sábado, 29 de setembro de 2018

DA EDUCAÇÃO INCLUSIVA


O Público de hoje apresenta várias peças dedicadas à questão da chamada “educação inclusiva” em particular aos efeitos da entrada em vigor do Regime Jurídico da Educação Inclusiva. Algumas notas que provavelmente vos parecerão amargas mas na verdade é assim que me sinto, não apenas pelo que li mas por muito do que me vai chegando e vou conhecendo apesar, como sempre, das boas práticas que também existem.
Em vários textos aqui no Atenta Inquietude me referi à urgência desde do aparecimento do DL3/2008 de instituir um outro enquadramento normativo para a resposta educativa à diversidade dos alunos, incluindo alunos com necessidades educativas especiais, sim, alunos com necessidades educativas especiais.
Acompanhei com esperança e algum optimismo o processo de construção e discussão pública do actual Decreto-Lei nº 54/2018, o Regime jurídico da Educação Inclusiva.
Em Junho passado, aquando da sua promulgação pelo PR escrevi:
"Insisto em quero muito que do processo de alteração resulte mais qualidade nos processos educativos de todos os alunos, menos exclusão, tantas vezes em nome da … inclusão, mais participação de todos os alunos nas actividades comuns, mais apoios e de qualidade aos professores de ensino regular, os actores centrais nos processos educativos de todos os alunos para além dos pais, a disponibilização de recursos suficientes, adequados e em tempo oportuno e dispositivos de regulação do trabalho desenvolvido que minimizem os efeitos em que, perdoem-me o excesso e a repetição, da dimensão o sistema é verdadeiramente inclusivo, coexistem sem um sobressalto práticas excelentes com práticas e discursos que atentam contra os direitos de alunos, famílias e docentes.
O grande risco é que apesar de uma “nova lei” se mantenha o “velho” quadro que referi acima, escolas, professores e técnicos a desenvolver trabalhos de qualidade e assentes numa perspectiva de educação inclusiva e que assim continuarão a tentar fazer, seja qual for o quadro legal e escolas, professores e técnicos envolvidos em práticas que, seja qual for o quadro legal, guetizam, excluem, não promovem direitos, participação, pertença e aprendizagem, os verdadeiros critérios de educação inclusiva que transformam a “integração” em “entregação”, os alunos estão “entregados”, não integrados.
Por estas razões parece-me ainda indispensável a existência de dispositivos de avaliação e regulação que não se confundam com as competências da Inspecção-Geral da Educação e Ciência."
Como tenho dito não me quero sentir o Waldorf ou o Statler, os velhos dos Marretas que estão sempre na crítica mas a verdade é que julgo que só mudar mesmo que num caminho ajustado não significa … mudar.
Tenho vindo a conhecer por vias diferentes múltiplas situações em que um novo “paradigma”, a eliminação da categorização, o fim das “necessidades educativas especiais”, educação inclusiva x.0 têm produzido situações inquietantes de exclusão e sofrimento.
Como tantas vezes tenho dito, nos últimos anos, na generalidade dos nossos territórios educativos, mesmo em cada comunidade, tivemos, temos e é o meu receio, teremos, crianças excluídas da escola, excluídas na escola, crianças integradas na escola e também, felizmente, crianças incluídas na escola e na comunidade. Aqui sim, como digo, o sistema é verdadeiramente inclusivo.
Continuo a entender que um melhor quadro normativo é necessário e uma boa base de trabalho e nesse sentido o DL54/2018 é mais adequado que o DL3/2008 mas uma boa base de trabalho mas mais recursos e apoios de qualidade aos professores de ensino regular, os actores centrais nos processos educativos de todos os alunos para além dos pais, a disponibilização de recursos suficientes, adequados e em tempo oportuno e dispositivos de regulação do trabalho desenvolvido são aspectos críticos.
Por outro lado, as alterações em educação, mesmo quando são justificadas e sugerem alguma urgência exigem que se considere de forma prudente e competente o seu processo e calendário de operacionalização.
Estamos todos cansados de inúmeras “reformas”, “orientações”, “alterações”, “inovações”, “projectos”, etc. que são postos em prática sem acautelar tanto quanto possível as condições de sucesso. Isto pode acontecer por excesso de voluntarismo, por incompetência, por imperativos de agenda ou por qualquer outra razão, como a falta de meios e recursos para operacionalizar de forma eficaz o que está disposto.
Os resultados podem ser seriamente comprometedores do sucesso das mudanças e, assim, o que deveria ser um contributo para a solução gera mais problemas e ruído.
Queria muito que do processo de alteração resulte mais qualidade nos processos educativos de todos os alunos, menos exclusão, tantas vezes em nome da … inclusão, mais participação de todos os alunos nas actividades comuns, mais apoios e de qualidade aos professores de ensino regular, os actores centrais nos processos educativos de todos os alunos para além dos pais, a disponibilização de recursos suficientes, adequados e em tempo oportuno e dispositivos de regulação do trabalho desenvolvido que minimizem os efeitos em que, perdoem-me a repetição, o sistema é verdadeiramente inclusivo, coexistem sem um sobressalto práticas excelentes com práticas e discursos que atentam contra os direitos de alunos, famílias e docentes.
Tenho afirmado que o grande risco é que apesar de uma “nova lei” se mantenha o “velho” quadro que referi acima, escolas, professores e técnicos a desenvolver trabalhos de qualidade e assentes numa perspectiva de educação inclusiva e que assim continuarão a tentar fazer, seja qual for o quadro legal e escolas, professores e técnicos perdidos na mudança de paradigma, perdidos nas orientações e na inadequação dos recursos, nas medidas voluntaristas que quase parecem querer “normalizar” e “incluir” alunos, “entregando-os” nas salas de ensino regular, remetendo-os para "espaços outros" (agora já não se chamam "unidades") ou mesmo aconselhando a sua permanência em casa  provocando exclusão e sofrimento, incumprimento de direitos, desespero nas famílias e também em professores e técnicos.
As peças do Público contribuem para ilustrar este cenário que, de certa forma antecipei sem que disso me orgulhe, antes pelo contrário, sinto uma enorme amargura.

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