O Público de hoje apresenta
várias
peças dedicadas à questão da chamada “educação inclusiva” em particular
aos efeitos da entrada em vigor do
Regime Jurídico da Educação Inclusiva. Algumas
notas que provavelmente vos parecerão amargas mas na verdade é assim que me sinto,
não apenas pelo que li mas por muito do que me vai chegando e vou conhecendo apesar,
como sempre, das boas práticas que também existem.
Em vários textos aqui no Atenta
Inquietude me referi à urgência desde do aparecimento do DL3/2008 de instituir um outro enquadramento normativo para a resposta educativa à diversidade dos
alunos, incluindo alunos com necessidades educativas especiais, sim, alunos com
necessidades educativas especiais.
Acompanhei com esperança e algum
optimismo o processo de construção e discussão pública do actual Decreto-Lei nº
54/2018, o Regime jurídico da Educação Inclusiva.
Em Junho passado, aquando da sua promulgação
pelo PR escrevi:
"Insisto em quero muito que do processo
de alteração resulte mais qualidade nos processos educativos de todos os
alunos, menos exclusão, tantas vezes em nome da … inclusão, mais participação
de todos os alunos nas actividades comuns, mais apoios e de qualidade aos
professores de ensino regular, os actores centrais nos processos educativos de
todos os alunos para além dos pais, a disponibilização de recursos suficientes,
adequados e em tempo oportuno e dispositivos de regulação do trabalho
desenvolvido que minimizem os efeitos em que, perdoem-me o excesso e a
repetição, da dimensão o sistema é verdadeiramente inclusivo, coexistem sem um
sobressalto práticas excelentes com práticas e discursos que atentam contra os
direitos de alunos, famílias e docentes.
O grande risco é que apesar de
uma “nova lei” se mantenha o “velho” quadro que referi acima, escolas,
professores e técnicos a desenvolver trabalhos de qualidade e assentes numa
perspectiva de educação inclusiva e que assim continuarão a tentar fazer, seja
qual for o quadro legal e escolas, professores e técnicos envolvidos em
práticas que, seja qual for o quadro legal, guetizam, excluem, não promovem
direitos, participação, pertença e aprendizagem, os verdadeiros critérios de
educação inclusiva que transformam a “integração” em “entregação”, os alunos
estão “entregados”, não integrados.
Por estas razões parece-me ainda
indispensável a existência de dispositivos de avaliação e regulação que não se
confundam com as competências da Inspecção-Geral da Educação e Ciência."
Como tenho dito não me quero
sentir o Waldorf ou o Statler, os velhos dos Marretas que estão sempre na
crítica mas a verdade é que julgo que só mudar mesmo que num caminho ajustado
não significa … mudar.
Tenho vindo a conhecer por vias diferentes múltiplas situações em que um novo “paradigma”, a eliminação da
categorização, o fim das “necessidades educativas especiais”, educação
inclusiva x.0 têm produzido situações inquietantes de exclusão e sofrimento.
Como tantas vezes tenho dito, nos
últimos anos, na generalidade dos nossos territórios educativos, mesmo em cada
comunidade, tivemos, temos e é o meu receio, teremos, crianças excluídas da
escola, excluídas na escola, crianças integradas na escola e também, felizmente,
crianças incluídas na escola e na comunidade. Aqui sim, como digo, o sistema é
verdadeiramente inclusivo.
Continuo a entender que um melhor
quadro normativo é necessário e uma boa base de trabalho e nesse sentido o
DL54/2018 é mais adequado que o DL3/2008 mas uma boa base de trabalho mas mais
recursos e apoios de qualidade aos professores de ensino regular, os actores
centrais nos processos educativos de todos os alunos para além dos pais, a
disponibilização de recursos suficientes, adequados e em tempo oportuno e
dispositivos de regulação do trabalho desenvolvido são aspectos críticos.
Por outro lado, as alterações em
educação, mesmo quando são justificadas e sugerem alguma urgência exigem que se
considere de forma prudente e competente o seu processo e calendário de
operacionalização.
Estamos todos cansados de
inúmeras “reformas”, “orientações”, “alterações”, “inovações”, “projectos”, etc.
que são postos em prática sem acautelar tanto quanto possível as condições de
sucesso. Isto pode acontecer por excesso de voluntarismo, por incompetência,
por imperativos de agenda ou por qualquer outra razão, como a falta de meios e
recursos para operacionalizar de forma eficaz o que está disposto.
Os resultados podem ser
seriamente comprometedores do sucesso das mudanças e, assim, o que deveria ser
um contributo para a solução gera mais problemas e ruído.
Queria muito que do processo de
alteração resulte mais qualidade nos processos educativos de todos os alunos,
menos exclusão, tantas vezes em nome da … inclusão, mais participação de todos
os alunos nas actividades comuns, mais apoios e de qualidade aos professores de
ensino regular, os actores centrais nos processos educativos de todos os alunos
para além dos pais, a disponibilização de recursos suficientes, adequados e em
tempo oportuno e dispositivos de regulação do trabalho desenvolvido que
minimizem os efeitos em que, perdoem-me a repetição, o sistema é
verdadeiramente inclusivo, coexistem sem um sobressalto práticas excelentes com
práticas e discursos que atentam contra os direitos de alunos, famílias e docentes.
Tenho afirmado que o grande risco
é que apesar de uma “nova lei” se mantenha o “velho” quadro que referi acima,
escolas, professores e técnicos a desenvolver trabalhos de qualidade e assentes
numa perspectiva de educação inclusiva e que assim continuarão a tentar fazer,
seja qual for o quadro legal e escolas, professores e técnicos perdidos na
mudança de paradigma, perdidos nas orientações e na inadequação dos recursos, nas
medidas voluntaristas que quase parecem querer “normalizar” e “incluir” alunos,
“entregando-os” nas salas de ensino regular, remetendo-os para "espaços outros" (agora já não se chamam "unidades") ou mesmo aconselhando a sua permanência em casa provocando exclusão e sofrimento,
incumprimento de direitos, desespero nas famílias e também em professores e
técnicos.
As peças do Público contribuem
para ilustrar este cenário que, de certa forma antecipei sem que disso me
orgulhe, antes pelo contrário, sinto uma enorme amargura.