No Expresso encontrei um trabalho
em que sem surpresa se enfatiza a importância da existência de algum tempo de
brincadeira e interacção na relação entre pais e filhos, Os impactos positivos são
múltiplos e com alguma frequência aqui tenho abordado a questão.
Um trabalho de 2016 que não
consigo localizar sugeria que a maioria dos pais portugueses de crianças entre
os seis e os doze anos que foram inquiridos assumia não ter o tempo que
gostaria para brincar com os filhos sendo que 83.2% referia como actividade
mais comum “ver televisão em conjunto”.
O pouco tempo disponível para
brincar com os filhos era atribuído às condicionantes profissionais e aos
horários escolares. Importa ainda referir que 81% das crianças consideradas
frequentam actividades extracurriculares.
Estes dados vêm ao encontro dos
indicadores encontrados noutros trabalhos.
Os problemas de tempo dos pais
decorrentes dos constrangimentos profissionais criam dificuldades aos pais na
guarda das crianças fora do horário escolar e a solução tem sido a prolongar a
estadia dos filhos na escola, já é Escola Tempo Inteiro. Para além desta
estadia na escola que pode chegar às 11 horas diária verifica-se também, para
quem pode, o recurso às actividades extracurriculares que com uma oferta
altamente diversificada são também uma forma de “ocupar” as crianças.
Esta situação não é uma
fatalidade, podem procurar-se outras soluções e promover ajustamentos na
organização do trabalho, diversificação de horários, "homeworking", etc., de
modo a criar outras disponibilidades nas famílias.
No entanto, este cenário não determina
que o pouco tempo disponível seja usado para ver televisão. Nesta matéria seria
desejável que com os pais e se discutissem outras hipóteses que não são mais
onerosas nem mais trabalhosas mas que alargariam o leque de actividades.
Finalmente, acharia interessante
que se ouvissem os miúdos relativamente ao seu entendimento sobre as
brincadeiras que realizam com os pais, as que gostariam de realizar, o que
tempo em que o fazem e o tempo em que gostariam de fazer.
Talvez as respostas nos ajudassem
a perceber o que está por fazer.
Fora deste estudo ainda estão as
crianças noutras idades também vivem sem tempo para brincar com os pais porque o tempo não
chega ou porque estes não têm disponibilidade física ou vontade para tal.
Muitas destas crianças fecham-se num ecrã, sós ou acompanhadas de outras tão
“sós” quanto elas.
Podemos e devemos fazer melhor.
Defendo há muito a pertinência
de, em sede de Concertação Social, avançar com propostas de alteração
legislativa, sobretudo, na organização horária do trabalho que poderia, essa
sim, ter impacto na disponibilidade dos pais. Não me parece impossível que em
muitas profissões os tempos de trabalho pudessem ter outra distribuição
permitindo mais tempo com os filhos e menos tempo destes na escola.
Ainda a propósito da dificuldade
de conciliar trabalho e vida pessoal deixo uma estória que já aqui tinha
poisado.
Bom dia, venho apresentar uma queixa.
Com certeza, contra quem?
Contra muita gente.
Será, portanto, contra incertos. E apresenta queixa porquê?
Por roubo, roubaram-me tempo.
Muito bem, então roubaram-lhe tempo. Por favor, pode explicar um pouco
melhor para eu poder registar a situação.
Eu já não tinha muito tempo porque nunca fui uma pessoa muito rica de
tempo, mas o pouco que tinha roubaram-me. Fiquei sem tempo para estar com os
meus filhos e brincar com eles. Este tempo faz-me muita falta, os miúdos andam
tristes porque desde que me roubaram o tempo não consigo mesmo. Já não tenho
tempo para descansar ou ler qualquer coisa como gostava de fazer. Não tenho
tempo descansado para a minha mulher que também precisava do tempo que eu tinha
e que partilhava com ela. No meu trabalho não tenho tempo para parar um minuto
sem que alguém venho logo chamar a atenção. Fiquei sem o tempo que tinha para
beber um copo com os meus amigos e trocar umas lérias que serviam para aliviar
das coisas da vida.
Eu percebo o seu problema, mas como deve calcular não tenho tempo para
queixas como as que apresenta.
Não tem tempo? Não me diga que também lhe roubaram o tempo. Até às
autoridades, é demais.
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