A questão dos manuais escolares
reentra regularmente na agenda em particular no início de cada ano lectivo. Ora se
refere o preço dos manuais e materiais que os acompanham apesar da extensão da
gratuitidade, ora se fala de sobressaltos e atrasos no acesso aos materiais por
parte de alunos e famílias envolvendo a distribuição dos "vouchers" ou o próprio
circuito de distribuição dos manuais, ora se fala da insuficiência da
pretendida reutilização dos manuais por parte das escolas, muitas vezes por
opção das famílias e também pela própria natureza dos manuais e da sua
utilização que inibem a reutilização.
Não estando em causa a evidente pertinência
destas questões seria desejável, do meu ponto de vista, o alargamento da reflexão sobre o próprio recurso
aos manuais. Como regularmente tenho afirmado e insisto, o nosso ensino parece
ainda manter-se excessivamente "manualizado" o que tem óbvias
implicações didáctico-pedagógicas e, naturalmente, económicas pelo peso nos
orçamentos familiares.
Apesar da progressiva
disponibilização de outras fontes de informação e do acréscimo de
acessibilidade através das tecnologias de informação e de outros suportes, a
utilização dessas fontes alternativas aos manuais é baixa e pouco valorizada
por pais e alunos. De facto, embora o abandono do “livro único” tenha ocorrido
há já bastante tempo e de uma preocupação, ainda pouco eficaz, com a qualidade
dos manuais, predomina a sua utilização e das respectivas fichas e instrumentos
como materiais de apoio às aprendizagens e à “ensinagem” e que agravam
substantivamente os custos das famílias.
Para além de imenso material de
outra natureza, temos em cada área programática ou disciplina uma enorme gama
de cadernos de fichas, cadernos de exercícios, cadernos de actividades, materiais
de exploração, etc. etc. que submergem os alunos e oneram as bolsas familiares,
até porque muitos destes materiais não são incluídos nos apoios sociais
escolares.
Em muitas salas de aula, dada a
natureza da estrutura e conteúdos curriculares, corre-se o risco de substituir
a “ensinagem”, o acto de ensinar, pela “manualização” ou “cadernização” do
trabalho dos alunos, ou seja, a acção do professor será, sobretudo, orientar o
preenchimento dos diferentes dispositivos que os alunos carregam nas mochilas.
É verdade que a minimização da
dependência dos manuais envolve um conjunto de variáveis que devem ser
consideradas.
Passará por uma reorganização e
flexibilização curricular, diminuindo a extensão de algumas conteúdos, por
exemplo, o que permita a alunos e professores um trabalho de pesquisa e
construção de conhecimentos com base noutras fontes potenciando, por exemplo, a
acessibilidade que as novas tecnologias oferecem.
Passará pelo ajustamento no
número de alunos por turma de modo a permitir melhores níveis de diferenciação
pedagógica e, assim, acomodar outros suportes ao processo de ensino e
aprendizagem.
Passará ainda por maior autonomia
de escolas e professores e recursos que acomodem dispositivos de apoio,
tutorias por exemplo, que diversifiquem e diferenciam as formas e materiais de
trabalho bem como respondam mais eficazmente à diversidade entre os alunos.
Creio que seria importante
caminharmos no sentido de atenuar a fórmula instalada que de forma simplista se
pode enunciar, o manual formata operacionalmente o currículo, o professor
ensina com base no manual o que o aluno aprende através do manual que o pai
acha muito importante porque tem tudo o que professor ensina.
É possível caminhar numa perspectiva
de “desmanualização” do nosso trabalho escolar, existem já experiências em diferentes escolas e agrupamentos, da rede pública e privada, que
sustenta a sua possibilidade.
Não esqueço, no entanto, o peso
das decisões em matéria de política educativa bem como o peso económico deste
mercado.
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