terça-feira, 30 de janeiro de 2018

A INDÚSTRIA DO SUCESSO

O Público refere um trabalho desenvolvido na Universidade de Aveiro aborda uma realidade conhecida a relação entre o peso colocado na avaliação externa, os exames, e o recurso das famílias a ajudas exteriores à escola que dadas as disparidades sociais são uma basse assimetria social.
Do recente Relatório do CNE, "Estado da Educação 2016", consta um dado, extraído aliás do TIMSS de 2015, algo que habitualmente é muito discretamente referido, as ajudas fora da escola, antes conhecidas por “explicações” e agora com designações mais sofisticadas como “Centro de Estudos”, “Ginásios”, etc., que, provavelmente, terão mais efeito “catch” no sentido de atingir o “target”.
Na página 33 lê-se que 61% dos estudantes do secundário referem ter aulas particulares de Matemática no sentido de melhorar o desempenho nos exames. A comparação com outros países é elucidativa tanto mais se considerarmos o respectivo nível de vida, sendo a Noruega um exemplo extremo.
Algumas notas.
De facto um passeio pelas proximidades das escolas mostra a abundância da oferta destes “Centros de Estado” a que se soma a oferta mais personalizada, as “explicações” em casa dos explicadores. O mercado está sempre atento.
Desde o início do ano lectivo mas sobretudo a partir das férias da Páscoa é frequente há já muito tempo o recurso significativo aos centros de explicações visando a “recuperação” para o terceiro período e, sobretudo, a preparação para os exames.
Face à reversão, como agora se diz, na realização de exames do 1º e 2º ciclo e a reintrodução das provas de aferição ter-se-á verificado já um abaixamento da procura deste tipo de apoios mas que ainda assim e apesar das dificuldades das famílias se mantém em alta.
Apesar de nada ter contra a iniciativa privada desde que regulada e com enquadramento legal, várias vezes tenho insistido no sentido de entender como desejável que os apoios e ajudas de que os alunos necessitam fossem encontrados dentro das escolas e agrupamentos. O impacto no sucesso dos alunos minimizaria, certamente, eventuais custos em recursos que, aliás, em alguns casos já existem dentro do sistema.
Esta minha posição radica no entendimento de que a procura “externa” de apoios, legítima por parte das famílias, tem também como efeito o alimentar da desigualdade de oportunidades e da falta de equidade.
Recordo estudos recentes do CNE e da Fundação Francisco Manuel dos Santos que evidenciam algo de muito significativo apesar de bem conhecido e reconhecido, nove em cada dez alunos com insucesso escolar são de famílias pobres.
A ajuda externa ao estudo como ferramenta promotora do sucesso não está ao alcance de todas as famílias pelo que é fundamental que as escolas possam dispor dos dispositivos de apoio suficientes e qualificados para que se possa garantir, tanto quanto possível, a equidade de oportunidades e a protecção dos direitos dos miúdos, de todos os miúdos.
A substituição dos exames pelas provas de aferição não altera esta necessidade imperiosa, antes pelo contrário, torna-a ainda mais pertinente para que se possam corrigir e apoiar ao longo dos vários ciclos as dificuldades de alunos e professores.
O abaixamento verificado na procura que alguma imprensa divulga talvez traduza a menor importância atribuída pelas famílias às provas de aferição e às suas próprias dificuldades económicas.
As necessidades dos alunos poderiam ser atenuadas com o recurso a professores que já estão no quadro ou com contratos sucessivos. Também por estas razões a narrativa dos professores a mais é ... isso mesmo, uma narrativa.
De uma vez por todas, é necessário contenção e combate ao desperdício, mas em educação não há despesa há investimento.

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