domingo, 28 de janeiro de 2018

OS CONSUMOS POR PARTE DE CRIANÇAS E ADOLESCENTES

No Observador encontra-se um trabalho muito interessante sobre um programa que está ser bem-sucedido desenvolvido pela Islândia no combate ao consumo de álcool e drogas por parte de crianças e adolescentes.
Talvez fosse desejável que olhássemos para o que está ser feito e de uma forma adaptada, naturalmente, tentássemos ser mais eficientes ao lidar com uma questão que também em Portugal é um problema sério, o consumo de álcool e não só por parte dos mais novos.
No que respeita ao álcool que ”beneficia” de uma representação social mais amigável sobre o seu consumo mais amigável sabe-se que este tem vindo a crescer alterando-se também os padrões de consumo, beber na rua (é bastante mais barato) e o consumo excessivo e rápido (binge drinking) são duas características presentes. Segundo alguns especialistas, a embriaguez parece deixar de ser uma consequência do consumo excessivo para passar a ser um objectivo em si mesmo. Este padrão tem vindo a ser sublinhado por diferentes estudos sobre os hábitos dos adolescentes e jovens portugueses, cerca de 80% dos jovens com 15 anos consomem álcool segundo um trabalho da Unidade de Alcoologia de Coimbra do IDT e em 2007 56% dos jovens com 16 anos inquiridos referiram este tipo de consumos enquanto em 2003 o indicador era de 25%.
No mesmo sentido um estudo de 2015 do Serviço de Intervenção nos Comportamentos Aditivos e nas Dependências mostrou que 31% dos alunos com 13 anos já experimentaram álcool, especialmente cervejas e misturas. Algumas notas.
Uma primeiro aspecto a considerar é o facto de os adolescentes poderem facilmente comprar cerveja e outras bebidas, as “litrosas” ou os shots, como lhes chamam, no comércio mais habitual, lojas de conveniência ou pequenos estabelecimentos de bairro, a um preço bem mais acessível que nos estabelecimentos que frequentam na noite e recorrendo à “toma” simples ou com misturas ao longo da noite, comprida aliás. A presente legislação restringe o comércio e estabelece multas bem mais pesadas mas veremos o efeito prático pois em diferentes domínios a restrição devido à idade nem sempre é respeitada.
O consumo em quantidade e em grupos, sobretudo ao fim-de-semana, é muitas vezes entendido e sentido como o factor de pertença ao grupo, potenciando a escalada do consumo, juntos bebemos mais do que sós, como é óbvio e o estado que se atinge é sentido como um "facilitador" relacional e como é reconhecido o controlo das idades de quem compra seja ineficaz e facilmente ultrapassado.
Muitos adolescentes, ouvidos em estudos nesta matéria, referem ainda a ausência de regulação dos pais sobre os gastos, sobre os consumos ou sobre as horas de entrada em casa, que muitas vezes tem que ser discreta e directa ao quarto devido ao “mau estado” do protagonista. A este propósito veja-se a notícia na imprensa de hoje sobre a identificação por parte da PSP de algumas dezenas de adolescentes com menos de 16 anos identificados nas ruas durante a madrugada em Lisboa que "passeiam" sem supervisão parental.
É preciso que a comunidade esteja atenta a estes adolescentes que logo desde os 13 ou 14 anos “acedem” às “litrosas” e aos shots e também aos seus pais que muitas vezes estão tão perdidos quanto eles.
Apesar de se poder vir a legislar no sentido de apenas aos 18 anos ser permitida a aquisição de qualquer tipo de álcool, parecem-me imprescindíveis a adequada fiscalização e a criação de programas destinados a pais e aos adolescentes que minimizem o risco do consumo excessivo.
A proibição, como sempre, não basta, restringir a publicidade só por si não adianta.
Como muitas vezes tenho afirmado, existem áreas de problemas que afectam as comunidades em que os custos da intervenção são claramente sustentados pelas consequências da não intervenção, ou seja, não intervir ou intervir mal é sempre bastante mais caro que a intervenção correcta em tempo oportuno.
A toxicodependência e o consumo do álcool são exemplos dessas áreas.
Quadros de dependência não tratados desenvolvem-se habitualmente, embora possam verificar-se excepções, numa espiral de consumo que exigem cada vez mais meios e promove mais dependência. Este trajecto potencia comportamentos de delinquência, alimenta o tráfico, reflecte-se nas estruturas familiares e de vizinhança, inibe desempenho profissional, promove exclusão e “guetização” para além de outros efeitos graves na saúde, física e mental, ou nos comportamentos, veja-se a notícia sobre o volume de acidentes em que as pessoas envolvidas acusam consumos, diferentes consumos. Este cenário implica por sua vez custos sociais altíssimos, persistentes e difíceis de contabilizar.
Os consumos, de diferentes substâncias, por parte dos adolescentes e jovens podem relacionar-se com alguma negligência paternal mas na maioria dos casos trata-se de pais que sabem o que se passa, “apenas fingem” não perceber, desejando que o tempo “cure”, sentem-se tremendamente assustados, sem saber muito bem o que fazer e como lidar com a questão. De fora parece fácil produzir discursos sobre soluções, mas para os pais que estão “por dentro” a situação é muitas vezes sentida como maior que eles, justificando-se a criação de programas destinados a pais e aos adolescentes que minimizem o risco do consumo excessivo.
Costumo dizer em muitas ocasiões que se cuidar é caro, façam as contas aos resultados do descuidar.

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