Li no
Público que o Bastonário da
Ordem dos Psicólogos Portugueses defendeu na Comissão de Educação e Ciência a
importância da intervenção destes profissionais nos contextos educativos para
além de outros aspectos mais interiores aos aspectos profissionais como o reconhecimento da habilitações própria dos psicólogos para o ensino da disciplina de Psicologia, situação quase anedótica e inaceitável.
A presença dos psicólogos em
contextos educativos tem vivido entre as declarações dos vários actores,
incluindo a tutela, sobre a sua necessidade e importância e a lentidão e
insuficiência no sentido da sua concretização.
Recordo que no final do ano
passado no V Seminário de Psicologia e Orientação em Contexto Escolar o
Secretário de Estado da Educação, João Costa, reafirmou a “indispensabilidade
de ter psicólogos nas escolas" sublinhando o seu contributo essencial para
o sucesso académico e bem-estar dos alunos.
O ME considera prioritário
promover o alargamento do número de técnicos e a estabilidade da sua presença
nas comunidades educativas.
De facto não é um discurso novo,
é apenas algo que tarda em concretizar-se e insisto em notas já por aqui
escritas e marcadas pelo óbvio envolvimento pessoal, tenho formação em psicologia da educação.
O ME tem definido o objectivo de
atingir um rácio nas escolas que passe dos actuais 1/1700 para um psicólogo
para cada 1100 alunos.
De acordo com dados da Ordem dos
Psicólogos Portugueses o sistema educativo público terá em falta cerca 500
psicólogos. Acresce que a maioria destes técnicos é contratada anualmente,
registe-se que este ano o processo de recondução foi mais cedo.
Também segundo dados da OPP, no
ensino privado o rácio é de 1/785 alunos o que, evidentemente, não significará
que as instituições de ensino privado suportem recursos humanos desnecessários.
Conheço situações em que existe
um psicólogo para um agrupamento com várias escolas e que envolve um universo
de mais de 2000 alunos e a deslocação permanente entre várias escolas numa
espécie de psicologia em trânsito. Não é uma resposta, é um fingimento de
resposta que não serve adequadamente os destinatários como, evidentemente,
compromete os próprios profissionais.
Temos também inúmeras escolas
onde os psicólogos não passam ou têm “meio psicólogo” ou menos e ainda a
prestação de apoios especializados de psicologia em “outsourcing” e com a
duração de meia hora semanal uma situação inaceitável e que é um atentado
científico e profissional e, naturalmente, condenado ao fracasso de que o
técnico independentemente do seu esforço e competência será responsabilizado.
No entanto, dir-se-á sempre que existe apoio de um técnico de psicologia.
Nos últimos tempos e como já
referi, o ME tem permitido que as escolas contratem prestação de serviços
educativos a realizar aos seus alunos, a empresas, naturalmente, exteriores à
escola que, aliás, têm florescido. Estes serviços envolvem o trabalho de
psicólogos bem como de outros técnicos, por exemplo terapeutas, e desempenham
funções em diferentes áreas de trabalho da escola.
O quadro orientador da
intervenção dos psicólogos nos contextos escolares definido pelo ME, sendo um
documento positivo é evidentemente incoerente com a falta de recursos, é
inaplicável em muitas situações.
Não quero, nem devo, discutir
aqui a natureza específica, quer em termos de adequação, quer de qualidade da
intervenção dos técnicos, designadamente na área da psicologia.
No entanto, como já tenho
referido, continuo convicto de se verifica em muitas situações uma
sobrevalorização da intervenção dos psicólogos na área da orientação vocacional
desequilibrando a intervenção necessária em áreas como dificuldades ou
problemas nas aprendizagens, questões ligadas aos comportamentos nas suas
múltiplas variantes, alunos com necessidades especiais, trabalho com
professores e pais, só a título de exemplo.
Creio que o recurso ao modelo de
“outsourcing” ou a descontinuidade do trabalho é um erro em absoluto, é
ineficaz, independentemente do esforço e competência dos profissionais
envolvidos. Trata-se, também aqui, de mais uma entrega de serviço público aos
mercados.
Como é que se pode esperar que
alguém de fora da escola, fora da equipa, técnica e docente, fora dos circuitos
e processos de envolvimento, planeamento e intervenção desenvolva um trabalho
consistente, integrado e bem-sucedido com os alunos e demais elementos da
escola?
Das duas uma, ou se entende que
os psicólogos sobretudo, mas não só, os que possuem formação na área da
psicologia da educação podem ser úteis nas escolas como suporte a dificuldades
de alunos, professores e pais em diversos áreas, não substituindo ninguém, mas
providenciando contributos específicos para os processos educativos e,
portanto, devem fazer parte das equipas das escolas, base evidentemente
necessária ao sucesso da sua intervenção, ou então, é uma outra visão, os
psicólogos não servem para coisa alguma, só atrapalham e, portanto, não são
necessários.
Este último entendimento contraria o que
a experiência e o conhecimento da realidade de outros países aconselha. Aliás,
de acordo com Cor Meijer, director da Agência Europeia para a Educação
Inclusiva e Necessidades Especiais, afirmou no encontro que referi, “Os
psicólogos escolares são essenciais para a educação inclusiva".
A situação existente parece-me,
no mínimo, um enorme equívoco, que, além de correr sérios riscos de eficácia e
ser um, mais um, desperdício (apesar do empenho e competência que os técnicos
possam emprestar à sua intervenção), tem ainda o efeito colateral de alimentar
uma percepção errada do trabalho dos psicólogos nas escolas.
No entanto, a reflexão sobre os
conteúdos, regulação e modelos de intervenção são de outro
espaço e oportunidade.
Aguardo que a importância e
prioridade sempre atribuídas ao trabalho dos psicólogos em contextos
educativos se concretizem de forma suficiente e estável.