a qualidade cívica da
nossa vida além, naturalmente, da qualidade e sucesso do trabalho educativo de
alunos, professores e pais.